Travis O’Connell é o Homem Linear. Ele usa armas e equipamentos hi-tech, roupas e proteção militares, tem rabo de cavalo, é metade humano e metade ciborgue, com parte do rosto inclusive sendo de metal (e fuma). Ele é um soldado do futuro envolvido em viagens temporais com uma missão, e é cheio de atitude.
Você pode achar que se trata do Cable, da Marvel Comics, mas na verdade é um personagem da editora DC Comics que estreou em Adventures of Superman #476, lançado em 1991, mais de 2 anos depois que Cable, um soldado do futuro envolvido com viagens temporais com uma missão, cheio de armas e equipamentos hi-tech, roupas e proteção militares, metade humano (mutante) e metade ciborgue, com parte do rosto inclusive sendo de metal, tinha estreado nas HQs, em New Mutants #86-87 (1989), a revista irmã dos X-Men.
A arte de Rob Liefeld, um de seus co-criadores, não deixava dúvida do que ele representava: uma figura militar que emanava força bruta, um ciborgue com um braço e olho biônicos, com o corpo cheio de cicatrizes, carregando um monte de armas enormes — o puro suco dos anos 90.
A bomba atômica da arte de Liefeld (bomba mesmo) e outros artistas como Jim Lee (X-Men), Marc Silvestri (X-Men, Wolverine), Todd McFarlane (Homem-Aranha) na Marvel representou uma divisão no mercado tão grande que eles tiveram força suficiente para causar uma disrupção sem igual na indústria até hoje.
Depois de levarem as vendas das HQs da Marvel nas alturas — a X-Force de Liefeld com Cable era um campeão de vendas — eles saíram da editora e fundaram uma própria, a Image Comics, com seus quadrinhos próprios emulando o que faziam antes.
Se a DC Comics mal conseguia acompanhar o poder comercial e criativo da Marvel, agora ela tinha sido jogada para o terceiro lugar. Não foi sem surpresas que ambas começaram a emular o estilo das revistas da Image. E nem mesmo com o Superman, personagem-ícone da DC, seria diferente. É claro que algo do exagero artístico e mood visual do Image style apareceria por ali também.
E o Homem Linear, o Cable da DC, foi um dos mais emblemáticos — e breves.
Travis O’Connell, o Homem Linear
O artista Dan Jurgens era o escritor e desenhista dos gibis do Superman na época. E a aventura que vemos a estreia do Homem Linear em Adventures of Superman #476 foi também o início da saga Time and Time Again, traduzida no Brasil como Perdido no Tempo.
O roteiro e arte da edição são de Jurgens, com arte-final de Brett Breeding, uma das grandes duplas de arte nos anos 90 na DC, e que conseguiam um resultado muito poderoso de impacto visual.
Para falar do Homem Linear, devemos também falar do Gladiador Dourado (Booster Gold, no original). Sua primeira aparição foi em Booster Gold #1 (1986), um personagem original e novo, criado por Dan Jurgens, lançado no contexto do pós-Crise nas Infinitas Terras, megassaga da DC Comics que reorganizou editorial e comercialmente uma cronologia de 50 anos de centenas de revistas em quadrinhos dos milhares de personagens da editora.
No distante ano de 2462, Michael Carter era um esportista em Gotham City (uma vez a cidade do Batman). Apostador compulsivo, perdeu todo o dinheiro que tinha, e sem poder cuidar da irmã e da mãe, decidiu tentar a sorte em Metropolis (uma vez a cidade do Superman).
Ao adentrar um museu espacial, tem contato com numa máquina esférica, que era capaz de realizar viagens no tempo. Ele rouba uma vestimenta especial que lhe confere alguns poderes (força e disparos de energia), além de um Anel de Voo da Legião dos Super-Heróis (equipe de jovens combatentes do crime na Terra e no resto do Universo DC), e decide viajar até o Século XX em busca de fama e dinheiro. Uma vez aqui, ele acaba se tornando um super-herói em Metropolis.
É só em Booster Gold #13 (1987) que parte dessa origem é mostrada em um flashback. Na mesma edição, Gladiador conhece Rip Hunter, um cientista extremamente inteligente, tão capaz que construiu uma máquina do tempo — a Esfera do Tempo, o mesmo equipamento que Carter usou no futuro. Hunter e outros amigos cientistas ajudam o Gladiador a retornar para o ano de 2462, onde descobre que as coisas mudaram muito desde que saiu em sua viagem.
