O apelo sexy e outsider de uma vocalista ruiva carismática e músicos talentosos que gostam de produção — um deles fez a rocha que esmagou o rock´roll para sempre, Nevermind, do Nirvana — deu ao mundo da música o Garbage, dono de excelentes hits de rock industrial com grunge e punk e um trip-hop ocasional.
Garbage não é só mais uma banda com vocal feminino, é uma das bandas que fizeram algumas das músicas mais legais do rock, ajudando a construir a conhecida sonoridade que apenas os anos 90 eram capaz de proporcionar no que se convencionou a se chamar de rock alternativo, que a bem da verdade, existe mais em nossas cabeças do que no mundo real.
Mas como música mexe com cabeça, continuemos a jogar palavras fora a respeito mesmo assim.
Com excelentes músicos, o Garbage entregava peso nas canções, com excelentes riffs de rock diversas camadas de efeito eletrônico, balanceados por percussões inventivas.
O vocal da escocesa Shirley Manson, cheio de gemidos e frases arrastadas, conquista na hora. Butch Vig, Deuke Erikson e Steve Marker, produtores de renome na área musical, iniciaram as músicas da banda mais por exercício de criatividade do que qualquer outra pretensão.
Em uma jam informal, a moça chamada Shirley apareceu e a banda foi efetivamente formada.
A música de rock no começo dos anos 90
Com experiência anterior na Angelfish e Goodbye Mr MacKenzei, a voz da cantora casou perfeitamente com o que pretendiam.
Vig é de Wisconsin, EUA, e tocava piano quando criança e bateria na adolescência. Alcançou renome na área como excelente baterista. Junto com Marker, gastavam horas registrando canções no gravador de quatro canais no porão da casa do último.
Gravou oito faixas em uma fita cassete de um projeto paralelo chamado Fire Town. Ao assinar com a Atlantic Records em 1988, inesperadamente ganharam boas resenhas da crítica e um sucesso financeiro com as músicas I’ll Carry The Torch For You, Rain On You e The Good Life.
Isso levou a criação por parte de Vig de um lugar chamado Smart Studios, estúdio musical adaptado em um armazém local.
A qualidade do que conseguia fazer chamou a atenção de muita gente, e numerosas bandas de punk e rock passaram pelo lugar no começo dos anos 90. A cena do rock americano iria mudar.
O estrelato chegou com Nevermind, a obra-prima do Nirvana. O disco elevou o status de Vig para superstar, e por dois anos seguidos, ele trabalhou com Sonic Youth, L7 e Smashing Pumpkins.
Vig fez os discos Siamese Dream, do Pumpkisn, e Dirty, do Sonic. Até hoje continua sendo requisitado. Em 2011, produziu o álbum Wasting Light do Foo Fighters, de Dave Grohl, com quem trabalhou em Nevermind.
Marker também era produtor, amigo de Vig desde os tempos de faculdade, e o auxiliava no estúdio.
Duke Erikson tocou com Vig na banda Spooner (antes da Fire Town) quando eram mais jovens. Eventualmente, os três se encontravam, e tocavam juntos. Em 1993, o trio trabalhava com remixes de U2, Nine Inch Nails e Depeche Mode.
Depois de um tempo, eles começaram a compor juntos, gravando efeitos e dando ideias novas para um novo som.
Um amigo de Butch, ao ouvir as demos de um projeto do NiN, disse que aquela música parecia lixo — garbage, em inglês.
Quando viram Shirley em um clip na MTV com seu Angelfish, a chamaram para ser o vocal com mais sons produzidos em cima do que o cara chamou de ‘lixo. O primeiro teste deu ruim, e ela foi embora.
Manson pediu uma nova chance quando a Angelfish acabou. Começou a escrever letras e retrabalhar as músicas que Marker, Vig e Erikson já tinham composto, e pouco a pouco, o Garbage foi acontecendo, sempre tentando evitar de alguma maneira expor demais Vig na parada, devido a sua fama.
