ZODÍACO | Uma obra-prima do cinema de suspense criminal

Zodíaco (2007) e sua trama de investigação sobre os horríveis assassinatos ocorridos entre 1960 e 1970 na costa californiana dos Estados Unidos se tornou uma obra-prima do cinema nas mãos do diretor David Fincher.

A longa jornada sobre a caça a um serial killer que aterrorizou o país e que ficou no imaginário popular dos americanos, em especial do pequeno David, uma criança morando na Califórnia, palco principal das mortes, com as autoridades tentando de tudo para desvendar a identidade do criminoso, que mandava cartas cifradas para os jornais, onde revelava detalhes pessoais e dos crimes, tripudiando da ineficácia policial.

A impotência perdura até os dias de hoje, sem que de fato a real identidade do Zodíaco, como ele se auto-intitulou, seja cravada com toda a certeza.

Zodíaco
Arte promocional do filme Zodíaco

Fincher cresceu, estudou propaganda, filmou comerciais e começou a dirigir clipes na indústria musical, com trabalhos em cima das músicas de artistas como Maddona, Billy Idol, Paula Abdul, Aerosmith, Roy Orbison, George Michael e muitos outros.

Se tornou cineasta, e fez filmes como Alien 3 (1993), Seven: Os Sete Crimes Capitais (1995) — um dos maiores filmes de suspense criminal de todos os tempos –, Vidas em Jogo (1997), Clube da Luta (1999), O Quarto do Pânico (2002), até filmar Zodíaco, onde sua direção já estava mais do que segura e precisa. É por isso que Zodíaco é até mesmo superior à Seven.

Cena de um dos assassinatos que o Zodíaco cometeu
Um dos vários códigos que o Zodíaco mandou para a imprensa

Houve livros e filmes sobre os crimes executados pelo assassino Zodíaco na Califórnia, mas nada chegou tão perto do longa-metragem de Fincher, poderoso em sua construção e ambientação, com elenco afinado e uma trilha sonora perfeita para uma imersão completa.

Nos sentimos nas ruas das cidades e sentimos o peso do suspense e descrédito da situação, que se arrastou por anos.

O serial killer nunca foi capturado, e isso é palpável no longa, que mais do que um suspense criminal, como sublinhado no título, é uma poderosa ferramenta de discussão a respeito de obsessão e o papel da mídia em cima do mundo e grotesco do nosso dia a dia e do extraordinário.

Um dos melhores cartazes do filme

Zodíaco
(Zodiac, 2007, de David Fincher)

spoilers

O filme começa com a canção Easy to Be Hard, da banda Three Dog Night, prenúncio da excelente curadoria da trilha sonora.

Leia a matéria com a trilha:

Easy To Be Hard – Three Dog Night
Sky Pilot – Eric Burdon & The Animals
Soul Sacrifice – Santana
Bernadette – Four Tops
I Want to Take You Higher – Sly & The Family Stone
Hyperbolicsyllabicsesquedalymistic – Isaac Hayes
Inner City Blues (Make Me Wanna Holler) – Marvin Gaye
Brother Louie – Stories
Hurdy Gurdy Man – Donovan
It’s Not for Me to Say – Johnny Mathis
Lowdown – Boz Scaggs
Deacon Blues – Steely Dan
Spooky Nights – Thomas Chase
Mary’s Blues – John Coltrane
Snowbird – Anne Murray
Arrivederci, Roma – Mario Lanza
I Never Promised You – Lynn Anderson
Crystal Blue Persuasion – Tommy James & The Shondells

4 de julho de 1969
Vallejo, Califórnia
Darlene Ferris (Ciara Moriarty) se encontra com Mike Mageau (Lee Norris) para sair de noite de carro, mas ela parece se alarmar com outro veículo na lanchonete onde foram comer. Ela é casada, mas encontra outros homens com frequência.