Durante as 25 edições da revista do Gladiador Dourado, Jurgens constrói um herói meio pateta mas de bom coração, que notavelmente conseguiu ser inserido nos maiores espaços da comunidade de super-heróis da DC, chegando a ser integrante da Liga da Justiça e peça importante em diversas sagas.
É neste contexto do Gladiador em destaque que somos apresentados ao Homem Linear. Quando ele surge nas primeiras páginas de Adventures of Superman #476, na Metropolis de 1991, não nos é informado de onde e quando vem. Mas sabemos de cara sua missão: capturar o Gladiador Dourado.
O Homem Linear sabia que o Michael Carter tinha feito para obter seus equipamentos e que essa viagem temporal foi realizada de modo escuso. Para rastrear o cara, esse policial do futuro ativa um sensor em Skeets, um robôzinho voador que é o “parceiro mirim” do herói (com efeito, ele estava no museu quando Carter fez a viagem, e veio com ele também).
No confronto violento que se segue entre o Homem Linear e Gladiador pelas ruas da cidade, o Superman acaba aparecendo. Na luta, o herói acaba danificando um dispositivo importante do maquinário de deslocamento temporal do Homem Linear, e ambos são tragados por um vórtex.
Nessa viagem, o herói fica carregado demais de energias cronais e acaba “explodindo” de tempos em tempos, causando mais e mais deslocamentos temporais. Superman acaba caindo no Século XXX, onde encontra 3 integrantes fundadores da Legião dos Super-Heróis — Satúrnia, Rapaz Relâmpago e Rapaz Cósmico –, ainda no início de suas atividades, período que o Superman desconhece bem como esses integrantes em especial.
A aventura da saga Perdido no Tempo continua em Action Comics #663 e Superman #64, com o Azulão caindo nos anos 1940, quase encontrando a Sociedade da Justiça e lutando contra nazistas. Na 4ª parte da saga, em Adventures of Superman #477, o Superman acaba de novo no Século XXX, por interferência direta do Homem Linear, que está monitorando esses “soluços” temporais do Homem de Aço.
Mas dessa vez, o Azulão encontra uma equipe da Legião que ele já conhecia (mais ou menos). Nessa época, o Sistema Solar estava ameaçado pela entidade Devorador de Sóis, de nome autoexplicativo. Tamanha é sua força e influência, que ele causa mais oscilações ainda no tempo e espaço, dificultando as tentativas do Homem Linear para tentar jogar o Superman de volta ao seu tempo de origem.
A trama segue para Action Comics #664, com o Super dessa vez no período pré-histórico da Terra, e logo depois para Superman #65, em Camelot, onde encontra Etrigan, O Demônio, o mago Merlin e os Cavaleiros da Távola Redonda. Finalmente, em Adventures of Superman #478, o Homem Linear consegue puxar o Superman para um evento tão cataclísmico que pode romper as barreiras do tempo e espaço e devolver ele ao seu lugar correto na timeline. Esse evento é a destruição da Lua em 2995.
A raça alienígena Dominions estava planejando explodir o satélite por meio de diversos bunkers espalhados, na tentativa de chantagear o Governo da Terra. Mas tudo sai de controle quando Dev-Em, um daxamita psicopata, toma conta dos controles desse sistema de bombas. Os habitantes do planeta Daxam, sob a luz amarela do Sol (tal qual o kryptoniano Superman), ganham super-habilidades.
E nem mesmo a Legião dos Super-Heróis pode com esse Superman do mal. Mas a presença do verdadeiro Superman nos eventos muda tudo.
Com a ajuda do herói, a Legião consegue derrotar Dev-Em antes dele destruir a Lua. O Homem Linear, ciente que a destruição da Lua era necessária para o encadeamento correto dos eventos na timeline da DC, precisa corrigir seu erro.
E a despeito do estresse físico que viagens temporais seguidas causam em seu corpo (fica implícito que ele ser ciborgue é causa dos efeitos constantes das viagens), ele chega ao local dos eventos para contornar isso.
Ele explica para o Superman que vem de centenas anos do futuro do século XXX, e que sua sociedade ainda não domina com maestria o fluxo do tempo, mas que garantem o bom funcionamento dela. E não é sem luta e protesto do Superman que o Homem Linear consegue corrigir tudo, se sacrificando no processo: ele ativa o mecanismo e explode a Lua.
O Superman volta para Metropolis de 1991. E foi o fim do Homem Linear.
