O escritor Arnold Drake fez uma grande carreira nos quadrinhos de super-heróis durante quase quatro décadas — final dos anos 1950, 1960, 1970 e 1980.
As maiores editoras de quadrinhos, Marvel Comics e DC Comics, tiveram grandes personagens criados sob sua supervisão.
Vencedor do prêmio Eisner (o Oscar dos quadrinhos americanos) em 2005 pela sua excelência na carreira, Arnold Drake criou a Patrulha do Destino, Desafiador, Destrutor, Polaris, os Guardiões da Galáxia e muitos outros heróis e vilões.
Como já adiantamos em nossa matéria de 100 posts, onde explicamos a origem do blog Destrutor, vamos conhecer agora mais um pouco sobre o criador do personagem Destrutor, o herói mutante dos X-Men.
Arnold Drake, de família judia, nasceu em Nova York, Estados Unidos, em 1924. Aos 12 anos, caiu de cama por uma enfermidade, e foi quando começou a desenhar as próprias tiras em quadrinhos.
Se formou em jornalismo, e a vida o fez ser vizinho de ninguém menos do que Bob Kane, o célebre co-criador do Batman. Foi o desenhista quem o introduziu na futura DC Comics.
Na época, não era costume os créditos serem dados aos profissionais que faziam as revistas, mas historiadores posicionam a trama de oito páginas “The Return of Mister Future“, vista em Batman #98 (março de 1956), como o primeiro trabalho de Arnold Drake.
Judeu praticante, era talentoso, e fazia trabalhos criativos com aventura e drama em Showcase #1, abril de 1956), revistas de humor dos comediantes Bob Hope e Jerry Lewis, duas lendas do gênero, histórias de terror em House of Mystery, ficção científica em World’s Finest Comics #102 (junho de 1959), entre outras publicações.
Arnold Drake,
Patrulha do Destino
e os X-Men
Arnold Drake e o também escritor Bob Haney, que fazia HQs de guerra e vinha de trabalhos duros da Grande Depressão, tiveram contato com os recentes materiais que uma novata Marvel Comics publicava, como Quarteto Fantástico, de Stan Lee e Jack Kirby.
Eles sabiam que uma nova onda criativa estava por vir, e com efeito, tentaram emplacar revistas como essa com o editor da DC, Irwin Donnelfield.
Foi apenas mais de um ano depois, sob orientação do editor Murray Boltinoff, na revista de antologia My Greatest Adventure #80 (junho de 1963), que Drake e Bob Haney criam a Patrulha do Destino, um grupo de relutantes super-heróis que são liderados por um homem em uma cadeira de rodas.
A concepção visual dos personagens é do desenhista Bruno Premiani, um italiano que imigrou para a Argentina em 1930, fugindo do fascismo.
Meses depois, a Marvel publicou The Uncanny X-Men, com similaridades enormes entre as duas equipes: um mentor sábio de cadeira de rodas, jovens desajustados com poderes perigosos, e um grupo de vilões quase que com o mesmo nome: a Patrulha do Destino enfrentava a Irmandade Negra (Brotherhood of Evil), e os X-Men enfrentavam a Irmandade de Mutantes Malignos (Brotherhood of Evil Mutants).
Como salientado no início, Drake antecipava temas que a Marvel estava trazendo. Todos os membros da Patrulha são invenções de Arnold Drake: o Chefe, o Homem-Negativo, a Garota-Elástica, o Homem-Robô e Mento.
O sucesso da Patrulha do Destino de Arnold Drake foi tanto que My Greatest Adventure #86 se torna Doom Patrol #86, e vai até o #121, de outubro de 1968.
A Patrulha se tornou um dos principais grupos do universo de heróis da editora, e em crise ou numa Crise, a equipe sempre aparece com uma revista própria. O run (período de trabalho em uma revista) de Grant Morrisson com a Patrulha do Destino, nos anos 90, é um dos materiais obrigatórios da DC.
Atualmente, a Warner fez até um seriado do grupo em 2019/2020.
Os inimigos da Patrulha eram tão estranhos quanto os heróis, e também criação de Drake: o General Immortus, o inacreditável Homem-Animal-Vegetal-Mineral, e a Irmandade Negra, liderada pelo Cérebro (literalmente um), o gorila inteligente Monsieur Mallah e Madame Rouge.
O livro Pancadaria, de Reed Tucker, entrega muitas informações a respeito de Drake e de como ele se sente com a suspeita similaridade da Patrulha do Destino e os X-Men de Stan Lee, o que vai de declarações dos fatos, negação, tiração de sarro e até cutucadas em plena Comic-con em meio a todo mundo da indústria. Um trecho da página 36 do livro:
(…) Inicialmente eu raciocinei que não havia tempo o bastante para ter sido um plágio. Mas naquela época eu não sabia que havia tantos artistas da DC trabalhando para Stan (Lee). Em resumo, a partir do dia em que deixei meu primeiro roteiro de Patrulha do Destino na mesa de Boltinoff, alguma notícia pode ter vazado para a Marvel sobre uma ‘equipe de anti-super-heróis liderada por um gênio cientista em uma cadeira de rodas.”
