YOUNG GUNS | Os Jovens Pistoleiros do Velho Oeste

Se tem algum filme de faroeste/western que foge às regras do gênero cinematográfico americano por excelência é Jovens Pistoleiros (Young Guns), criado pelo roteirista John Fusco, dirigido pelo cineasta Christopher Cain e lançado nos cinemas em 1988.

O faroeste sempre teve um lugar especial no coração dos fãs de cinema, com suas histórias de honra, coragem e aventura, e os Jovens Pistoleiros trouxe um novo estilo ao apresentar um line-up de jovens atores no lugar de velhas estrelas como protagonistas.

Os Jovens Pistoleiros
Os Jovens Pistoleiros, tradução de Young Guns no Brasil

Os heróis infalíveis e de moral ilibada já tinham passado por uma ressignificação, com um olhar interior mais profundo sobre seus dramas e traumas na narrativa, em detrimento de tramas racistas e preconceituosas contra os povos originários das Américas.

O faroeste tinha problemas internos a serem resolvidos, e a produção cinematográfica dos anos 1960 e 1970 tentou examinar os problemas de personalidade de seus protagonistas. Onde antes havia glória e honra performados por heróis nas peles de atores como John Wayne ou Gary Cooper, agora tínhamos retratos distorcidos de homens cujas armas compensavam alguma coisa. Ou que contavam algo épico, como Era Uma Vez no Oeste (1968), de Sergio Leone, um dos maiores filmes do cinema.

Alguns críticos argumentam que a diminuição na popularidade do faroeste nos anos 1980 e 1990 se deve à falta de inovação no gênero. Muitos filmes de faroeste lançados nesse período seguiam fórmulas e convenções já estabelecidas, sem trazer novidades significativas para a narrativa ou abordar temas relevantes de maneira original. Isso levou a uma sensação de repetição e falta de interesse por parte do público.

Os Jovens Pistoleiros
Capa de Os Jovens Pistoleiros para a versão DVD

O que entra em cena agora é um novo produto, com um verniz pop de juventude e cinema adolescente dos anos 1980-1990. Jovens Pistoleiros, estrelado por Emilio Estevez no papel de Billy The Kid (uma verdadeira lenda do Velho Oeste), além de Kiefer Sutherland, Lou Diamond Phillips, Charlie Sheen, Dermot Mulroney e Casey Siemaszko, conta um período da história do jovem Billy, criminoso que foi uma das mais célebres figuras da cultura pop americana, com centenas e produtos lançados como filmes, livros e HQs.

E Emilio encarnou à perfeição a fanfarronice e letalidade que Billy The Kid representava.

O filme apresenta filmagens dinâmicas repletas de ação e uma abordagem moderna do gênero faroeste. A sequência de créditos de abertura, com a música-tema composta Anthony Marinelli, aliada a uma direção estilosa cheia de pose, em uma estética pop bem moderna, já mostra tudo que podemos esperar do longa-metragem.

Billy The Kid, personifica a rebeldia e o carisma do jovem fora-da-lei. Sua atuação carregada de intensidade cativou o público, tornando-se um dos pontos altos do filme. Além disso, o elenco de apoio, particularmente Kiefer Sutherland, como o intelectual e meigo Doc Scurlock, e Lou Diamond Phillips como o fodassaralho mestiço índio + mexicano Jose Chavez y Chavez, trouxe performances igualmente marcantes, adicionando camadas de complexidade aos personagens do bando de Billy The Kid, que a todos amaldiçoa com seu papo fácil e dedo leve no gatilho.

Os Jovens Pistoleiros
Emilio Estevez é Billy The Kid

A combinação de uma narrativa envolvente, ação eletrizante e um estilo visual marcante contribuiu para a identidade única de Os Jovens Pistoleiros. No entanto, o filme também recebeu críticas mistas por sua abordagem mais leve e comercial em relação aos faroestes clássicos.

Alguns puristas do gênero sentiram que o filme perdeu a seriedade e a autenticidade de seus predecessores. Mas o fato é que o faroeste há muito estava esquecido nos cinemas, e só veria uma luz do caixão com Os Imperdoáveis (1992), de Clint Eastwood. Não por acaso, lançado 2 anos depois da sequência de Jovens Pistoleiros.

Os Jovens Pistoleiros
(Young Guns, 1988, de Christopher Cain)

Os riffs de guitarra nos segundos iniciais de Os Jovens Pistoleiros são os acordes que darão o tom cinematográfico inteiro do filme. Temos na tela em destaque: close nos rostos e créditos de atores em cima de cada personagem.