Quadrinhos anos 90
Um dos eventos mais notáveis em 1991 no mercado de quadrinhos de super-heróis quando Travis O’Connell, o Homem Linear, estreou, foi a publicação de X-Men #1, da Marvel Comics, um novo título dos mutantes escrito por (pouco) Chris Claremont e (muito) Jim Lee (com arte dele também). Ela bateu recordes de vendas e se tornou a HQ mais vendida da época, com números (controversos) na casa dos 8 milhões.
X-Force #1, lançado no começo do ano de 1991 também, era a continuação da revista New Mutants, agora liderados por Cable, um título que foi cancelado no número #100 para dar lugar a essa nova série, que era escrita e desenhada por Rob Liefeld, com ajuda nos roteiros de Fabian Nicieza. Vendeu só um pouco menos que a X-Men de Jim Lee.
A DC precisava se adaptar para manter sua relevância na indústria de quadrinhos de super-heróis. Um dos ajustes foi surfar nessa onda de hiperestilização estética e impacto de design, e emular a arte dos desenhistas sensação do momento.
É por isso que o mood visual do Homem Linear é do Cable.
No entanto, a Marvel estava prestes a perder eles e outros de seus principais talentos criativos para a Image Comics. Fundada em 1992 por Todd McFarlane, Jim Lee, Rob Liefeld, Marc Silvestri, Whilce Porthacio, Erik Larsen e Jim Valentino, ela já estava em planejamento em 1991.
Os artistas articularam uma resposta à insatisfação com a falta de controle criativo e os benefícios financeiros limitados oferecidos pela Marvel — e pela DC. Cada um dos fundadores lançou seu próprio título, e suas abordagens criativas e estilos artísticos únicos atraíram uma base de fãs significativa dos títulos famosos que faziam para a Marvel, como X-Men e Homem-Aranha.
Os títulos da Image, como Spawn, de Todd McFarlane, WildC.A.T.S., de Lee, Youngblood, de Liefeld, Savage Dragon, de Larsen, CyberForce, de Silvestri, entre muitos outros, ofereciam uma alternativa fresca e independente aos quadrinhos de super-heróis tradicionais.
A estreia da Image Comics trouxe uma concorrência feroz para a DC Comics. Com a essa nova editora atraindo artistas e criativos de renome, ela precisava criar algo de impacto para chamar atenção. É por isso que nos anos seguintes a DC Comics promoveu eventos como A Morte do Superman (1992) e A Queda do Morcego (1993).
Os Homens Lineares
Dan Jurgens expandiria de modo enorme o conceito que apresentou junto com o Travis O’Connell , o Homem Linear. Com efeito, ele cria os Homens Lineares, um grupo de viajantes do tempo que monitoram a linha do tempo e tentam evitar interferências no fluxo temporal. Eles têm a tarefa de proteger a continuidade e a coerência temporal no Universo DC.
Na verdade, Jurgens de certo modo já tinha feito isso antes. O artista foi sagaz ao recuperar o Rip Hunter em Booster Gold #13. Ele é a versão pós-Crise nas Infinitas Terras do Rip Hunter criado originalmente pelo escritor Jack Miller e o desenhista Ruben Moreira em Showcase #20 (1959), ainda na Era de Ouro dos Quadrinhos. Esse herói era um viajante do tempo, que junto de outros cientistas — Jeff Smith, Bonnie Baxter e Corky Baxter — eram parte do Time Masters, uma equipe que viajava pelo tempo e investigava eventos históricos.
O personagem teve 29 edições de uma revista própria, Rip Hunter…Time Master (1961-1965), escritas por Jack Miller, com arte de Ross Andru e Mike Esposito. Nos anos 1980, Hunter também foi integrante dos Heróis Esquecidos, um dos muitos grupos de super-heróis da DC que existiam no Pré-Crise.
Era um grupo com personagens irregulares e desconhecidos da DC, formado por Rick Flag, o líder do antigo Esquadrão Suicida (antes de ser recriado nas mãos de Amanda Waller); Dane Dorrance, o líder dos Demônios do Mar, aventureiros aquáticos da DC; Cave Carson, um famoso geólogo; o Homem-Animal, que podia absorver habilidades de animais; Dolphin, uma mulher que podia respirar debaixo d´água; e Congo Bill, um caçador que podia se transformar em um gorila.
Depois de Hunter aparecer na revista do Gladiador Dourado no pós-Crise, ele ganhou mais um título próprio, Time Masters (1990), que durou 8 edições. A revista foi escrita por Bob Wayne e Lewis Shiner, com arte de Art Thibert (guarde esse nome). Até o escritor Grant Morrisson usou Rip Hunter em seu run de sucesso no Homem-Animal, em Animal Man #22 (1990).
