LOLLAPALOOZA | O festival de música que começou como despedida

Lollapalooza é uma antiga expressão americana para definir algo “impressionante”, “incrível”, e que acabou relacionada ao mundo da música ao batizar um festival de rock.

Perry Farrel, músico com passagens por diversas bandas de rock, a ouviu em um episódio do Os Três Patetas.

O aspecto de diversidade é uma característica presente no festival desde 1991, quando Farrel, então cantor e líder do Jane´s Addiction, banda de metal alternativa dos anos 80, o criou nos Estados Unidos.

Originalmente, o Lollapalooza foi concebido para ser a despedida de Farrel do mundo da música. O vocalista queria o nascimento de uma “nação alternativa”, e colocou sob seu guarda-chuva o grunge e o rap ao lado do rock tradicional para fazer um festival que fosse entendido como de contracultura.

Assim foi carimbado e foi vendido, mesmo com headliners de peso nos palcos, como Pearl Jam, Alice in Chains, Rage Against The Machine e Red Hot Chili Peppers.

A primeira edição de 1991 do Lollapalooza aconteceu em Chicago, e teve o Nine Inch Nails e Siouxsie and the Banshees, e essa foi a única edição com apenas um palco para os artistas. E era para ser a despedida de Perry Farrel do Jane´s. E não o início de um festival.

Mas fez sucesso demais. O grupo ficou de fora do festival britânico Reading Festival, e Perry, com dor de cotovelo, resolveu fazer um para chamar de seu, inspirado no Gathering Of The Tribes, festival organizado por Ian Astbury, do The Cult.

Os anos 90 do Lollapalooza

Em 1992, no segundo Lollapalooza, além do Red Hot Chili Peppers e do Pearl Jam, aconteceram shows do Ministry, Soundgarden e The Jesus and Mary Chain, e Ice Cube representou o rap pela primeira vez no festival de música, como Perry desejava.

No ano seguinte, o Lolla EUA trouxe o Alice in Chains, Primus e Dinosaur, Jr. O Primus foi a convite pessoal do Perry. O Rage Against The Machine se apresentou na Filadélfia.

Nirvana estaria nos palcos do festival Lollapalooza em 1994, mas no dia 7 de abril, a banda comunicou que não participaria mais do evento. Um dia depois, Kurt Cobain deu um tiro de espingarda calibre 12 na própria fuça, e mudou a história do rock para sempre.

Em 1995, se apresentaram Sonic Youth, Hole, Elastica e Cypress Hill no festival Lollapalooza.

Na edição de 1996, o público alternativo que queria bandas fora do mainstream se revoltou com a escalação ~alternativa ~ do Metallica. A treta deve ter sido feia, pois Farrel se afastou do comando do festival Lollapalooza depois disso.

Ele também achava que ter o Metallica no evento ia contra o espírito do que era o Lolla. Eles vinham da turnê do Black Álbum e do recente Load, trabalho divisor de águas na carreira deles. O Lollapalooza 1996 foi onde os Ramones apresentaram seu penúltimo show.

Em 1997, apareceu o pessoal de country e eletrônico na diversidade proposta pela nova organização. E estavam misturados a tudo isso os caras do Devo, The Prodigy, Korn e Snoop Dogg.

O resultado da mistureba do ano anterior foi que em 1998 os novos organizadores nem conseguiram fechar headliners, e o festival Lollapalooza  simplesmente acabou. Ficou morto por seis anos.

A ressurreição do festival nos anos 2000

Só em 2003 que Perry Farrel se animou novamente, trazendo o Jane´s Addiction de volta a vida, e junto o festival Lollapalooza. Chamou também o Queens of The Stone Ages, Audioslave e Kings of Leon. E mesmo assim, algo não funcionou. 2004 não teve outro.

Em comum, todos esses Lolla eram itinerantes: viajaram pelas cidades dos Estados Unidos e Canadá.

Mas em 2005, o festival conquistou um local em Chicago, o Grant Park. Farrel decidiu entrar numa parceria com a empresa Capital Sports & Entertainment. Conseguiu financiamento e grana para produzir mais uma edição.

Nesse ano, tocaram Pixies, Weezer, The Killers, Arcade Fire, Black Keys e muitas outras bandas dos fins dos anos 90 e outras representantes dos anos 00.

O caminho se mostrou viável para Perry. Em 2006, se apresentaram Red Hot Chili Peppers, Kanye West e Manu Chao. Bateu o recorde de atrações, com 130 apresentações.

Em 2007, tocaram Pearl Jam, Daft Punk e Muse. Uma ainda desconhecida Lady Gaga se apresentou.

Mais de 225 mil pessoas compareceram na edição de 2008 para assistir o Radiohead, Rage Against the Machine e Nine Inch Nails. Nesse ano, surgia o primeiro palco para a música eletrônica.

