TUBTHUMPING | Chumbawamba, anarcopunk e o game da Copa do Mundo 98

O Chumbawamba foi uma banda inglesa de muitos estilos musicais formada em 1982, e com a música Tubthumping eles turbinaram um foguete de explosão anárquica dentro do mercado fonográfico, em uma coordenação sem igual para subverter o sistema capitalista que opera no mainstream da indústria de entretenimento. “I get knocked down / But I get up again / You’re never going to keep me down!“.

Chumbawamba Tubthumping
Os integrantes do Chumbawamba na época do lançamento de Tubthumping, em detalhe da arte interna do álbum Tubthumper

A banda começou com um som hardcore punk em seus álbuns iniciais dos anos 1980, e logo adotaram uma postura e sonoridade anarcopunk no fim da década oitentista, passando no começo dos anos 90 pelo dance music, world music e folk music, e influenciados pelo pop, anarquia e sabotagem cultural de guerrilha, construíram uma música-hit como Tubthumping, do álbum Tubthumper (1997), com enorme capacidade torrencial de viralização.

Chumbawamba Tubthumping
A capa do disco Tubthumper
Chumbawamba Tubthumping
Arte da contracapa, com as músicas do álbum

Com Tubthumping, o Chumbawamba foi capaz de estourar em popularidade nas baladas e festas dos Estados Unidos e Europa, em uma passagem sonora que durou no mínimo 3 anos sem parar — até os anos 2000 ela podia ser escutada em rádios por aí, inclusive no Brasil.

Além disso tudo, Tubthumping estava em todas as televisões que tinham o PlayStation e o Nintendo 64, dois videogames ícones da geração noventista e da cultura pop em si — foram os primeiros consoles a fazerem jogos 3D — pois essa música do Chumbawamba era a faixa de abertura oficial do jogo World Cup 98, da softhouse EA, lançado mais de um ano depois do disco. Bem, ao menos no console da Sony, pois o N64 da Nintendo ainda era em cartucho e permitiu apenas alguns segundos do refrão marcante da música.

Chumbawamba Tubthumping
Capa do game para Nintendo 64, que não tinha a música completa de Tubthumping do Chumbawamba

O Chumbawamba era um grupo repleto de mensagens políticas e sociais. Eram contra o fascismo e apoiavam abertamente causas progressistas e feministas.

Esse arranjo de posições, somado à força criativa mostrada em diversos estilos musicais em mais de 15 discos, é prova viva da força anárquica desse grupo de Lancashire, Inglaterra (que tinha de 8 a 10 integrantes!!!).

A banda turbinou o poder do movimento anarquista ao entrar nas engrenagens capitalistas e subverter o produto cultural em diversas mídias. Sua roupagem moderna e dançante tinha muito apelo comercial, indo de encontro ao cânone capitalista de uso massivo, o que foi exatamente o que aconteceu.

Tubthumping
(Tubthumper, 1997, Chumbawamba)

We’ll be singing
When we’re winning
We’ll be singing

I get knocked down
But I get up again
You’re never going to keep me down
I get knocked down
But I get up again
You’re never going to keep me down

I get knocked down
But I get up again
You’re never going to keep me down
I get knocked down
But I get up again
You’re never going to keep me down

Pissing the night away
Pissing the night away

He drinks a whisky drink
He drinks a vodka drink
He drinks a lager drink
He drinks a cider drink
He sings the songs that remind him
Of the good times
He sings the songs that remind him
Of the better times

Oh, Danny Boy
Danny Boy
Danny Boy

I get knocked down
But I get up again
You’re never going to keep me down
I get knocked down
But I get up again
You’re never going to keep me down

I get knocked down
But I get up again
You’re never going to keep me down
I get knocked down
But I get up again
You’re never going to keep me down

Pissing the night away
Pissing the night away

He drinks a whisky drink
He drinks a vodka drink
He drinks a lager drink
He drinks a cider drink
He sings the songs that remind him
Of the good times
He sings the songs that remind him
Of the better times

Don’t cry for me
Next door neighbour

I get knocked down
But I get up again
You’re never going to keep me down

We’ll be singing
When we’re winning
We’ll be singing

Com um refrão altamente chiclete, a música fala sobre a resiliência do homem comum, em letras alcoólicas ao mesmo tempo que motivacionais (!). Ela foi parar nas rádios de todo planeta e o videoclipe passava direto na MTV.

O fato de Tubthumping estourar em 1998 foi outro feito por si só. É só verificar o cenário musical a época.

Chumbawamba Tubthumping

Hanson com MMMBop; The Verve com Bitter Sweet Symphony; Oasis com Stand By MeGreen Day com Good Riddance (Time Of Your Life)”; The Offspring com All I Want; Backstreet Boys com Everybody (Backstreet’s Back); Savage Garden com Truly Madly Deeply; Aqua com Barbie Girl; Smash Mouth com Walkin’ On The Sun; Foo Fighters com Everlong; Radiohead com Karma Police; Spice Girls com Spice Up Your Life e dezenas de outros.