Jurgens então busca Rip Hunter e cria outros personagens para formar os Homens Lineares. Para explicar melhor os conceitos dos Homens Lineares, precisamos expandir os acontecimentos que ocorreram no ano de 1991 no Universo DC e na própria editora, em sua megassaga no momento: Armageddon 2001.
Tempus (Waverider, no original) é a identidade secreta do cientista Matthew Ryder. No ano de 2030, a Terra do Universo DC é dominada pelo super-vilão Monarca, um ex-super-herói que destruiu todos os outros heróis do planeta.
Matt é o líder de uma pequena resistência, que tem poucas chances de sucesso. Assim, ele desenvolve uma máquina do tempo, e decide retornar para o ano de 1991 para descobrir quem era o Monarca e matá-lo, a fim de impedir o futuro distópico que conhece.
Quando estava no fluxo temporal, algo aconteceu com Ryder. Ele sofreu uma alteração física e ganhou poderes temporais, se tornando assim Tempus, com diversos poderes relacionados a energias cronais, como navegar pelas ondas do tempo. Tem também o dom de visualizar o futuro de alguém pelo toque.
Assim, ele chega ao Universo DC no ano de 1991 e busca todos os heróis da Terra para saber quem pode ser o Monarca. Esse é o plot de Armageddon 2001, com o Tempus surgindo na saga. O escritor é Archie Goodwin e o artista é Dan Jurgens. Foi a saga que a editora DC trabalhou em todos seus títulos na época.
O fato de tocar e ver o futuro é a intenção de Tempus ao chegar ao presente do Universo DC. Ele vai atrás de quase todos os super-heróis da Terra (e até fora dela) para descobrir quem deles é o Monarca, já que é a única informação que ele possui do passado do vilão.
Depois de encontrar diversos heróis, Tempus toca o Capitão Átomo. A reação atômica/temporal é tão forte que causa um rasgo no espaço-tempo, e o Monarca de 2030 acaba sendo arrastado para 1991. E ele é Hank Hall, o Rapina, antigo integrante dos Titãs. Sendo que o herói já tinha sido tocado/testado antes e nada tinha sido revelado.
Pois bem. O desfecho de Armageddon 2001 vazou, e os editores da DC mudaram a identidade do vilão — era para ser o Capitão Átomo mesmo.
De qualquer maneira, no final que ficou, com o Monarca/Hank Hall/2030 no presente, ele inadvertidamente acaba por confrontar o Rapina/Hank Hall, que estava junto com sua colega Columba/Dawn Granger.
O Monarca mata a heroína, e Rapina o mata na sequência, não sem antes de ver a face dele, e descobrir que era ele mesmo, causando um paradoxo temporal dele mesmo “criar” sua persona vilanesca. O fim da saga de Armageddon 2001 termina com o Monarca sendo derrotado pelo Capitão Átomo em uma grande explosão, que na verdade joga os dois milhares de anos atrás, no passado pré-histórico da Terra.
Tempus reaparece em Superman #59, dessa vez escrito também por Jurgens, em meio a uma vigilância nas sombras, junto com outras figuras, que em breve se revelariam como os Homens Lineares.
Em Superman #61 (ainda em 1991), Dan Jurgens mostra primeiro encontro do Superman com os Homens Lineares, com ajuda do Tempus. Eles são Matthew Ryder, um cientista do futuro que investiga a linha do tempo, que descobriu o Ponto de Fuga, um lugar fora do tempo e espaço que existe 1milissegundo antes do Universo deixar de existir, fundador dos Homens Lineares; Liri Lee, uma arquivista da linha temporal, que se junta a Ryder em suas viagens; e ninguém menos que Rip Hunter, em uma versão de design por Jurgens bem mais Cable do que o próprio Homem Linear: atitude badass, olho e braço biônico, além de cabelos brancos (e aparentemente mais velho).
Atenção: a vinda de Tempus para impedir o Monarca de dominar o mundo é o que torna possível existir esse Matthew Ryder que não é o Tempus, e sim um homem comum, líder dos Homens Lineares.
É aqui que o Superman entende então que o Homem Linear era parte de uma equipe maior, e mesmo que estivesse em uma missão “renegada” — foi atrás do Gladiador Dourado, um herói que tinha que ficar no Século XX, por entender que ele não podia ficar no presente do Universo DC — não era um vilão de fato.