Em 2009, o criador Perry tocou com sua banda Jane’s Addiction na formação original. As atrações principais foram Depeche Mode, Tool e The Killers.

O Brasil na rota do Lolla nos anos 2010

Em 2010, Lady Gaga gastou US$ 100.000 doletas em seu palco do Lolla. Também tocaram Soundgarden, Green Day e The Strokes.

No ano seguinte, se apresentaram Foo Fighters, Coldplay e Muse.

E surge a primeira edição internacional, realizada no Chile.

Em 2012, o Brasil recebeu seu primeiro Lollapalooza, ano de intervalo do Rock in Rio, e depois da “morte” do SWU. Tocaram aqui o Foo Fighters e Arctic Monkeys. Mais de 130 mil pessoas foram assistir. Um ingresso por dia era R$ 300. Para os dois, ficava R$ 500.

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Em 2013, Pearl Jam, The Killers, The Black Keys, deadmau5, Queens Of The Stone Age e Planet Hemp.

Em 2014, as atrações principais foram o Arcade Fire, Nine Inch Nails, Soundgarden, Phoenix e Julian Casablancas.

No ano seguinte, o festival se espalha para a Europa, e Berlim é a primeira cidade a receber shows.

No Brasil, em 2015, estavam aqui nomes como Jack White, Pharrell Williams, Robert Plant, Foster The People, Kasabian, Interpol e Smashing Pumpkins.

O Metallica foi anunciado como uma das principais atrações nos EUA, juntamente com Paul McCartney e Florence + The Machine. Ter de novo o Metallica representa muito, já que as farpas entre a banda e Perry deve ter sido sanada nos bastidores.

Em 2016, cá estavam o Eminem, Florence + The Machine, Jack Ü, Mumford & Sons, Noel Gallagher, Tame Impala e Alabama Shakes.

A edição 2017 brasileira veio com Duran Duran, The Strokes, Rancid (punk inédito em solo brasileiro), um montão de Djs da EDM, The Weekend e The xx. Em 2018, o Pearl Jam, Red Hot Chili Peppers e The Killers.

No último Lollapalooza Brasil/2019, aconteceram apresentações do Arctic Monkeys, St. Vincent, Lenny Kravitz, Kings of Leon, Greta Van Fleet, Kendrick Lamar e Interpol.

E chegamos no temido ano de 2020, com um line-up que traria o Guns N’ Roses, Lana Del Rey, Travis Scott, Vampire Weekend, The Strokes e Gwen Stefani. Mas como todos sabemos, a pandemia alterou todas as dinâmicas de entretenimento presencial no mundo, e o Brasil não foi exceção.

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arte promocional do Festival Lollapalooza 1992, Estados Unidos

Não apenas a característica de despedida é singular no Lollapalooza, mas a sincronicidade que artistas promovem nos eventos. Em 2018, no Brasil, o festival Lollapalooza rolou nos dias 23, 24 e 25 de março.

O Red Hot Chili Peppers e LCD Soundsystem foram os headliners no dia 23; Pearl Jam e Imagine Dragons, no dia 24; e The Killers e Lana Del Rey, no dia 25. Foi a sétima edição brasileira.

O line-up foi de uma ponta a outra da corda entrelaçada do hype atual, mais comercial, e resgatiu atrações que já se apresentaram antes. Em 1992, o Red Hot e o Jam já estavam tocando juntos no Lolla, pelos palcos dos Estados Unidos e Canadá.

A maratona começou em 18 de julho, em Mountain View, Califórnia, seguindo para Vancouver, no Canadá, apresentações em Brementon, próximo a Seattle, passando por Tinley Park, até chegar aos últimos três shows do Pearl Jam em Irvine, Califórnia, nos dias dias 11, 12 e 13 de setembro.

O festival de 1992 é importante para as duas bandas, pois dois petardos de discos tinham sido lançados no ano anterior: Ten e Blood Sugar Sex Magik.

O Pearl Jam era praticamente unanimidade nos anos 90. Uns preferiam mais Soundgarden, outros o Alice in Chains, mas todos sabiam quem eram Eddie Vedder no tripé sebento do grunge modinha da época.

Em 92, o Jam lançou seu primeiro disco, Ten. Já estava nas prateleiras em 27 de agosto de 1991 pela Epic Records, com Vedder, Jeff Ament e Stone Gossard (ex-Mother Love Bone), Mike McCready e Dave Krusen na formação. O disco foi um sucesso de vendas, com mais de 14 milhões de cópias vendidas.

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As apresentações eram intensas, com faixas que hoje são clássicas, como Alive, Even Flow e Jeremy, todas falando de temas sebosos do estilo, como depressão, suicídio, solidão e assassinato.

O Soundgarden também estava no Lolla em 1992, e seus vocalistas resolveram pegar as guitarras para uma performance de Hunger Strike, o hit do supergrupo Temple Of The Dog, do qual os dois faziam parte. Essa e as músicas do Pearl Jam no festival podem ser encontradas no YouTube, e valem a conferida.