Estratégia de Cavalo de Tróia

Chumbawamba Tubthumping
Chumbawamba

O Chumbawamba é provavelmente o mais bem sucedido empreendimento cultural anarquista dos últimos anos. A revista musical Rolling Stone definiu a banda em uma entrevista como “os únicos anarquistas do mundo que vendem milhões de discos”.

Uma das ações mais anárquicas do Chumbawamba ocorreu em 2002, quando aceitaram um pagamento de U$ 100 mil dólares da General Motors pelo uso da música Pass it Long (do álbum WYSIWYG, de 2000) para uma propaganda de TV do carro Pontiac.

O dinheiro foi dado para grupos ativisitas anticorporativos como Indymedia e Corpwatch, que inclusive ajudaram entidades similares no Brasil, como o CIM (Centro de Mídia Independente), que cavocavam eventuais notícias e informações de irregularidades de corporações, como a própria GM.

O Chumbawamba foi ativo de 1982 a 2012. Fizeram de shows em ocupações urbanas, barzinhos e baladas, a mecas celebradas como Madison Square Garden (ícone de NY, EUA) e buracos do circuito independente europeu.

A banda foi fundada como um híbrido de coletivo anarquista engajado e banda por três jovens ligados à cena punk e de forte inclinação anarquista.

Chumbawamba

Por volta de 1984, o Chumbawamba aumentaria seus membros, chegando a 10 integrantes – formação que seria cambiável no decorrer dos anos, mas os regulares eram Lou Watts, Danbert Nobacon, Paul Greco, Boff, Jude Abbott, Alice Nutter, Dunstan Bruce e Harry Hamer.

Alice, que cantava e era também a percussionista, dizia várias vezes para os fãs pobres do Chumbawamba pegaram os discos piratas para curtirem a banda.

Em 1985, na época do EP Revolution, o som do Chumbawamba era hardcore, ajudando outras bandas com um selo chamado Agit-Prop, ligado à filosofia anarquista.

Nos anos 90, já tendo flertado com o eurodance, a banda lançou Anarchy (1994), sexto disco da banda, pelo selo One Little Indian, o mesmo na época de artistas como Sugarcubes e Bjork. O disco tinha duas grandes músicas: Give the anarchist a cigarette e Homophobia.

Destaque total para a capa de Anarchy: um neném recém-nascido sendo retirado da vagina da mãe, que também está na foto — muitas lojas se recusaram a vender o álbum. Só não postamos a imagem aqui por razões de autocensura consciente, mas é só pesquisar no Google.

Quando o Chumbawamba assinou com uma grande gravadora, a EMI (mais de 10 anos depois de terem lançado o primeiro disco), a banda conseguiu o disco triplo de platina nos Estados Unidos pelo Tubthumper, capitaneado, é claro, pela Tubthumping.

E usaram todo o espaço conquistado na mídia para agitação e propaganda explícita de suas ideias e ideais. O mais louco é que o Chumbawamba já tinha atacado diretamente a gravadora em 1989, quando colaboraram para uma compilação chamada Fuck EMI.

Confira a música Heartbreak Hotel, que começa aos 13m35s.

O escritor, filósofo, semiólogo, linguista e bibliófilo italiano de fama internacional Umberto Eco já apontava sobre a importância de se ter claro o código de um processo de comunicação para uma correta interpretação do significado contido na mensagem.

Foi isso que o Chumbawamba fez com Tub Thumping, ao usar a mídia como veículo de propaganda de suas ideologias. Foi de certo modo a culminação de um trabalho que já vinha de discos anteriores ao disco bancado pela EMI, como os indie Slap! (1990) e o já citado Anarchy (cuja capa serviu de inspiração para a capa do Tub Thumping).

O último disco, ABCDEFG, saiu em 2010 e foi lançado por um selo político-musical-esquerdista chamado No Masters. Vale citar uma música dela, Torturing James Hetfield, um ataque direto ao vocalista do Metallica.

Na época, a mídia soltou a informação que parte das torturas a presos iraquianos na Base Militar de Guantanamo – num lugar informalmente conhecido como “discoteca”, envolvia tocar músicas como Enter Sandman (do álbum “preto”, de 1991) a níveis absurdos de volume. Hatfield, ou a banda, nunca comentaram o assunto.

A força criativa do Chumbawamba durou 30 anos e 16 discos.