Em Superman #73 (já em 1992), temos Tempus desorientado por algumas oscilações temporais, em uma aventura que releva a origem de Matthew Ryder. Tempus se junta aos Homens Lineares finalmente, sob protestos de Rip Hunter.
Importante citar que a edição seguinte já estamos na saga A Morte do Superman, com a segunda parte do massacre que o monstro invencível Apocalypse promove pra cima dos integrantes da Liga da Justiça. Gladiador Dourado é um dos que mais espancados e feridos inclusive.
Várias edições especiais foram publicadas após a morte do Superman foram publicadas pela DC. Entre elas tivemos Superman: The Legacy of Superman (1993), escrita por vários autores — Bill Messner-Loebs, Jerry Ordway, Karl Kesel, Roger Stern e Dan Jurgens, com desenhos de vários artistas.
Dan escreve e desenha uma aventura que mostra eventos anteriores a morte do Azulão, com Tempus e os Homens Lineares tomando conhecimento da tragédia bem antes dela ocorrer. Tempus até quer impedir, mas Matthew Ryder o convence do contrário, dizendo que a linha do tempo deve ser respeitada, independente do que aconteça com o maior super-herói da Terra.
Jurgens faz de Tempus um personagem essencial minissaga Superman/Doomsday: Hunter/Prey (1994), com a revanche do Superman em cima de Apocalypse, que acaba caindo em Apokolips, onde quase mata Darkseid, o maior vilão do Universo DC.
O artista escreve e desenha a história, que termina com a aparente destruição do monstro graças a Tempus, que o joga na entropia no fim do tempo e espaço no último segundo de vida do Universo DC.
Em 1994 tivemos também a megassaga Zero Hora (1994), o soft reboot que a DC promoveu depois de Crise nas Infinitas Terras. Por mais que Dan Jurgens estivesse no auge de sua arte, o roteiro, também escrito por ele, sofreu devido as inúmeras lambanças editoriais e amarras criativas que os milhares de personagens do Universo DC tiveram desde os 8 anos de Crise, que por sua vez já tinha sido um projeto para resolver tudo isso.
Algumas coisas foram corrigidas mas outras pioradas, e muito do que veio depois na verdade zuou ainda mais a cronologia da editora, como podemos perceber pelo lore do Gavião Negro.
Fora que o super-herói Lanterna Verde/Hal Jordan, mesmo sem “defeitos cronológicos”, foi usado para ser o megavilão por de trás de todos os eventos de Zero Hora, em decorrência direta de um colapso nervoso depois que Coast City foi dizimada na saga A Morte do Superman.
Tempus e os Homens Lineares aparecem em várias edições da saga, já que ela lida diretamente com alterações temporais, sendo que o próprio Tempus chega a ser morto pelo vilão Extemporâneo (ninguém menos que Hank Hall, em uma nova identidade vilanesca).
A saga promove a estreia de um novo Tempus: o próprio Matthew Ryder, líder dos Homens Lineares, graças ao Novo Deus Metron, de Apokolips.
Grant Morrison usa os Homens Lineares na segunda edição da saga DC Um Milhão (1998), com arte de Val Semeiks, já que ela lida diretamente com viagens no tempo.
Rip Hunter e Magog
No mesmo ano, Dan Jurgens retomou o Homem Linear apenas mais uma vez, ao mostrar ele e Liri Lee recrutando Rip Hunter para os Homens Lineares, em uma aventura mostrada em Legends of the DC Universe 80-Page Giant (1998-2000), com desenhos de Todd Nauck. É aqui que vemos Hunter ganhando seu visual Cable, para dar conta dos efeitos nocivos das constantes viagens do tempo.
Todavia, essa não seria a última vez que Jurgens recontaria a história de Rip Hunter. As explicações para essas alterações, claro, são oscilações temporais, um mood criativo que o artista conseguiu manobrar muito bem no run que fazia com os Homens Lineares e as aventuras que eles participavam.
Na verdade, Rip Hunter se torna a peça mais importante dos Homens Lineares em aventuras futuras, deixando de lado a Liri Lee e até mesmo Matthew Ryder e Tempus. Em aventuras posteriores, o próprio Jurgens iria modificar o personagem para sua antiga aparência vista em Booster Gold #13.
The Kingdom foi uma minissérie em 2 partes escrita por Mark Waid com desenhos de Ariel Olivetti e Mike Zeck, e é a continuação da prestigiada O Reino do Amanhã (1996), que tem o nome original de Kingdom Come, uma das obras-primas da DC Comics, escrita por Waid e desenhada (pintada) por Alex Ross.
