A democratização dos meios de produção e circulação, tema comum nas discussões que envolvem a internet, os softwares, o streaming e os seus agregados, trouxe simultaneamente novas possibilidades e novos paradigmas, e aqui vamos co-relacionar isso a um conceito das HQs da editora DC Comics: a Equação Anti-Vida.
Na música, a nova configuração ofereceu a mais gente a capacidade de criação e de reverberação, ao mesmo tempo em que desordenou consideravelmente a balança da oferta e da procura: saímos de um passado recente onde as gravadoras mantinham essa equação sob mão de ferro para um livre arbítrio onde a liberdade de enforcar-se ocorre da maneira que quiser.
É uma situação distópica/apocalíptica para alguns (e entende-se a razão), mas vista por outros como um estado de desajuste muito comum ao início de novas eras.
De qualquer maneira, o resultado é líquido e certo: chegamos a um status quo onde aparentemente há muito mais produção sendo feita do que gente para ouvir o que é produzido.
Falei de música, mas isso se aplica a qualquer outro conteúdo.
Não tem como acompanhar tudo, seja mainstream ou underground, quanto mais os ordinários e simples.
Como notícias na nossa atual sociedade.
É tragicômico perceber que somos apenas espectadores do final da década 2010, e começo dos 20. Somos passivos opinantes que apenas servem de público-motor de fake news e informações que convém, presenciando as atrocidades que fazem no país e no mundo.
Não se escapa dessa forma, não há luta que consiga derrubar, a não ser de forma violenta e revolucionária — aspecto que ninguém parece querer, nem tem coragem de o fazê-lo.
A gana se restringe a xingar muito no Facebook e Twitter.
Importamos a grande fórmula prosaica do modus operandi USA:
A – políticos são denunciados por crimes;
B – eles negam e dizem que jornalistas e opositores políticos mentem;
C – O público fica sem sabem em quem acreditar;
Os arautos do caos, seres etéreos sem forma e voz do resultado dessa simples equação (A+B+C), são completa e absolutamente influenciadores, e se encarregam instaurar o medo e a inanição na população.
Há uma equação nos quadrinhos que também traz desespero e privação de liberdade.
Nasceu nos quadrinhos de super-heróis americanos nos anos 70.
A arma definitiva de controle absoluto, o E=mc2 do desespero.
A Equação Anti-Vida.
Equação Anti-Vida
loneliness + alienation + fear + despair + self-worth ÷ mockery ÷ condemnation ÷ misunderstanding x guilt x shame x failure x judgment n=y where y=hope and n=folly, love=lies, life=death, self=dark side
Solidão + Alienação + Medo + Desespero + Autoestima ÷ Zombaria ÷ Condenação ÷ Mal-Entendido × Culpa × Vergonha × Falha × Julgamento
n = y, onde ‘y’ = Esperança, ‘n’ = Loucura, Amor = Mentiras, Vida = Morte, Ser = Darkseid
Trata-se de um recurso narrativo criado pelo roteirista e desenhista Jack Kirby para a editora americana DC Comics.
Apareceu nas revistas do chamado Quarto Mundo, um conjunto de quatro revistas que mostravam Os Novos Deuses, seres acima da divindade convencional da Terra, e que acabam se envolvendo com os super-heróis terrestres, como o Superman.
A Equação Anti-Vida é uma fórmula que tira das criaturas o seu livre arbítrio, por meio de uma fórmula matemática que torna a vida, esperança e liberdade irrefutavelmente inúteis.
É mencionada pela primeira vez na primeira edição da revista The New Gods #1, em março de 1971. Na história, ocorre uma batalha épica entre os deuses antigos, que resulta na completa destruição de seu reino.
O novo deus maligno chamado Darkseid é o maior interessado em encontrar a fórmula matemática.
Kirby estabeleceu o conceito da Equação Anti-Vida como algo que daria ao ser que a aprende o poder de dominar a vontade de todas as raças sencientes e sapientes.
De acordo com o artista, ela é chamada de Equação Anti-Vida, porque “se alguém possui o controle absoluto sobre você – você não está realmente vivo“. Mas Kirby encerrou sua passagem na DC sem fechar a saga, e sem mostrar efetivamente o que pretendia com a equação.
A maior ambição de Darkseid é eliminar todo o livre-arbítrio do universo e remodelá-lo a sua própria imagem.
Ele tem um interesse especial na Terra, pois acredita que os seres humanos possuem coletivamente dentro de suas mentes os fragmentos da Equação Anti-Vida.
Uma vez que alguém tem contato com a equação, perde todo o livre arbítrio e se tornar um escravo obediente.
Na longa tapeçaria narrativa que centenas de criadores de quadrinhos executaram nos quadrinhos da DC, a equação foi usada por diversos outros autores, mesmo que esses estivessem anos-luz da ficção científica maluca que Kirby concebera.
Em uma história do Monstro do Pântano (The Swamp Thing #62, de 1987), Darkseid descobre que parte da fórmula é algo que lhe escapa — o amor. Roteiro de Rick Veitch, desenhos dele e arte-final de Alfredo Alcala.