Arnold Drake também leva crédito por ter criado, junto com o artista Win Mortimer, “Stanley and His Monster“, estrelado por um garotinho de 6 anos e um monstro de animal de estimação feroz rosa, em aventuras no cotidiano, com apontamentos espertos do dia a dia.
Ele surgiu na revista de humor The Fox and the Crow #95 (janeiro de 1966) e precede em anos a tira em quadrinhos de Calvin e Haroldo.
No mesmo ano, Drake escreveu um relançamento da revista do Homem-Borracha para a Quality Comics. O personagem tem uma temática rica bem diferente, um ex-criminoso em histórias policiais de super-heróis muitas vezes calcadas em humor — um clássico das HQs.
Desafiador
A DC Comics foi o local de nascimento de outra co-criação sensacional de Arnold Drake. É em Strange Adventures #205 (outubro de 1967), junto com o desenhista Carmine Infantino, que ele cria o Deadman, mais conhecido no Brasil como Desafiador.
A revista narra as aventuras de Boston Brand, um ex-acrobata que vive entre o reino dos vivos e dos mortos.
Ele não é propriamente um super-herói, e sim um espírito ambulante que possui temporariamente as pessoas, a fim de tentar resolver o mistério de seu próprio assassinato. Eventualmente, ele ajuda quem precisa, em outras situações adversas.
O Desafiador era uma HQ sofisticada, e era um passo importante dentro da DC para maturar a nona arte, ainda mais num gênero ordinário como revistinhas de super-herói.
O personagem daria grandes prêmios de reconhecimento aos autores, e o personagem seria famoso no hall de heróis da editora, com edições desenhadas por artistas como José Luis García-López, um cara que literalmente deu a cara da DC ao fazer o DC Comics Story Guide, nos anos 1980, e Neal Adams, desenhista veterano da DC e Marvel, com passagens por muitos personagens das duas editoras, e criador do visual de herói do Destrutor, x-man criado por Arnold.
Drake era uma voz alta e poderosa entre os profissionais da DC, e uma frequente pedra no sapato para os editores, por querer absurdos como pagamentos melhores, seguro-saúde, devolução de originais e outras obviedades sempre negadas a autores de quadrinhos.
A última história da Patrulha teria uma participação de Arnold Drake, dentro da própria HQ, mas Irwin Donenfeld vetou em represália.
Pancadaria também revela em suas páginas que Drake tentou avisar a DC em vários momentos que criatividade em circular HQs em faixas etárias como jovens na universidade era um exercício que deveria ser feito, como a Marvel já fazia.
Arnold Drake não foi ouvido, e bem sabemos como que a história dos quadrinhos de super-heróis ocorreram. Pouco tempo depois de tentar fazer pressão com a diretoria da editora, ele foi demitido pela DC, junto com veteranos como Otto Binder, escritor de Superman, Bill Finger, escriba de Batman e outros.
Destrutor
e os X-Men
Perto do fim dos anos 1960, Arnold Drake pegou alguns trabalhos freelances para a Marvel Comics, quando cria vários personagens para os X-Men — entre eles, o Destrutor.
O escritor começa na Marvel em histórias de guerra para a revista Captain Savage #5 e Sgt. Fury and his Howling Commandos, ambos de 1968.
Seu run em X-Men acontece nos números de #47 a #54, de agosto de 1968 a março de 1969, co-escrevendo inicialmente com Gary Friedrich, outro escritor clássico da Marvel.
Alex Summers já era referenciado em alguns momentos como irmão de Scott Summers, o Ciclope, um dos X-Men originais, nos números anteriores da revista dos mutantes, por Stan Lee e Jack Kirby.
Mas foi em X-Men #54 (1969) que ele fez sua primeira aparição efetiva nos quadrinhos da Marvel.
Ele fez sua estreia junto com um vilão clássico, Ahmet Abdol, o Faraó Vivo, mais tarde Monólito Vivo, personagem recorrente em outras histórias da editora e com uma longa ligação com o Destrutor.
Lorna Dane, namorada de Alex, também estreou junto com Alex, uma mutante de cabelos verdes, com poderes magnéticos, que também faria parte dos X-Men, como Polaris, e que mais tarde foi estabelecida como uma filha perdida de Magneto, o maior vilão do heróis.