A trama mostrava (outro) futuro do Universo DC, onde os heróis atuais — a maioria herdeiros, filhos e netos dos super-heróis originais — pouco se preocupam com ideais como cuidado como moral e bons costumes. Eles são violentos, matam pessoas e vilões e não estão nem aí para a sociedade.
Uma tragédia de proporções nucleares ocorre por causa de um deles, Magog, quando uma explosão nuclear causada pela morte do Capitão Átomo aniquila o estado do Kansas.
E um velho Superman aposentado tem que reunir seus antigos amigos para tentar salvar o mundo da destruição total.
Mark Waid nunca escondeu de ninguém que fez de Magog um espelho de Cable — inclusive no design criado por Ross, com cabelos brancos, olho e braços biônicos e milhões de bolsos — para criticar o carnaval de sangue & porrada & armas dos quadrinhos de super-heróis nos anos 90, com personagens raivosos e violentos em roteiros pobres, em uma metacrítica que é uma das melhores do mercado.
Com efeito, Magog é muito mais o Cable da DC do que o Homem Linear ou o Rip Hunter.
A saga nunca teve uma continuação oficial, mas esses 2 números de The Kingdom se aproxima bastante. Temos aqui o velho Superman e seus amigos enfrentando Gog, uma espécie de discípulo de Magog. Ele era um menino quando o Kansas explodiu na tragédia vista no Reino do Amanhã.
Passados 20 anos, e dotado de poderes, incluindo viagem no tempo, ele começa a tentar impedir o desastre, e começa a matar o Superman nessas tentativas. Ele fica louco e começa a retroceder dia a dia, empilhando uma montanha de cadáveres do herói. O enorme fluxo de espíritos no além começa a causar fissuras no espaço-tempo, e os Homens Lineares acabam envolvidos.
Foi aqui também que vemos a estreia do conceito de Hipertempo na continuidade regular, a mais nova tentativa da época da DC de trazer alguma coisa do pré-Crise de volta, que havia eliminado de certa maneira o Multiverso DC.
Também é bem legal poder ver Rip Hunter, em seu mood Cable, encontrar Gog, o herdeiro do verdadeiro Cable da DC.
Rip Hunter (de novo com sua antiga aparência comum) foi a face dos Homens Lineares nos anos 2000. O roteirista Geoff Johns usa o personagem em um arco de seu run em JSA, a revista da Sociedade da Justiça (praticamente aniquilada desde a saga Zero Hora) em JSA#67-69, 72 (2004), envolvendo o vilão Per Degaton, um cientista nazista que domina as viagens no tempo.
Johns usa Rip de novo na grande saga 52 (2006-2007), a série de revistas publicadas por 52 semanas, que cobriram os pós-eventos de Crise Infinita (outra tentativa de rebootar o Universo DC pela editora, sem sucesso).
Embora ele não tenha aparecido em todas as edições, sua busca para restaurar o continuum temporal foi um elemento-chave da história. Além de Johns, os escritores Grant Morrison, Greg Rucka e Mark Waid trabalharam nela.
Entre vários acontecimentos importantes com diversos personagens da DC, Tempus é morto no final da saga 52 por Skeets (!) a mando do Sr. Cérebro, um vilão do lore do Capitão Marvel/Shazam.
Ainda em 2007, a DC criou um novo título para o Gladiador Dourado, com roteiros de Geoff Johns e arte de Dan Jurgens, na esteira de Crise Infinita. E juntos eles criaram uma relação ainda mais próxima de Rip Hunter com Michael Carter, tornando o personagem filho do Gladiador.
Time Masters: Vanishing Point foi uma minissérie em 6 edições publicada em 2010, como consequência de uma morte em especial ocorrida na saga Crise Final (sim, outro reboot, sim outra tentativa falha). Batman foi morto por Darkseid. Ou assim pensávamos, já que ele estava na verdade perdido no tempo. Então Superman, Lanterna Verde/Hal Jordan, Gladiador Dourado e Rip Hunter vão ao seu resgate. O roteiro e arte são de Dan Jurgens.
Em 2011, a DC promoveu uma saga chamada Ponto de Ignição, chamada de Flashpoint no original, escrita por Geoff Johns. Ela foi a preparação dos Novos 52, mais um reboot da DC, dessa vez bem mais intenso (e menos criativo) em sua cronologia, já que apagava 80 anos de histórias, os Homens Lineares foram pouco ou nada usados, e isso se aplicou a todos: Tempus, Matthew Ryder e Liri Lee.