Na mini-série Odisséia Cósmica (1988), escrita por Jim Starlin e ilustrada por Mike Mignola, a Equação Anti-Vida é revelada como um ser senciente, uma sombra maligna que corrompe e destrói tudo o que toca.
Darkseid é pego tão de surpresa que tem que se unir aos Novos Deuses e a um grupo de super-heróis da Terra para parar a entidade.
Na saga Invasão (1989), o deus maligno impede que a Terra seja destruída por completo, e alerta para que a Aliança Alienígena não mate toda a humanidade, pois parte da equação está com ela de alguma maneira.
Na revista Martian Manhunter #33, de 2001, é revelado que há 300 anos, quando havia uma civilização ainda viva em Marte, Darkseid estava por lá, e teve contato com a filosofia marciana.
Ela dizia que o livre-arbítrio e o propósito espiritual poderiam ser definidos por uma “equação de vida”. Assim, o novo deus postulou que deveria existir um equivalente do outro lado.
Jim Starlin voltou a escrever os Novos Deuses na mini-série Morte dos Novos Deuses (2007). Aqui, a entidade Equação Anti-Vida é na verdade metade de um ser cósmico que foi dividido em dois pelo guerra dos velhos deuses (a outra metade da entidade cósmica é a Fonte, o limite do universo conhecido da DC Comics).
Nessa saga, os Novos Deuses morrem, e caem no mundo material que é a Terra (eventualmente, retornam incorporados em alguns seres e super-seres terrestres).
O escritor Grant Morrison também fez uso do dispositivo narrativo da Equação Anti-Vida. Em 2005, citou a fórmula em diversas edições da maxi-série Os Sete Soldados da Vitória, que tem participação de alguns dos Novos Deuses.
Na mega-saga Crise Final (2008), Grant faz os Novos Deuses mortos por Starlin retornarem na história. Nela, a fórmula é finalmente revelada como uma mágica que escava sua cabeça até você se tornar um escravo sem vontade.
Funciona na forma de som, imagens e dados digitais — Darkseid usa a internet para espalhar a Equação Anti-Vida, e assim controla bilhões de pessoas.
Usando a tecnologia de um dos inimigos do Batman, o Chapeleiro Louco, Darkseid provoca um loop infinito na mente da população, que ao serem forçadas e usar capacetes, se tornam os chamados justificadores, soldados-escravos do vilão.
Em uma página de texto publicada na revista Final Crisis: Secret Files, Grant Morrison tenta juntar sua visão da Equação Anti-Vida com a de Jim Starlin, criada um ano antes. Ele sugere que a Equação é realmente senciente, mas que Darkseid ainda não entende a verdadeira natureza, e não toma conhecimento disso, mesmo usando a fórmula.
No reboot chamado Novos 52, feito em 2011, o conceito da equação é novamente usado.
Em 2012, a fórmula aparece na saga Terra 2, que tem envolvimento de Darkseid. E em 2017, na saga A Guerra de Darkseid, na revista da Liga da Justiça, descobrimos que a Equação Anti-Vida foi a fonte da criação do Universo Anti-Matéria.
Mobius, um cientista desse universo, ao ser tocado pela fórmula em determinado momento, é transformado no ser chamado Anti-Monitor, uma espécie de encarnação viva da Equação Anti-Vida.
O Anti-Monitor é responsável por uma das maiores e melhores sagas de quadrinhos de super-heróis já feitos, a Crise na Infinitas Terras, a mãe de todas as sagas. Trata-se de uma onda de anti-matéria que oblitera mundos, sua população e toda sua história em totalidade — passado e futuro.
A Equação em audiovisual
No último episódio da série de desenho animado Liga da Justiça Sem Limites (2006), Darkseid se lança a uma invasão a Terra para escravizar a raça humana.
Isso obrigado heróis e vilões se unirem para tentar derrotar o novo deus. Lex Luthor acaba ultrapassando a Fonte, e renascido, surge nos momentos finais, de posse da Equação Anti-Vida.
Aqui ela é uma luz, na palma de sua mão, e a oferece para Darkseid, encerrando o conflito. Suas últimas palavras antes de sumir em um clarão ao pegá-la das mãos de Luthor é dizer que ela é linda.
Uma onda semelhante que parece agora tomar nosso mundo.
O pior de tudo é ver a consternação fake de jornalistas tidos como mais bem informados e conhecedores dos bastidores do Brasil, se espantando com o que os partidos políticos são capazes de fazer nos bastidores na condução do país e sua nova política de recuperação.
E nada pior do que ver 7 de 10 pessoas da base da pirâmide social, que nunca alcançarão a estratosfera onde políticos negociam cifras de R$ 500 mil semanais para um cala-boca, comprando a ideia de que tudo estava indo bem no Brasil.
O jornalismo passa por crise, e apenas mais dados podem dar um gás no motor para que não morra no meio do caminho, como já comentei neste artigo.
/// REBOOT. Trata-se de uma reformulação criativa, feita de tempos em tempos por editoras de quadrinhos de super-heróis, onde anos de histórias e cronologia são apagadas ou simplificadas para dar início a novas histórias e direções, geralmente feitas comercialmente para atrair leitores novatos.
Obrigado por ler até aqui!
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