Quando os dois param em um acostamento numa estrada afastada, David Fincher não demora nada a mostrar sobre o que o filme Zodíaco será.

O assassinato com a música Hurdy Gurdy Man, do Donovan, não poderia ter sido melhor escolhida.

O assassino misterioso nas sombras dispara mais vezes na mulher, e isso diz muito sobre seu modus operandi, como será verificado pela polícia mais tarde.

O primeiro assassinato do Zodíaco em Vallejo, Califórnia, ainda no final dos anos 1960

4 semanas depois
São Francisco, Califórnia
O card com o nome do filme é acompanhado da fala “estude bastante”, de Robert Graysmith (Jake Gyllenhall), para seu filhinho antes dele entrar na escola.

Também será um dos pilares com o qual o longa-metragem trabalhará. Robert é cartunista político no jornal impresso São Francisco Chronicles.

A reunião de pauta da qual participa atende à veracidade do trabalho jornalístico em um jornal impresso muito bem, e é quando vemos que uma carta chegou endereçada ao editor-chefe.

O assassino começa a enviar cartas para a imprensa de São Francisco
O cartunista político Robert Graysmith, do São Francisco Chronicle, fica obcecado em descobrir quem é o autor das cartas

Ela informa e detalha as mortes de Darlene (Mageau sobreviveu). Há um código junto. E isso vai desencadear anos e anos de outros assassinatos perpetrados pelo autor, que numa segunda carta já se auto-intitula Zodíaco.

O repórter Paul Avery (Robert Downey Jr.) está na estica, bonitão, e nem parece que entrará numa espiral devastadora.

Cópias do código são enviadas para as autoridades, como o setor de inteligência naval, FBI (a polícia federal americana) e até a CIA (a agência secreta militar americana de política externa), mas é um casal ordinário, um professor de história e sua esposa dona-de-casa, da cidadezinha de Salinas, quem desvendam o código, que mostra as motivações do assassinato.

Até a CIA tenta desvendar o código

27 de setembro de 1969
Napa, Califórnia

Em um lago em Napa, o Zodíaco vai atacar mais um casal

Na beira do lago Berryessa, um casal é morto à facadas por uma sinistra figura vestida de preto, em uma cena horrível com a mulher aterrorizada.

Cecilia Shepard (Pell James) morre, mas de novo o homem atacado escapa: Bryan Hartnell (Patrick Scott Lewis).

Robert, que ficou fascinado com o primeiro código, mergulhou de cabeça para tentar resolver o quebra-cabeça dos assassinatos, e desenha um retrato falado do assassino no lago

Ele é tratado como pária pelos colegas de jornal, por ser mais quieto e introspectivo, mas ele e Paul criam alguma conexão por conta do caso, os dois começando a largar tudo para descobrir quem é o Zodíaco.

Graysmith desenha o retrato falado do criminoso

11 de outubro de 1969
São Francisco, Califórnia
Na introdução desse assassinato — o taxista Paul Stine (Charles Schneider) –, Fincher mostra a opinião do povo sobre os assassinatos, que já estão famosos na mídia, via jornalismo de rádio, elencando já os culpados, como caipiras (!), satanistas (!!) e a própria mídia.

Na polícia, os encarregados da investigação são os inspetores David Toschi (Mark Ruffalo) e William “Bill” Armstrong (Anthony Edwards).

Na terceira carta enviada para a imprensa, ela já vem com pedaços de roupa do taxista, manchados de sangue. O Zodíaco agora começa a ameaçar atirar em crianças dentro de ônibus escolares.

Graysmith e Avery constroem uma curiosa relação de amizade e trabalho em cima da identidade do Zodíaco

Uma das pistas obtidas no caso do lago Berryessa em Napa são marcas de pegadas feitas por uma bota Wing Walker, de uso exclusivo militar, para andar sobre asas de aviões.