O álbum de estreia, chamado apenas de Garbage, foi lançado no final de 1995, já com os singles de sucesso Only Happy When It Rains, Stupid Girl e Milk.
O disco já continha elementos sonoros característicos da banda, rock com música eletrônica, e atingiu a marca de 3 milhões de cópias vendidas. O Garbage mudou parte da indústria de música com seu rock.
Um dos primeiros singles do disco foi Vow, que já entregava tudo que precisaria se saber sobre o que a banda ofereceria: som fantástico e denso em letras reescritas por Shirley para falar sobre sua depressão melancólica e vulnerável de forma aguda e violenta.
Don’t believe in love
Don’t believe in hate
Don’t believe in anything
That you can’t waste
stupid girl
stupid girl
Can’t believe you fake it
Can’t believe you fake it
Seis álbuns de estúdio do Garbage
e mais de 25 milhões de discos vendidos
O segundo trabalho do Garbage foi Version 2.0, lançado em maio de 1998, quase três anos depois do primeiro álbum. Foram esses dois discos que fizeram a fama do grupo no rock, posicionando-os como uma das grandes bandas de música dos anos 90.
Uma das músicas mais tocadas no rádio nessa época foi I Think I´m Paranoid. O terceiro disco é Beautiful Garbage, também escrito como ‘beautifulgarbage‘, lançado em 2001. O quarto é o Bleed Like Me, de abril de 2005.
O quinto é o Not Your Kind of People, de 2012. O último trabalho do Garbage é o Strange Little Birds, de 2016.
Bend me break me
Anyway you need me
All I want is you
Bend me break me
Breaking down is easy
All I want is you
Steal me, deal me, anyway you heal me
Maim me, tame me, you can never change me
Love me, like me, come ahead and fight me
Please me, tease me, go ahead and leave me
Lixos conhecidos e desconhecidos no rock
O Garbage excursionou muito nos anos 90, e chegaram a gravar a música-tema do 19º filme de James Bond, The World Is Not Enough, de 1999 (007 O Mundo Não É o Bastante). Ganharam fama, dinheiro e boas críticas.
Pegaram a onda inovadora e videoclíptica que a MTV promovia. Seus vídeos eram bem mais interessantes do que seus concorrentes e as músicas pareciam trilhas feitas especialmente a elas.
A beleza disfuncional de Mason e sua personalidade marcante e forte corria a seu favor, e não contra ela, a posicionando como mulher empoderada anos antes dos movimentos atuais.
São duas fases distintas na banda, que podem ser tranquilamente separadas. Há uma primeira versão do Garbage que são os dois primeiros álbuns, e uma segunda versão, que são os quatro álbuns restantes.
Após a gravação da música do 007, e ao final da turnê de Version 2.0, a banda se retirou para a preparação do terceiro álbum, Beautiful Garbage.
O disco foi o primeiro trabalho pela Universal Music Group (que comprara a Almo Sounds em 2001), no selo Interscope.
A sonoridade da música do Garbage se tornou pop e soft demais para o rock que executavam anteriormente, o que afastou a base de fãs antigas. Vig estava com hepatite A, o que fez que tivesse que ficar em repouso a maior parte do tempo nesse trabalho.
A obra chegou nas prateleiras apenas três semanas após os ataques de 11 de setembro. Era outro mundo ao nascer de sangue e novas políticas, e o Garbage teria que aprender a viver nele.
Competição rock´n roll de discos de música ao vivo do Garbage
No quarto álbum, Bleed Like Me, o Garbage tentou soar como se estivesse ao vivo nas apresentações, e assim recuperar o prestígio na música.
Durante as gravações, Shirley estava se divorciando, e os problemas transbordaram na banda, que de fato acabou de verdade em certo momento, mostrando afinal que eram problemática como uma banda de rock deve ser.
Os ânimos acalmaram, os integrantes se reuniram, e o disco foi finalmente lançado em 2005.
O disco retomava guitarras e melodias pesadas, e deu canções como Why Do You Love Me?, Bleed Like Me, Bad Boyfriend, Run Baby Run e Sex Is Not The Enemy.