São 6 jovens mal encarados um lado do outro, que logo explodem em fúria de chumbo, atirando contra a câmera, que muda para diversos ângulos para pegar os tiros. Mais legal e estiloso para o final dos anos 1980 impossível.

A narrativa é conduzida por William H. Bonney, mais conhecido como Billy The Kid (Emilio Estevez). É por meio dele que conheceremos todo o contexto dessa releitura das aventuras de Billy durante a chamada Guerra do Condado de Lincoln, que aconteceu entre 1877 e 1878 no Novo México, Estados Unidos. E (quase) tudo baseado é em fatos e pessoas reais.

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Os Jovens Pistoleiros: Chavez y Chavez, Charlie, Stephens, Doc, Billy e Dick

John Tunstall (Terence Stamp) é um comerciante de gado que está crescendo nos negócios, e que ajuda jovens abandonados e perdidos na vida. Ele já tem 5: o inteligente Doc Scurlock (Kiefer Sutherland), o fanfarrão Charlie Bowdre (Casey Siemaszko), o frio e foda navajomexicano Jose Chavez y Chavez (Lou Diamond Phillips), o cabrunco Stephens (Dermot Mulroney) e o líder natural dos rapazes, o bonzão Richard “Dick” Brewer (Charlie Sheen).

Tudo muda quando Tunstall e Doc cruzam o caminho do jovem Bonney, que acabam descobrindo ser Billy The Kid. De início, os outros rapazes não se dão bem com ele, mas a indiferença de todos logo desaparece, frente à irreverência do jovem. Juntos, esses jovens pistoleiros são Os Reguladores, e cuidam dos animais e da vida rotineira da fazenda.

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Billy e Tunstall, que ‘resgata’ o garoto

Mas outro comerciante de gado, o poderoso Lawrence G. Murphy (Jack Palance), está incomodado com a ascensão de Tunstall, e vai fazer de tudo para impedir a concorrência. Em uma festa de Ano Novo (1877-1878), os rapazes e Tunstall se divertem para valer, e Billy até encontra um antigo conhecido e “rival”, Pat Garret (Patrick Wayne), e apesar da desconfiança de ambos, eles seguem seus caminhos em paz (ao menos por enquanto).

Os Jovens Pistoleiros
Jack Palance é o vilão Murphy

A tragédia se abate sobre o grupo quando Tunstall é emboscado e assassinado no retorno da festa para seu lar, e tudo piora com a inanição da força da lei, já que Murphy e seus homens tem o xerife e outras autoridades no bolso.

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Dick é o líder dos Reguladores, depois de Tunstall

Por pressão do advogado Alexander McSween (Terry O’Quinn), amigo de Tunstall, o promotor do Condado de Lincoln então nomeia os 6 jovens como delegados federais, na intenção de trazer os responsáveis pela morte de seu mentor para a Justiça.

Mas a força magnética de Billy arrasta todos para um desastre de revanche e sangue. Billy e os Reguladores acabam assassinando os culpados em vez de prendê-los, passando também a ser caçados pela lei.

A sede de vingança de Billy contra Murphy e seus homens só faz elevar a temperatura de todos os envolvidos, e uma verdadeira guerra tem início, assim como a crescente mitologia em torno de Billy e seus feitos, sejam eles exagerados ou mesmo inventados pela imprensa.

Quando Billy suspeita de J. McCloskey (Geoffrey Blake), outro jovem que Tunstall tinha “adotado”, e ex-membro da turma de Murphy, ele não demora a matá-lo com um tiro no rosto, deixando claro para os outros rapazes e para nós, telespectadores, que Billy é um matador nato.

A matança tem uma pausa com Chavez realizando um ritual navajo com o uso de peiote (uma planta alucinógena), o que entrega cenas emblemáticas e engraçadas do grupo na maior pira. Foi uma calmaria antes da tempestade, pois o quer vem a seguir é inacreditável, quando o até então inatingível Richard é morto em um confronto com um caçador de recompensas.

Os Jovens Pistoleiros
Chavez y Chavez

Ninguém está seguro com Billy The Kid, mas é com ele que todos precisam estar para permanecerem vivos, com ele assumindo a liderança dos jovens, perdidos sem Richard. Temos mais uma boa cena na morte do xerife, em uma direção esperta de Cain.