A pressão por resultados nas autoridades se reflete na imprensa, e Paul Avery começa a ficar concentrado demais no trabalho de desvendar a identidade do assassino, e isso começa a deixá-lo estragado por fora.

O laço que Fincher constrói aqui entre polícia e mídia é uma de muitas camadas de discussão que Zodíaco trata.

22 de outubro de 1969
Um homem que se diz o assassino afirma que vai ligar para um programa de TV ao vivo, pede presença de Melvin Belli (Brian Cox), um dos mais famosos advogados dos Estados Unidos (teve vários clientes célebres, como Errol Flynn, Chuck Berry, Muhammad Ali, os caras do Rolling Stones, Lana Turner, Tony Curtis, Mae West e até Jack Ruby, que disparou contra Lee Harvey Oswald pelo assassinato de John F. Kennedy).

A presença dele no filme se soma em importância quando Bill e Toschi descobrem que o assassino enviou cartas para a casa dele também, e até ligou várias vezes, conseguindo conversar com a governanta da casa.

22 de março de 1970

Os policiais encarregados do caso: David Toschi e Bill Armstrong

Um homem misterioso tenta matar mãe e filha numa estrada da região, em mais uma cena tensa de Fincher.

As duas escapam por muito pouco. Mais quatro cartas do Zodíaco são enviadas para a imprensa. De tanto fuçar, Paul descobre que o Zodíaco estava se “apropriando” de outro crimes noticiados, assumindo a autoria deles para engordar sua lista, que já tem 13 vítimas, mas será mesmo esse número então?

O repórter também descobre e mostra para Robert de onde o assassino pode ter tirado seu “logo” e nome: uma propaganda de relógio, de marca Zodiac, com uma mira, tal qual o desenho que mandou em sua primeira carta.

11 de outubro de 1970
Toschi e Bill se reúnem na esquina onde o taxista foi morto pelo Zodíaco, no aniversário de 1 ano do assassinato, ainda sem nenhuma pista.

Robert tem um encontro com Melanie (Chloë Sevigny), completamente hilário pelo jeito do cartunista, mas a moça acha o encontro mais interessante de sua vida, já que Robert esta mais preocupado com Paul indo atrás de uma pista.

O humor é muito bem dosado pelo diretor, que faz uma engraçada “peneira” que Bill e Toschi fazem de eventuais suspeitos. O chefe dos dois não tem mais homens para por no caso, e eles tem que se virar para fazer tudo.

27 de julho de 1971
Torrance, California

O depoimento que mudaria toda a investigação do caso

Bill pega o depoimento de Donald Cheney (John Hemphill), amigo de um homem com quem pescava. O lago Berryessa era um dos locais. Esse homem teria falado anos atrás para Donald sobre os assassinatos que agora ele viu acontecer pela mídia.

Ele tentou contar tudo para a polícia antes, mas não foi ouvido, “pensaram que ele era louco“, diz seu chefe, que acompanha o depoimento. Inacreditavelmente, tudo leva a crer que esse homem pode ser mesmo o Zodíaco.

4 de agosto de 1971
Vallejo, California
A polícia descobre o paradeiro de Arthur Leigh Allen (John Carroll Lynch), o tal homem da pesca, que revelou todo o plano para Donald.

Junto com Bill e Toschi, vai junto o sargento Jack Mulanax (Elias Koteas), da Polícia de Vallejo, onde Leigh trabalha.

É uma aula de cinema, pois para se criar o desprendimento necessário e a suspeita crível de ser ou não o Zodíaco, todos os atores tem que estar afinados, e a composição da cena em si não pode falhar em um único momento.

Apesar do Toschi de Ruffalo ser um tom acima de esnobe e arrogante, o talento do ator sobrepuja isso tranquilamente. É uma das melhores cenas do filme, e Lynch é magnífico aqui.

