Jennifer Connelly em Essas Garotas é a atriz em um dos melhores filmes de sua carreira.
Depois de já ter feito uma comédia romântica em Sete Minutos no Paraíso, e um filme com um pouco de sobrenatural em Étoile, ela junta os dois em Essas Garotas, mesmo que esse pedacinho tenha um sabor tão leve que se não prestar atenção perde a referência.
Essas Garotas (Some Girls no original, lançado em 1988) também é mais um da lista extensa de filmes da Sessão da Tarde que Jennifer frequentou.
Com um background rico e mágico derivado da Renascença, não apenas é dos melhores longas da carreira da atriz, como ótima indicação de cinema em si.
Essas Garotas
(Some Girls, de 1988, de Michael Hoffman)
Cada vez mais bonita, a atriz Jennifer Connelly participa dessa produção de fotografia linda, filmada em Quebec, numa trama de três irmãs canadenses que fazem de gato e sapato um garotão inseguro colegial americano, em um ambiente de arte, hormônios e neve.
Patrick Dempsey, que faria carreira como o perdedor nerd de vários filmes oitentistas do gênero de comédia romântica masqueremossexotambém, é a estrela.
Ele depois faria Loverboy – O Garoto de Programa (1989), um clássico do Cinema em Casa no SBT, onde faz um entregador de pizza que pega todas as mulheres do filme, praticamente um soft porn sem os finalmentes, e uma porção de outros filmes, antes de ser o astro do seriado médico Grey´s Anatomy (2005-2021).
Dempsey faz o protagonista Michael, namorado de Gabriella D’Arc (Jennifer Connelly), que visita a moça na época de Natal, a seu pedido, apenas para ser chutado.
A narrativa entrelaça isso com o envolvimento dele com as outras irmãs, Irenka D’Arc, a mais velha (interpretada por Sheila Kelly), e Simone D’Arc, a mais novinha (interpretada por Annie Greenfiled).
E até a avó delas também acaba nesse jogo de amor não-correspondido com o rapaz, por mais incrível que isso pareça.
O mistério das mulheres e os segredos que guardam a família é entregue logo no início do filme, quando Michael passa por uma reprodução gigante do quadro Primavera, de Alessandro Filipepi, nascido em Florença há quase 700 anos, mais conhecido como Botticelli. Nele, podemos ver As Três Graças, simbolismos que veremos com força e poder no filme.
Essas Três Graças
A estonteante Gaby e suas duas manas são igualmente atraentes, e parte de uma família bastante excêntrica, composta pelo pai escritor e filósofo, o sr. D’Arc (Andre Gregory), que é obcecado pelo Blaise Pascal, a sra D’Arc (Florinda Bolkan), uma mãe católica fervorosa, o padre Walter (Jean-Louis Millete), muito próximo da família, e a avó, a matriarca D’Arc (Lila Kedrova), com infelizes sinais de demência.
A companhia masculina equivalente de Michael é Nick (Lance Edwards) seu oposto físico e mental, namorado de Irenka, um rapaz que pouco liga para os problemas da família, e que logo segue seu próprio caminho.
A trama nos faz acompanhar como Gabriella deixou o semestre escolar para visitar sua avó materna doente, e não mais retornou.
Michael quer vê-la de novo, pois ainda está apaixonado. Gaby então o chama para passar seu aniversário, e o Natal, com sua família na cidade de Quebec, e temos o andamento da trama do filme, com as desventuras de Michael por ter topado essa.
Ainda frustrado sexualmente, Michael continua perseguindo desesperadamente Gabby para resgatar seu amor, não tendo sucesso nas tentativas.
Ele ainda tem que lidar com o avanço das duas irmãs, Simone e Irenka, que têm seus próprios apetites e desejos.
Há descobertas, revelações e traições que não são bem o caso, que envolvem todos da família, e um desfecho misterioso que nos faz crer não apenas em vida após a morte, mas amor também.