Mais dois vilões da galeria de inimigos dos X-Men foram criação de Arnold Drake: Erik Escarlate, um disfarce usado por Ciclope, e que mais tarde foi usado por um agente secreto maligno do Império Shiar na Terra, uma das raças mais influentes da galáxia no Universo Marvel, e Mesmero, mutante de pele verde, com poderes de hipnose.
Guardiões da Galáxia
Drake também escreveu histórias para o Capitão Marvel, Ka-zar (o Tarzan loiro da editora), e na revista Marvel Super-Heroes #18 (janeiro de 1969), junto com ninguém menos que Stan Lee e o desenhista Gene Colan (mais uma lenda das HQs), deram vida aos Guardiões da Galáxia, um grupo bem diferente daquele visto nos filmes da Marvel Studios, mas igualmente inventivo em sua concepção.
No futuro dos ano 3007, a humanidade se espalhou pelo universo, e colônias foram estabelecidas em diversos planetas do Sistema Solar e além dele.
Um grupo de seres nascidos nesses planetas se reúnem para enfrentar a raça invasora Badoon, que está destruindo as civilizações dos planetas. Charlie-27, de Júpiter, Martinex, de Plutão, Vance Astro, da Terra, e Yondu Udonta, de Centauri IV, são os protagonistas em um primeiro momento.
A série de Arnold e Gene teve curta duração, mas os anos 90 viram uma série de 62 números da revista, capitaneada pelo artista Jim Valentino, que fez a chama ficar acesa.
Nos anos 2000, a dupla Dan Abnett e Andy Lanning promoveu uma reformulação que deu vida a uma nova revista dos Guardiões da Galáxia, com personagens como Senhor das Estrelas, Groot, Rocket Racoon e muitos outros, um line-up novo de heróis, que deu base para os filmes dos cinemas. Antes do ano de 1969 terminar, Arnold Drake deixou a Marvel.
O peso histórico
de Arnold Drake
Muitos sites e jornalistas especializados dão crédito para Arnold Drake ter feito a primeira graphic novel — uma publicação mais sofisticada em papel e formato — do mercado de quadrinhos ainda na década de 1950, no início de sua carreira.
Trata-se de It Rhymes with Lust, com arte de Matt Baker, um trabalho publicado pela editora St. John.
Matt Baker era Clarence Matthew Baker, desenhista desde 1930, e o primeiro artista negro americano a fazer quadrinhos. O Universo HQ fez uma matéria sobre ele.
O escritor também escreveu peças de teatro e até dois filmes: The Flesh Eaters (1964) e Who Killed Teddy Bear (1965).
Depois que parou com a Marvel, Arnold Drake foi para a Gold Key, editora americana que publicava um vasto material, de Disney e Hanna-Barbera a materiais mais adultos de terror e sci-fi.
Lá, ele desenvolve quadrinhos de Jornada nas Estrelas, Além da Imaginação e Boris Karloff Tales of Mystery (ator que interpretou O Monstro de Frankenstein, no filme clássico da Universal).
Ao mesmo tempo, ele fazia trabalhos freelances para a DC, em Weird War Tales (revista de guerra com sobrenatural) e Supermoça.
Depois disso, ele começa a se envolver em cargos burocráticos em organizações beneficentes para artistas. Um dos últimos trabalhos nos quadrinhos de Arnold Drake foi em G.I. Combat #276 (abril de 1985), outra revista de guerra da DC, a mais longa em atividade nos EUA, encerrada apenas em 1987.
O título existia desde 1952, criada pela editora Quality Comics, e mantida pela DC Comics durante todos esses anos — Quality Comics (#1-43) e DC Comics (#44-288) –, uma revista que sobreviveu até mesmo a reformulação editorial e criativa de Crise nas Infinitas Terras.
Uma edição especial hardcover da Patrulha do Destino, de 2012, teve um texto introdutório de autoria de Arnold Drake, e ele faleceu antes de trabalhar em uma futura graphic novel do grupo.
Arnold Drake faleceu em 2007, logo depois de participar da New York Comic Book Convention, um dos grandes eventos de quadrinhos dos EUA.
Ele tinha 82 anos.
“A indústria dos quadrinhos era como um bordel, com os editores agindo como cafetões, e os artistas como as garotas.“
Arnold Drake, Pancadaria, de Reed Tucker (2017, página 154)
/ VISUAL. Se Arnold Drake criou o Destrutor, foi o desenhista Don Heck quem fez sua concepção visual inicial, e Neal Adams o criador de seu design de herói. Os dois artistas são lendas dos quadrinhos americanos, e terão suas matérias aqui no blog também. Alex Summers estreia com seu uniforme de herói no traço de Adams, e seu codinome original, Havok, é uma palavra inglesa de derivação francesa, geralmente usada como sinônimo de destruição.
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