Arthur Leigh Allen, um dos suspeitos de ser o Zodíaco
Ele usa um relógio da marca Zodíaco, que tem uma “mira” balística de logotipo

A polícia já conta com outros 2.300 suspeitos, e o peso da burocracia esmaga o avanço em cima de Leigh, que parece bem culpado para Bill e Toschi.

1 ano depois
O diretor David Fincher mostra o crescimento da cidade de São Francisco, muito bonito ao som de Inner City Blues, de Marvin Gaye, em outra bela cena do filme.

Avery chegou ao fundo do poço em sua obsessão pelo Zodíaco também e sai fora do jornal, mesmo com Robert e até os chefes querendo ajudá-lo.

7 de setembro de 1972
A cunhada de Leigh informa que ele agora mora em um trailer, assim conseguem um mandado fora da jurisdição antiga da qual onde ele estava.

É a oportunidade perfeita do diretor mostrar o quanto que o suspeito é esquisito e tem hábitos estranhos, e de Bill e Toschi vasculharem o trailer atrás de pistas. Um dos maiores problemas aqui é ter amostra de letras de Leigh, para comparar com as cartas enviadas para a imprensa.

O fato dele ser ambidestro complicado tudo, mas os inspetores conseguem o que queriam. Amostras de letras, roupas e até armas.

A polícia finalmente consegue um mandado de busca e apreensão contra LeighMas nada bate. E Leigh escapa de que qualquer suspeita neste ponto.

Há uma metalinguagem bem interessante no Zodíaco de Fincher, quando Toschi está no cinema com a esposa, onde assistem Perseguidor Implacável (1971), de Don Siegel, com Clint Eastwood como “Dirty” Harry Callahan, um policial durão que trabalha em um caso baseado nos assassinatos do Zodíaco — na trama, ele persegue um assassino serial chamado Scorpio que mata pessoas em São Francisco.

É quando Robert, que ainda investiga por conta própria o caso, encontra pela primeira vez Toschi. Ele diz que ele vai conseguir prendê-lo, mas Toschi diz que “estão até fazendo filmes sobre isso.”

4 anos depois
Bill abandona o Setor de Homicídios da Polícia de São Francisco. Prefere ir para Fraudes. Robert vai atrás de Paul, nessa altura perdido na vida, no buraco, dentro de um barco ancorado na Baía de São Francisco.

O cartunista pensa em pedir os arquivos jornalísticos do caso para o repórter, que mais prefere beber do que qualquer outra coisa. Ele trata mal Robert, que vai embora decepcionado.

17 de outubro de 1977
Toschi está de novo parado na esquina da Washington com a Cherie, o local do assassinato do taxista anos atrás. Robert o procura de novo, já que conduz há tanto tempo sua própria investigação paralela, e nessa altura arranjou até outro suspeito: Rick Marshall.

Uma nova carta do Zodíaco chega depois de anos, e Toschi é implicado como autor dela, o que o arrasa por completo — ele é até retirado da Homicídios pela Corregedoria. Robert tenta mais uma vez um encontro com o detetive, mas é rechaçado.

9 de agosto de 1979
Robert dá uma entrevista para a TV sobre o caso Zodíaco, já que conseguiu desvendar o código de uma das cartas do assassino enviada anos atrás.

Um Paul Avery destruído, parecendo à beira da morte, bebendo em um bar e com respirador de oxigênio do lado, o vê pela televisão de um bar, e finalmente nota o empenho sincero do cartunista, o congratulando por pensamento.

Graysmith é outro caminhão desgovernado, destruiu seu casamento indo atrás de pistas e mais pistas, e sua fixação o leva até ao possível paradeiro de Rick Marshall, ao interagir com um homem que trabalha em exibição de filmes antigos.

Graysmith arrisca o pescoço para tentar achar o Zodíaco

É uma das mais angustiantes construções de tensão do cinema, em uma inversão de expectativas que funciona à perfeição pelas mãos de Fincher.