Pictures of Starving Children Sell Records (1986)
Never Mind the Ballots (1987)
English Rebel Songs 1381-1914 (1988)
Slap! (1990)
Shhh (1992)
Anarchy (1994)
Swingin’ with Raymond (1995)
Tubthumper (1997)
WYSIWYG (2000)
Readymades (2002)
Revengers Tragedy Soundtrack (2003)
English Rebel Songs 1381-1984 (2003)
Un (2004)
A Singsong and a Scrap (2005)
The Boy Bands Have Won (2008)
ABCDEFG (2010)

Em 2012, o Chumbawamba encerrou as atividades, 13 anos depois de estourarem com Tubthumping. Os caras disseram que o processo de composição, gravação e turnês da banda não estava fazendo justiça ao que o grupo pretendia quando começou, no início dos anos 1980.

Ainda encontraram vozes em 2013, quando pediram às forças militares americanas que não usassem suas músicas.

Tubthumping e a Copa do Mundo 1998

A Copa de 1998 teve a França como campeã, país-sede do evento, em cima do Brasil, mesmo com Ronaldo como o Bola de Ouro (prêmio dado ao melhor jogador).

Meses antes do evento, tivemos o jogo oficial do torneio lançado para os consoles Nintendo 64 (o 64-bits da Nintendo), Playstation (o 32-bits da então estreante Sony), computadores e Gameboy (o videogame portátil da Nintendo).

Capa do game para o PlayStation, o console de estreia da empresa Sony

World Cup 98 foi lançado em maio de 1998 e foi o primeiro game de Copa do Mundo feito pela EA Sports após a aquisição dos direitos oficiais da Fifa. E apesar de World Cup 98 não levar o nome da federação que controla o futebol no planeta, é praticamente o mesmo jogo em termos de dinâmica e gráficos que vemos em FIFA 98: Road to the World Cup (lançado no mesmo ano de 1997).

São 32 seleções disponíveis pára jogar em 10 estádios — entre eles o famoso Stade de France, palco da final da derrota do Brasil contra a França daquele ano –, e em modos de jogo como o versus convencional, amistosos e a própria Copa do Mundo e até mesmo as eliminatórias.

Um modo clássico era desbloqueado após vencer uma Copa do Mundo, com a possibilidade de reeditar as clássicas finais de Copa do Mundo, como Uruguai vs. Brasil de 1950 e Brasil vs. Itália de 1970. Tudo com direito aos estádios da época, bem como uniforme e jogadores correspondentes — até a aparência da bola muda.

E Tubthumping é a música escolhida para a abertura do game, a trilha sonora perfeita de um clipe de cenas de jogadores, torcidas e takes das cidades-sedes francesas da Copa, e mesmo que o Chumbawamba não apareça, é muito bem editado para mostrar a empolgação do maior evento esportivo do planeta.

Vale destacar ainda a banda inglesa Blur com a canção Song 2, música igualmente icônica para o mundo dos videogames, a gêmea de Tubthumping do Chumbawamba, pois é a música de abertura do “concorrente” de World Cup 98, o já citado Fifa 98.

Tubthumping do Chumbawamba chegou a aparecer na cultura pop até antes do jogo World Cup 98. No telefilme Querida, Encolhi a Gente (1997), temos a música do Chumbawamba nos créditos finais da produção, que é o terceiro filme da franquia Querida, Encolhi as Crianças (1989).

Apenas o ator Rick Moranis retornou dos filmes anteriores, o que marcou também sua despedida das telinhas e telonas — foi o último filme que Moranis atuou na vida. O filme é um dos primeiros da atriz Mila Kunis, e o único dirigido por Dean Cundey, que trabalha na indústria até hoje — fez a cinematografia de 2 episódios de O Livro de Boba Fett (2022).

/ Em 2008, o Chumbawamba lançou seu décimo terceiro álbum. Ele geralmente se chama ABCDEFG, mas na verdade o nome é The Boy Bands Have Won, and All the Copyists and the Tribute Bands and the TV Talent Show Producers Have Won, If We Allow Our Culture to Be Shaped by Mimicry, Whether from Lack of Ideas or from Exaggerated Respect. You Should Never Try to Freeze Culture. What You Can Do Is Recycle That Culture. Take Your Older Brother’s Hand-Me-Down Jacket and Re-Style It, Re-Fashion It to the Point Where It Becomes Your Own. But Don’t Just Regurgitate Creative History, or Hold Art and Music and Literature as Fixed, Untouchable and Kept Under Glass. The People Who Try to ‘Guard’ Any Particular Form of Music Are, Like the Copyists and Manufactured Bands, Doing It the Worst Disservice, Because the Only Thing That You Can Do to Music That Will Damage It Is Not Change It, Not Make It Your Own. Because Then It Dies, Then It’s Over, Then It’s Done, and the Boy Bands Have Won. Com 865 caracteres, é o álbum com o título mais comprido já lançado na história fonográfica.

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