Mas Billy e seu bando abusaram demais. E até o Exército americano é enviado para detê-los. Isso, mais os homens de Murphy, e os outros agentes da lei, formam uma força invencível contra os Reguladores.

Eles decidem fugir para o México, mas Pat Garret surge para avisar Billy que Murphy irá matar McSween, mesmo que ele não represente ameaça em potencial. Os jovens pistoleiros decidem ajudar o amigo do mentor assassinado, mas todos entendem, uma vez dentro da casa dele, que se tratava de uma emboscada para reunir todos os envolvidos.

Uma das artes do poster do filme para o mercado asiático

O clímax é bom, mas exige desprendimento, dado que o tiroteio ocorre apenas com Billy, Doc, Charlie e Stevens, contra uma rapa de mais de 100 antagonistas. No fim, Chavez escapa da casa para trazer cavalos para a fuga e McSween não luta (mas é morto mesmo assim, de modo covarde).

A “vitória” de Billy The Kid se dá única e exclusivamente por força de roteiro, a despeito de ser baseado em fatos reais.

Os Jovens Pistoleiros

Os Jovens Pistoleiros

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Os Jovens Pistoleiros

No fim, Charlie e Stephens são mortos também, mas Billy consegue matar Murphy, realizando sua tão sonhada vingança. Ele foge junto com Doc e Chavez, e o roteirista John Fusco busca dar fim aos personagens, declarando o destino de Doc e Chavez, e informando que Billy teria sido morto com um tiro nas costas por Pat Garret tempos depois.

Claro, isso seria retificado na sequência, que trouxe de novo Estevez, Sutherland e Phillips para seus papéis, e que também conta no elenco Christian Slater, William Petersen (um novo intérprete para Garret), James Coburn, Viggo Mortensen e Scott Wilson. Com uma trilha sonora ímpar composta pelo cantor Bon Jovi, Young Guns II – Jovem Demais Para Morrer seria muito mais conhecido do que o primeiro filme.

Emilio Estevez e John Fusco nas gravações da continuação de Os Jovens Pistoleiros, chamada no Brasil de Jovem Demais Para Morrer (Young Guns II)

Nos bastidores do jovem faroeste

Temos em Jovens Pistoleiros toda uma segunda geração de atores em ação, e que se misturam em alguns filmes. Kiefer é filho do ator Donald Sutherland, e Charlie e Emilio são filhos de Martin Sheen. Além de Kiefer e Emilio retornarem para Young Guns II – Jovem Demais para Morrer (1990), Kiefer e Charlie aparecem juntos em Os Três Mosqueteiros (1993). Donald está em JFK: A Pergunta que Não Quer Calar (1991), que tem narração de Martin. Os dois participam também de Loucos por Dinheiro (1998), que também tem Charlie no elenco. Esse também fez Conspiração (1997), onde contracena com Donald. E Martin e Kiefer atuam juntos em Últimas Conseqüências (1997).

O jovem Kiefer Sutherland

Ainda falando de atores, Young Guns foi o primeiro (e único) filme de faroeste que Tom Cruise “estrelou”. Na verdade, ele visitou os amigos (Charlie, Emilio, Lou) em um set de filmagem do filme, e acabou participando de última hora nas gravações do tiroteio final, sendo um dos homens de Murphy baleado e morto. De chapéu e bigode falso, é uma participação no estilo piscou, perdeu.

De acordo com Phillips (em uma entrevista de 2016), Sean Penn teve a chance de interpretar Billy e Patrick Swayze o de Brewer, mas o primeiro estava com problemas legais e não pôde aceitar, e Patrick, que era da mesma turminha dos caras nas telonas, queria testar filmes novos e distantes dos amigos, e declinou do papel.

O roteirista John Fusco, além de retornar para escrever a sequência, também foi o responsável pelo roteiro de filmes como Mar de Fogo (2004) e Spirit: O Corcel Indomável (2002), sendo que seu trabalho de maior destaque foi a série de TV Marco Polo (2014–2018). Mas a grande obra de sua carreira é mesmo foi A Encruzilhada (1986), um clássico de aventura musical dirigido por Walter Hill e estrelado por Ralph Macchio, Joe Seneca e Jami Gertz, um filme que acompanha a jornada de um jovem guitarrista em busca de se tornar o melhor músico de blues. Fusco teve uma trajetória de maior destaque do que o diretor Christopher Cain, que de mais relevante dirigiu Karate Kid 4: A Nova Aventura (1994).