E ele se mete em uma das maiores enrascadas da sua vida

Robert não se dá por vencido e tenta contato com a irmã de Darlene, atualmente presa em uma cadeia. Ela diz que a irmã saía com um homem esquisito algumas vezes. Não se lembra direito do nome. Robert diz que é Rick Marshall.
Não é.
Ela se lembra. Era um nome simples.
Leigh“.

Ironicamente, é graças à (agora) ex, Melanie, que consegue uma pista valiosa, um documento que o coloca em direção definitiva à Leigh Allen.

Zodíaco
Chegou um ponto em que Melanie não suportou mais viver com Robert
Zodíaco
E ele mesmo reconhece o buraco em que está
Zodíaco
Mas é graças a ela que o cartunista chega o mais perto possível do suspeito de ser o Zodíaco

O único, de 2.500 suspeitos, quem mandou uma carta para Toschi. Mais uma vez o cartunista tenta um encontro com o detetive, e a resolução dos dois juntos é, por assim dizer, o clímax do filme.

20 de dezembro de 1983
Vallejo
Robert Greysmith vai em uma lojinha da cidade. Lá, ele encontra Leigh, cara a cara.
Ele trabalha de atendente. Robert queria apenas ver o rosto do homem, aquele que considera ser o Zodíaco.

Zodíaco
Arthur Leigh Allen

16 de agosto de 1991
Ontário, Canadá
No aeroporto, vemos um policial a caminho de uma sala. Ele leva vários documentos, além do livro publicado por Robert Graysmith a respeito do Zodíaco. Ele se encontra com Mike Mageau, que estava desaparecido há anos.

E ele identifica Leigh em uma fotografia junto com outros suspeitos.
Eu tenho certeza que foi esse homem quem atirou em mim.”

Zodíaco
Mike Mageau identifica o atirador

Arthur Leigh Allen morreu antes de ser acusado pelos crimes, de ataque cardíaco.

Em 2002, um exame de DNA, feito de uma amostra retirada de uma das cartas do Zodíaco, não correspondeu ao de Leigh. Autoridades policiais se recusaram a acreditar na veracidade dos testes.

Em 2004, o Departamento de Polícia de São Francisco encerrou o caso, que na época do lançamento do filme, permanecia em aberto nas jurisdições policiais de Napa, Vallejo e Solano. Depois de Zodíaco fazer sucesso nas telonas, o caso foi reaberto em São Francisco.

A vida real por trás do filme

Zodíaco
Jake Gyllenhall, Robert Graysmith e Mark Ruffalo

David Fincher, o roteirista James Vanderbilt e o produtor Bradley J. Fischer demoraram 18 meses conduzindo pesquisas a respeito do Zodíaco, para adicionar ao material-base do livro Zodiac, de Robert Graysmith. James tinha lido o livro em 1986, enquanto estava no ensino médio.

Anos mais tarde, já roteirista de cinema, reuniu-se com o cartunista e ficou fascinado pelo folclore em torno do assassino.

Seu roteiro, nessa altura já com Fincher, ficou rodando Hollywood por alguns anos, até entrar em produção. Já Fincher foi atraído porque ele passou a maior parte de sua infância em San Anselmo, no Condado de Marin, Califórnia, durante os assassinatos iniciais do Zodíaco, e lembra muito bem do clima de terror em volta do caso.

O livro de Robert Graysmith

Na época, George Lucas era estudante de cinema na University of Southern California, e foi fortemente impactado também.

Ele gostava tanto do detetive David Toschi que o nome batizou a Tatooine Tosche Station, vista no primeiro filme de sua saga espacial, Star Wars – Uma Nova Esperança (1977).

Um jovem Fincher, ainda no começo da carreira, trabalhou na empresa do diretor, a empresa de efeitos especiais ILM (Industrial Light and Magic) de 1981 a 1983.