Apenas o Gladiador Dourado teve mais destaque nessa fase. De novo por Jurgens.
Pra variar, esse reboot foi o pior já feito pela DC, e já em 2015 os donos da editora já começaram a promover um novo reboot. Primeiro aconteceu a saga Convergência (2015) que reúne heróis e vilões de praticamente todas as Terras, dimensões e universos do Multiverso DC em um confronto contra Talos, uma das entidades cósmicas mais desinteressantes que a editora já criou.
Outra das revistas dessa saga foi Convergence: Booster Gold, que se passa na época pré-Ponto de Ignição. O roteiro de Dan Jurgens (claro) coloca o Gladiador Dourado e o Rip Hunter contra vários personagens deslocados temporalmente. Na aventura o Gladiador chega a se tornar um novo Tempus (!).
Depois de Convergência a DC promoveu a saga Renascimento (2016), que tentou misturar os conceitos pós-Crise e elementos dos Novos 52, em uma confusão que hoje é incompreensível.
Mais recentemente, Rip Hunter e seus companheiros de Time Masters reaparecerem recentemente na minissérie Flashpoint Beyond (2022), escrita por Geoff Johns, saga que retoma a saga do Batman/Thomas Wayne, o Homem-Morcego da realidade de Ponto de Ignição.
O Batman/Bruce Wayne da continuidade regular tenta impedir que Hunter e os outros destruam essa realidade — e por consequência seu pai. Parte da trama tem participação do Dr. Manhattan, que já fazia parte do Universo DC regular desde o Renascimento, com sua inserção (e outros de Watchmen) na saga Doomsday Clock (adivinha? Sim. Outra tentativa de reboot que não deu certo. Roteiro do Johns também ).
A HQ de Flashpoint Beyond estabelece uma nova timeline para a cronologia e termina com Hunter e seus companheiros vendo alguns eventos futuros que impactarão o Universo DC.
Cable
Marvel Comics
Cable tem uma das histórias mais complexas do lore mutante, que já é o mais complexo do Universo Marvel. Ele foi criado pela escritora Louise Simonson e o desenhista Rob Liefeld em New Mutants #86 (1989), mas essencialmente em cima das ideias originais dele. O personagem aparece nas últimas páginas da revista, que inclusive foi a estreia do desenhista no título em que faria história.
A edição seguinte com certeza é a mais famosa, já que Cable aparece na capa, e é tida como a verdadeira primeira aparição dele.
O nome verdadeiro de Cable é Nathan Christopher Summers, e ele surgiu em Uncanny X-Men #201 (1985), criado por Chris Claremont e Rick Leonardi, como o bebê recém-nascido de Scott Summers, o Ciclope dos X-Men, e Madelyne Pryor, uma mulher que depois descobriríamos ser clone de Jean Grey, antiga integrante dos X-Men, morta anos antes (e o amor da vida de Scott).
Nathan teve importância em várias etapas do run de Claremont pelos X-Men, sendo o pivô dos acontecimento da saga Inferno (1989).
Em X-Factor #68 (1991), em um roteiro dos artistas Jim Lee e Whilce Portacio, mas com script de Claremont, vemos a difícil decisão de Ciclope de mandar Nathan para um futuro distante para ser curado de um vírus, infectado nele pelo megavilão Apocalipse.
A edição é cheia de inserções visuais que fariam sentido em breve. Vemos o Vigia, uma das entidades cósmicas do Universo Marvel, falando sobre os eventos e o que o futuro reservava para os mutantes. Podemos ver alguns rostos conhecidos em cristas em uma cena, como o próprio bebê Nathan, Professor Charles Xavier, Colossus e…Cable.
Xavier e Colossus aparecem no contexto da Uncanny X-Men #279, parte da Saga da Ilha Muir, uma revista que acabou sendo a despedida de Claremont dos X-Men após 16 anos, já que na época Jim Lee tinha mais poder sobre as histórias que ele.
Chris estava querendo dar uma direção bastante específica aos heróis mutantes, mas Lee queria apenas desenhar suas velhas paixões de infância, como Magneto, Terra Selvagem, Piratas Siderais e outras coisas que achava legal.
Isso ia de encontro ao que o editor do título, Bob Harras, também achava, e as vendas estratosféricas não deixavam dúvidas também.
De qualquer maneira, foi Claremont quem teve a ideia de mandar o bebê Nathan para o futuro, pois assim Ciclope ficaria “desimpedido” para ser o líder total de campo dos X-Men em breve.