Já o compositor Anthony Marinelli tem quase 100 créditos de composição de trilha sonora segundo o IMDB. Um de seus primeiros trabalhos foi A Marca da Pantera (1980) e ele participou de longas icônicos como Jogos de Guerra (1983), A Cor Púrpura (1985), Conta Comigo (1986), Antes Só que Mal-Acompanhado (1987), Tango e Cash (1989), O Demolidor (1993), Despedida em Las Vegas (1995), 15 Minutos (2001) e muitos outros.

Billy The Kid e o Velho Oeste

O contexto do chamado Velho Oeste nos Estados Unidos compreende um espaço-tempo que vai de 1850 a 1912, mas há diferentes linhas de pensamento e delimitações geográficas e históricas a respeito, com outros especialistas estabelecendo o tempo como o final da Guerra Civil Americana em 1865 até o fechamento da fronteira pelo censo de 1890.

De qualquer maneira, o chamado Velho Oeste envolve territórios relativamente autônomos do Governo Federal que compreendem os atuais Arizona e Novo México. Trava-se de um período de migração e colonização em massa, particularmente encorajada pelo presidente dos EUA Thomas Jefferson após a compra da Luisiana, dando origem à doutrina expansionista conhecida como Destino Manifesto — uma crença comum entre os colonizadores americanos de se expandir pela América do Norte, já que se consideravam eleitos por Deus para tal missão.

Foi uma época marcada por poucos elementos governamentais atuando na região, com um alto fluxo de imigrantes, mineiros, garimpeiros e criadores de gado, frequentemente em conflitos com povos indígenas, que viam suas terras serem tomadas e sua cultura ser obliterada.

Havia poucos agentes da lei. E os entraves e problemas decorrentes desse núcleo social, sem a presença efetiva de juízes, xerifes e o governo, eram resolvidos na bala. Por revólver. É nesse contexto que nasce a figura do cowboy. Vale citar também que a palavra faroeste é uma corruptela do original em inglês far west, “oeste distante”, outro jeito de se referir ao Velho Oeste, por vezes também chamado de Oeste Selvagem (wild west).

O Velho Oeste é frequentemente retratado na cultura popular como um lugar de vastas paisagens, cidades fronteiriças, saloons, duelos, diligências, roubos a bancos, mineração de ouro e encontros violentos entre bandidos e a lei. Essas representações foram influenciadas tanto pela realidade quanto pela ficção.

E algumas vezes elas se misturavam. Como com Billy The Kid. Ao contrário do que se pensa, seu nome real não era William H. Bonney, mas sim Henry McCarty. Nascido em 1859 em Nova York, ele era órfão de pais irlandeses.

Começou na vida do crime aos 15 anos, com pequenos furtos, até que teve que fugir para o Arizona, onde ganhou o apelido de Billy The Kid. Ele cometeu seu primeiro homicídio em uma briga de bar, e fugiu de novo, para o Novo México.

Em 1877, se juntou a ladrões de gados no Condado de Lincoln, que viva uma época de guerra entre gangues de criadores de gado, iniciada por rancheiros irlandeses já estabelecidos contra franco-canadenses recém-chegados.

Foram meses de tiroteio e brigas em 1878, que culminou em uma batalha envolvendo mais de 100 pistoleiros, com duração de 5 dias, o que resultou em 22 mortes. Billy, como vimos no filme, escapou com vida, mas decidiu ainda permanecer na região. Ao presenciar um pistoleiro matando um promotor, decidiu entregar a identidade do assassino em troca de perdão dos seus crimes, mas foi enganado e preso. Billy conseguiu fugir, e um caçador de recompensas e um agente da lei foram ao seu encalço. Billy os matou.

As autoridades então contrataram Pat Garret para prendê-lo, e ele conseguiu. Billy estava preso de novo. Mas de novo conseguiu fugir. E acabou por matar 2 guardas.

E mais uma vez Pat foi atrás dele.

Henry McCarty, vulgo William H. Bonney, vulgo Billy The Kid, foi morto em 14 de julho de 1881, no Fort Sumner, no Novo México, por Pat Garret. Mas ele tinha se tornado tão icônico que se tornou uma lenda da América, e frequentemente sua morte é contestada.

A imagem abaixo é o único registro fotográfico do rapaz. Billy tinha 21 anos de idade, e 21 mortes foram atribuídas a ele — 1 morte para cada 1 ano de vida.

Billy The Kid, o verdadeiro

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