Zodíaco
Jake Gyllenhall, Chloë Sevigny e David Fincher

A escolha do estúdio Warner, que aceitou produzir o filme, em trabalhar com David Fincher se deu, é claro, por conta do trabalho de sua direção em Seven: Os Sete Crimes Capitais (1995).

Depois de Zodíaco, Fincher só fez filmaço: O Curioso Caso de Benjamin Button (2008), A Rede Social (2010), Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres (2011), Garota Exemplar (2014), e até séries de TV, como Mindhunter (2017-2019).

Alguns dos filmes preferidos do cineasta: : Butch Cassidy (1969), Drácula (1931), Janela Indiscreta (1954), Muito Além do Jardim (1979), Tubarão (1975), Lawrence da Arábia (1962), O Vale das Bonecas (1967), De Volta ao Vale das Bonecas (1970), Dr. Fantástico (1964), (1963), Alien – O 8º Passageiro (1979), Loucuras de Verão (1973), Cidadão Kane (1941), Cabaret (1972) e O Ano que Vivemos em Perigo (1982).

Fincher foi o produtor executivo e até mesmo dirigiu alguns episódios da premiada House of Cards (2013-2018), e ele tem afirmado em entrevistas recentes que Zodíaco na verdade tinha que ter sido uma série de TV, tamanha a abordagem que ele queria imprimir na obra e narrativa.

Seu trabalho mais recente será um seriado de Chinatown, uma prequel do clássico filme de 1974, um dos maiores clássicos do cinema policial e suspense criminal.

Fincher, James e Fischer entrevistaram testemunhas, familiares das vítimas, suspeitos, policiais aposentados que trabalharam no caso e até mesmo sobreviventes.

O roteiro teve 200 páginas, que tentou se agarrar à verossimilhança o máximo que conseguiu. Os produtores contrataram até um detetive particular para rastrear Mike Mageau para ter relatos dele, depois de todo esse tempo.

Quando Mark Ruffalo encontrou o verdadeiro David Toschi, ficou impressionado com a habilidade de memória do inspetor de lembrar muitos detalhes do caso ainda.

Zodíaco
David Toschi interpretado por Mark Ruffalo

Para ser o mais acurado possível, Fincher descartou do roteiro todos os casos de assassinatos atribuídos ao Zodíaco em que não houve sobreviventes ou testemunhas.

Por exemplo, o primeiro crime do serial killer ocorreu no lago Herman, ao lado de uma estrada em Vallejo, onde não teve sobreviventes.

É por isso que Fincher começa seu Zodíaco com o assassinato de Darlene em 4 de julho.

Zodíaco
Avery e Graysmith

A primeira escolha para viver o repórter Paul Avery era o ator Brad Pitt, que já tinha sido o protagonista em Seven, mas Robert Downey Jr, ficou com o papel. Downey Jr. está muito bem aqui, fazer alguém arruinado é com ele mesmo, haja visto sua carreira destruída de outrora.

No ano seguinte de Zodíaco, ele faria para o Marvel Studios o primeiro Homem de Ferro (2008), papel que lhe salvaria por completo e o deixaria até os dias de hoje no alto escalão de Hollywood.

Para o papel de Robert Graysmith, Fincher quis Jake Gyllenhaal, depois de ver sua atuação em Donnie Darko (2001).

O ator Philip Baker Hall, que interpreta o grafologista Sherwood Morrill, também atuou em O Zodíaco (2005), outro filme que adapta a história dos crimes do serial killer, um dos poucos filmes dirigidos por Alexander Bulkley, mais conhecido por ser produtor de séries como Frango Robô (2005-2012) e BoJack Horseman (2014-2020).

Além de passar o filme Perseguidor Implacável (1971) na cena de cinema com Toschi e Graysmith, o filme Zodíaco tem outras autorreferências da sétima arte, como quando Avery nota que na verdade é o ator Steve McQueen quem copia o estilo de guardar a arma de Toschi no filme Bullitt (1968), e não ao contrário, como acha Greymisth, em uma conversa de ambos na redação do jornal.