Outra citação importante dessa edição é de Apocalipse sobre Os Doze, conceito apresentado em X-Factor #13-14 (1987), escrito por Louise Simonson, com arte de Walter Simonson e Dan Green. Esses 12 seriam mutantes predestinados para liderar ou dominar o mundo. Vemos algumas imagens do Professor X, Tempestade e do Cable de novo (e aparentemente do Míssil e do Legião?)
A aventura de X-Factor #68 termina com a guerreira Askani levando o bebê Nathan a um futuro distópico dominado por Apocalipse, a realidade da Terra-4935. É neste futuro então que Nathan cresce e se torna o soldado Cable na guerra contra Apocalipse.
Em certo momento, os rebeldes decidem atacar retroativamente o vilão, e Cable decide vir ao Século XX para matar Apocalipse (entre outras missões). Perceba: é o mesmo plot de Armageddon 2001.
Apesar de sua primeira aparição ocorrer em New Mutants #86-87, Cable já estava na continuidade regular do Universo Marvel algum tempo antes, já que Louise e Rob fazem questão de mostrar nas edições seguintes do título que Cable conhecia de longa data personagens como Moira McTaggert, Wolverine, Dentes de Sabre e outros.
Os desenhos de X-Factor #68 são de Whilce Portacio com arte-final do já citado Art Thibert, um artista que trabalhou de perto com Dan Jurgens nas revistas do Superman, e na já citada Time Masters, do Rip Hunter. Com efeito, Thibert arte-finalizou os desenhos de Jurgens em Adventures of Superman #475, uma edição antes de aparecer o Homem Linear, e a capa da edição seguinte, a estreia do personagem.
A complicada origem e motivações de Cable foram costuradas por diferentes roteiristas e artistas: Fabian Nicieza (que junto com Art Thibert produziu uma série solo do Cable, em 1993), Jeph Loeb, Glenn Herdling, Scott Lobdell (que substituiu Claremont nos X-Men) e outros.
Pouco dos planos originais de Liefeld foram mantidos — ele só estabeleceu que ele era um soldado do futuro — mas ele aceitou a sugestão de Claremont que Cable fosse o bebê Nathan mandando embora em X-Factor #68.
Rob nem mesmo tinha pensado em um poder mutante para Cable, mas depois disso, veio com a telepatia e telecinese, como visto em X-Force #1 (1991), fazendo um link muito mais claro para os leitores, já que esses eram os poderes do bebê Nathan.
Nos planos originais de Liefeld, Cable seria um soldado do futuro sim, mas não tão distante. Ele queria impedir o vilão Conflyto e sua Frente de Libertação Mutante de dominar o mundo, mas mal sabia ele que Conflyto era ele mesmo em um futuro um pouco mais distante. Mas acabou que Cable era Nathan e Conflyto um clone dele.
Acontece que quando chegou no futuro distópico da Terra-4935, os rebeldes do grupo de Askani decidiram clonar o bebê Nathan infectado, pro caso da criança morrer. Asseclas de Apocalipse atacaram o local e capturaram o bebê-clone pensando ser Nathan, enquanto o verdadeiro foi salvo pelos rebeldes. O clone recebeu o nome de Conflyto e se tornou outro assecla de Apocalipse.
Como podemos perceber, todos os conceitos apresentados por Dan Jurgens (e outros) de Matthew Ryder/Tempus, Rip Hunter, o Homem Linear e os Homens Lineares na DC Comics, e Rob Liefeld (e outros) para Cable e sua história na Marvel Comics, são bastante similares.
O lance de viajante do tempo de Cable foi estabelecido só meses depois da primeira aparição do Homem Linear, que claramente teve seu visual copiado de Cable. Rip Hunter, outro personagem relacionado a viagens temporais, é remodelado para ser mais parecido com Cable ainda.
E o lance de Matthew ser o líder de uma pequena resistência contra um megavilão em um futuro distópico, que volta no tempo para impedir isso, mostrado em Armageddon 2001, precede o que muitos roteiristas iriam aplicar a Cable e Apocalipse nas x-histórias da Marvel muitos meses depois. E a despeito do espaço de tempo ser pouco para alguma sugestão de cópia ser levantada, tudo acaba sendo apontamentos bem legais sobre o lore.
Vale citar que Rip Hunter na verdade ser o filho de Michael Carter, o Gladiador Dourado, é igual ao que se estabeleceu com Cable e Ciclope, com o filho sendo mais velho que o próprio pai.
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