Eddie Vedder é um frontman que entrega uma grande apresentação, canta praticamente igual aos discos.

Já o Red Hot Chili Peppers tinha lançado seu primeiro grande sucesso — e quinto álbum da carreira — o Blood Sugar Sex Magik, em 24 de setembro de 1991.

Foram 19 milhões de cópias vendidas em todo o mundo. Lançado no mesmo dia do Nevermind do Nirvanna, tranquilamente figura lado a lado com ele como melhores discos de rock já lançados.

Punk, funk e heavy metal nas músicas de Give it Away, Suck My Kiss, Breaking The Girl e Under The Bridge, com letras sobre relacionamentos com mulheres e drogas.

Crítica e avaliação nas alturas, o Red Hot voava em shows constantes e devoção da mídia e fãs. Mas na turnê desse álbum, John Frusciante deixou o grupo a poucos dias de começar o Lolla. Não suportou toda a pressão e constantes viagens.

Ele tinha ocupado a vaga do guitarrista original da banda, Hillel Slovak, grande amigo do vocalista Anthony Kieds, morto por overdose de drogas, referenciado na canção Under The Bridge. A vaga foi ocupada por Arik Marshall que praticava até cinco horas por dia durante três semanas.

O quarteto californiano apimentado segue na atividade de tentar superar o último trabalho bom que apresentaram, o disco de 2011, I´m With You. O mais recente deles, The Getaway, de 2016, infelizmente não é tão bom.

O Lollapalooza, com o mesmo destaque de bandas indies a mainstream, ainda trazia pérolas populares desconhecidas. Tirando o fato de qualquer um que frequente baladas de rock querer ouvir Psycho Killer ao vivo, ter David Byrne no palco o Lolla 2018/BR significou muito mais.

Fundado em pleno punk rock, os Talking Heads soltavam grooves quadrados intelectuais de new wave, e ainda assim, dançantes. Byrne era o líder e cantor da banda. Tem Oscar e Globo de Ouro na estante de casa por seu trabalho em trilhas sonoras, tem sua própria gravadora, a Luaka Bop, e tocou no Lolla com um novo disco debaixo dos braços, American Utopia.

Estava há 9 anos sem fazer turnê. O músico escocês tinha lançado seu último disco, Grown Backwards, em 2004. Durante esse período, o ex-Talking Heads colaborou com artistas como o amigo produtor Brian Eno, a cantora St. Vincent e o o DJ Fatboy Slim.

Vida e morte do Lollapalooza em 2020

Lollapalooza festival
Dave Grohl, líder do Foo Fighters, no Lolla BR/2012. De longe, no telão, prenuncia o movimento de sobrevivência que os festivais de música teriam em 2020, ano que o Covid-19 mudaria para sempre

Enquanto o festival Lollapalooza 2020/EUA rolou de modo online, a T4F, produtora responsável pelo evento, anunciou que o festival Lollapalooza Brasil voltaria a acontecer apenas em setembro do próximo ano, nos dias 10 a 12. Isso também foi alterado, e agora as novas datas são nos dias 25, 26 e 27 de março de 2022. Os ingressos comprados ainda valem, já que não existe mais reembolso.

Confira o line-up do Lollapalooza BR 2022:

A questão dos impactos que o Covid-19 provocou no mercado da música foram abordados em uma análise sobre a onda de lives que ocorreu no começo da quarentena.

Com efeito, uma das primeiras matérias deste ano no blog foram os mais de 150 eventos e festivais que aconteceriam no país, um mapeamento de fôlego que a SIM promoveu, e que claro, caducou logo depois da chegada do corona vírus no Brasil.

A Semana Internacional de Música de São PauloSIM São Paulo – é a maior feira do mercado musical da América Latina e, desde 2013, reúne profissionais de todo o mundo durante cinco dias para discutir as tendências no setor, além de capacitar e criar oportunidades de negócios.

O ano de 2021 virá com outras dinâmicas comerciais, sobrepostas as expectativas geradas com uma eventual retomada das atividades de todas as áreas afetadas.

Hoje (por enquanto), três ou quatro empresas megacorporativas controlam os maiores eventos musicais do mundo. Além do Lollapalooza, a Live Nation é dona do Bonnaroo, do Austin City Limits e do festival de música eletrônica EDC. Por isso que tudo é embalado da melhor forma que o marketing pode entregar, e por isso é caro.

/// LINE-UP. A matéria, por óbvio, não relacionou todos os artistas que se apresentaram em todas as edições do Lollapalooza, apenas os que julgou mais relevantes a título de informação. A foto usada para a matéria é da assessoria de imprensa do festival, na primeira edição brasileira do evento, em 2012, show do Foo Fighters.

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