Fincher já afirmou em entrevistas que uma inspiração para filmar foi o longa Todos os Homens do Presidente (1976), de Alan J. Pakula.

O editor de som escolhido por David foi Ren Klyce, que trabalhou com o premiado Walter Murch em A Conversação (1974), filme de suspense policial de Francis Ford Coppola, nomeado ao Oscar de Melhor Filme, Som e Roteiro.

Zodíaco
Um dos posteres promocionais de Zodíaco

Ainda sobre Perseguidor Implacável, onde o personagem de Clint Eastwood caça o serial killer Scorpio, baseado no Zodíaco, Graysmith anotou em seu livro que a polícia chegou a considerar linhas de investigação em cima de uma tira em quadrinhos de Dick Tracy (1931, criada pelo cartunista Chester Gould para o jornal impresso Chicago Tribune), sobre um policial que enfrenta uma gangue baseada nos signos zodiacais, liderados por um chefão chamado Scorpio.

Aliás, é de Dick Tracy as origens de supervilões com designs grotescos e diferenciados, basa para a criação dos antagonistas dos super-heróis no gênero de histórias em quadrinhos popularizados pelas editoras Marvel Comics e DC Comics.

Além de aplausos da crítica especializada — a revista Les Cahiers du cinéma (França) o elencou com um dos melhores filmes de 2007 –, o diretor sul-coreano Bong Joon Ho (Expresso do Amanhã, de 2014, e Parasita, de 2019), também o classifica como “obra-prima“.

Zodíaco
Toschi e Graysmith na “resolução” do caso

Paul Avery e Robert Graysmith não tinham a “parceria” vista no longa na vida real, não eram amigos, e tampouco o repórter entrou numa espiral da destruição como o filme sugere.

Ainda nos anos 1970, ele cobriu o caso do sequestro de Patricia Hearst, que virou até livro: The Voices of Guns (1976).

Patricia é neta do magnata das comunicações William Randolph Hearst, personagem que serviu de base para o cineasta Orson Wells criar Cidadão Kane (1941), um dos maiores (senão o maior) filme do cinema.

Ela foi sequestrada por membros do Exército Simbionês de Libertação, sofreu lavagem cerebral (!) e passou a adotar o nome de Tania, e se juntou aos sequestradores num assalto a banco (!!).

Eventualmente, ela foi presa, e cumpriu parte da pena, até receber um indulto do presidente americano Jimmy Carter.

Zodíaco
Leigh no filme é entrevistado pelos três policiais do caso

Na vida real, Arthur Leigh Allen foi entrevistado pela polícia de Vallejo em 6 de outubro de 1969, pelo investigador John Lynch. Zodíaco começa e termina com cenas de Mike Mageau, e a música Hurdy Gurdy Man é a primeira e a última que toca no filme.

Escrita e performada pelo escocês Donovan, a filha dele está em uma cena importante do longa.

É ela a mulher com o neném na estrada quando são abordadas pelo assassino. A produção contou até mesmo com um sobrevivente dos ataques do serial killer.

O verdadeiro Bryan C. Hartnell aparece com a esposa numa cena na delegacia onde Bill e Toschi trabalham.

Um dos códigos do Zodíaco só foi quebrado recentemente. Conhecido como “Code z340“, ele foi resolvido em 5 de dezembro de 2020, depois de 51 anos. Isso mostra o quanto é atual o assunto do Zodíaco ainda.

/ OS DOIS SOBREVIVENTES. Hartnell se tornou advogado, e se recuperou relativamente bem dos ataques do Zodíaco. Já Mageau entrou numa decadência triste e nunca mais foi o mesmo. Quando se enrolou com a Justiça por conta de problemas legais, quis o destino que seu advogado fosse Hartnell. A VEJA entrevistou o advogado para uma matéria sensacional em 2017. Aqui

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