Aliás, amor incondicional é o que a família D´Arc tem de sobra. Até para cederem esse sentimentos para outros usufruírem.
O longa passeia por todos os nove protagonistas nesse quesito.
As três irmãs D’Arc se abraçam na despedida de Michael perto da cena final do filme, como as Três Graças do quadro de Botticelli. Inocência, charme, beleza e amor.
A mitologia grega ensina que esses eram os componentes criativos que inspiravam trabalhos de arte e poesia. Essa mistura, muito rica e saborosa, no entanto, se perde no desenvolvimento muito apressado de vários personagens do filme.
Jennifer Connelly em sua melhor Primavera
Entender a nudez humana e sua sexualidade parece ser um dos objetivos da trama, que ainda tem a pretensão de aliar arte e simbolismo a uma típica comédia adolescente sexual dos anos 80.
Isso talvez tenha sido a tentativa do diretor Michael Hoffman em se diferenciar dos demais. Ele é hawaiano e estudou Renascença em Oxford.
Fez outros filmes de comédia romântica como Um Dia Especial (aquele com o George Clooney e Michelle Pfeiffer) e Sonho de Uma Noite de Verão (aquele com o Kevin Kline, a Michelle Pfeiffer, o Rupert Everett e Stanley Tucci).
O quadro Primavera, com as Três Graças, é um largo painel da Itália Renascentista, período em que acaba a Idade Média, e começa a Idade Moderna, pintado em tempera por Botticelli entre 1470 e 1480.
São figuras clássicas da mitologia grega em um jardim, sendo objeto das mais variadas interpretações.
No que estamos em debate, as Três Graças são irmãs, identificadas por certas correntes de estudo como Voluptas, Castitas e Pulchritudo. Significam Prazer, Castidade e Beleza, respectivamente.
No quarto em que Michael dorme na casa da família, cheio de móveis e objetos, há uma reprodução de uma estátua das três moças que aparecem na pintura.
Aqui elas são Euphrosyne, Aglaea e Thalia, e se trata de uma estátua neoclássica de Antonio Canova. Elas representam alegria, elegância e juventude/beleza, respectivamente.
Isso tudo não está à toa no filme. Hoffman quer passar esse sentimento e significados de arte, como a mansão barroca onde a família vive.
Mais óbvio, as irmãs são as Três Graças em pessoa.
Há arte também no livro autobiográfico do patriarca da família, que só consegue escrever pelado. Ele é ateu e tenta finalizar seu livro baseado na vida e obra de Blaise Pascal, um famoso francês matemático, físico, inventor e filósofo, dono de inúmeras contribuições para a ciência.
Pascal era católico, religião de todos da família D’Arc. Eles tem até um padre “próprio”, que antigamente era um pretendente da senhora D’Arc, mas que tomou um toco e resolveu vestir a batina.
O elemento religioso serve como contraponto no filme, carregado de uma sensualidade que passa por diversos níveis, como o pueril e natural, ao instigante e safado.
Sempre parece existir uma barreira para que essa parte da vida mais sensual e artística não triunfe. Mas uma vez vencidas, a verdade se revela, como Michael aprende no fim do filme, quer ele queira ou não.
O longa-metragem nos fazer perceber rápido como as ironias amorosas e de objetos de devoção podem direcionar nossos caminhos.
A vida é arte.
6º filme da Jennifer Connelly
Essas Garotas
Estados Unidos
/// 1988. Nos cinemas passavam filmes como Os Garotos Perdidos, Atração Fatal, Bom Dia, Vietnã, O Sobrevivente, O Último Imperador, Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, Asas do Desejo, Asas do Desejo, Super Xuxa Contra o Baixo Astral, Duro de Matar, A Hora do Pesadelo 4 – O Mestre dos Sonhos, Príncipe das Sombras, Elvira – A Rainha das Trevas, Inferno Vermelho, Conspiração Tequila, Corra Que a Polícia Vem Aí!, Uma Cilada Para Roger Rabbit, Willow – Na Terra da Magia, Os Safados, Águia de Aço 2, Os Jovens Pistoleiros, entre outros.