É o disco do Garbage com melhor posição na Billboard 200, estreando em quarto lugar. Um mérito, pois em 2005 o cenário musical para o Garbage competir era feroz. O Slipknot também lançava um disco, o 9.0 Live, primeiro CD ao vivo da banda; surgia a Rihanna com seu disco de estréia Music Of The Sun; Shakira lançava Fixations — 2 discos, um em espanhol e outro em inglês; o System of a Down também atacava de duplo; outro artista que trabalhou material ao vivo foi a banda Kraftwerk, com seu único trabalho dessa natureza: Minimum-Maximum, premiado como Melhor Álbum de Musica Eletrônica no Grammy Award.
Após a turnê de Bleed Like Me, o Garbage só retornaria em 2007, para um não-álbum: a coletânea Absolute Garbage, que incluía uma nova canção, Tell Me Where It Hurts. Só sete anos depois produziriam um disco.
O Not Your Kind of People, o primeiro da banda pelo selo próprio STUNVOLUME. As filhas de Marker e Vig cantam na faixa-título. O Garbage tentou se aproximar novamente de suas raízes sonoras, mas não conseguiram produzir nenhum sucesso de destaque. Em 2012, o pop massacrava qualquer um.
Katy Perry atingia o primeiro lugar na Billboard Hot Club Songs, tornando seu álbum Teenage Dream o primeiro na história a ter sete canções de um mesmo álbum alcançar o primeiro lugar.
Mas a boa resposta do disco animou os integrantes. Já tinham se passado sete anos desde o último trabalho, e o público ainda comparecia aos shows e compravam o álbum. Até no Brasil vieram tocar, no Main Stage do Festival Planeta Terra 2012.
“Ficamos chocados com a recepção (calorosa) que tivemos. Lembro que estava frio, escuro e bonito. E barulhento. Ficamos muito, muito surpresos com o público“, disse a Shirley para a revista Rolling Stone, na época.
Em 2016, animados com a repercussão que conseguiram, o Garbage produziu Strange Little Birds para um retorno de músicas de rock. Mais uma vez sob selo próprio, se afastaram do pop divertido, com canções anti-comerciais.
Correram longe de parecer cool, e fizeram assim um disco mais sólido, um rock industrial mais reflexivo e pesado, mais próximo de seus primeiros álbuns. O som emoldura as desventuras amorosas de Shirley Manson em um disco mais sombrio e intimista, um ponto fora da curva para o Garbage.
Talvez impenetrável demais para a jovem audiência que vive em bolhas de redes sociais — mesmo tipo de pessoas Shirley critica nas letras do álbum. A banda fez um show da turnê desse álbum em São Paulo, em 10 de dezembro de 2016.
Shirley sempre foi afiada para falar de qualquer tema com seu indefectível sotaque escocês. Comenta sobre sexo, família e feminismo com naturalidade de quem comenta se hoje vai chover ou não. Para comentar o novo álbum não foi diferente.
“É tão difícil para as bandas continuarem funcionando hoje e estamos em uma posição de sorte espetacular”, diz ela.
“Sobreviver como banda com o clima econômico atual é quase impossível. Uma banda nova em folha, como todo o motor de banda nova por trás dela, consegue ser ouvida e surfar a onda do sucesso. Mas perseverar, seguir em frente depois que acaba a novidade, é muito difícil economicamente – isso sem falar em termos de segurar a atenção das pessoas”, afirmou Shirley à Rolling Stone.
Tais palavras explicam melhor como os artistas se sentem aos seus trabalhos criativos e intelectuais do que efetivamente pensam de sua arte como trabalho em si.
A fila da música andou para o Garbage no mundo do rock, e Shirley e sua banda talvez possam ser escanteados da cena, mas ainda permanecem dentro do jogo com seu último disco.
/// Garbage, o primeiro álbum da banda, é um dos 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, listado por Robert Dimery em seu livro. A música no livro não se resume apenas a rock, e o Garbage tem a companhia de ilustres personas de variados estilos. A lista completa você pode ver aqui.
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