/// A idade de Jennifer Connelly em Essas Garotas é de 18 anos.
/// Jennifer Connelly não tem Instagram nem outro perfil em redes sociais
/// MEIO A MEIO. Essas Garotas é bem divisivo: tem 50% de avaliação no Rotten Tomatoes
/// MARATONA JENNIFER CONNELLY. Eis todos os filmes da atriz resenhados no blog:
1- Era Uma Vez na América (1984)
2- Phenomena (1985)
3- Sete Minutos Para o Paraíso (1985)
4- Labirinto – A Magia do Tempo (1986)
5- Essas Garotas (1988)
6- Etoile (1989)
7- Hot Spot – Um Local Muito Quente (1990)
8- Construindo Uma Carreira (1991)
9- Rocketeer (1991)
10- O Coração da Justiça (1992)
11- Do Amor e de Sombras (1994)
12- Duro Aprendizado (1994)
13- O Preço da Traição (1996)
14- Círculo das Vaidades (1996)
15- Círculo das Paixões (1997)
16- Cidade das Sombras (1998)
17- Amor Maior que a Vida (2000)
18- Réquiem Para um Sonho (2000)
19- Pollock (2000)
20- Uma Mente Brilhante (2001)
21- Hulk (2003)
22- A Casa de Areia e Névoa (2003)
23- Água Negra (2005)
24- Pecados Íntimos (2006)
25- Diamante de Sangue (2006)
26- Traídos pelo Destino (2007)
27- O Dia em que a Terra Parou (2008)
28- Coração de Tinta (2008)
29- Ele Não Está Tão a Fim de Você (2009)
30- 9 – A Salvação (2009)
31- Criação (2009)
32- Virginia (2010)
33- O Dilema (2011)
34- E…que Deus nos Ajude!!! (2011)
35- Ligados pelo Amor (2012)
36- Um Conto do Destino (2014)
37- Marcas do Passado (2014)
38- Noé (2014)
39- Viver Sem Endereço (2014)
40- Pastoral Americana (2016)
41- Homem-Aranha De Volta ao Lar (2017)
42- Homens de Coragem (2018)
43- Alita – Anjo de Batalha (2019)
/// ANÁLISE. É preciso falar mais sobre o quadro e sua força de significado. Tomo a liberdade de por aqui as palavras de André Forastieri, jornalista brasileiro que teve mão e cabeça em diversas publicações editoriais influentes dos anos 90, 2000 e 2010, dono de uma das newsletter mais necessárias nesse mar de ruído e informação em quem estamos. Você pode (deve) assinar a newsletter neste link.
“(…) Mercúrio.
É o deus da sabedoria, da alquimia, da comunicação, do comércio. É linguagem em forma líquida.
É a divindade à esquerda no quadro acima, de vermelho, o guardião do jardim do amor, o paraíso de Vênus – repare na espada. Seu bastão, o Caduceu, tem duas cobras entrelaçadas e representa a sabedoria.
O quadro já foi interpretado de muitas maneiras. Explicações diversas foram dadas para a cena, para as posições de cada divindade, para a presença de Cupido, Zéfiro, das três Graças, de Flora.
O que é certo: a Primavera foi pintada por Botticelli a pedido de Lorenzo di Pierfrancesco di Medici, sob supervisão de Marsilio Ficino.
É o encontro – astrológico, filosófico, espiritual – entre Mercúrio e Vênus, a comunicação e o amor. É o coração da Renascença.
Está na Galeria Degli Uffizi, em Florença. É grande, quase uma parede, e mais hipnotizante que sua outra metade, a Vênus de Botticelli.
O que é certo: é uma pintura invocativa. Segundo a historiadora Frances Yates: “Quero sugerir que, no contexto da mágica praticada por Ficino, a pintura começa a ser vista como uma aplicação prática de magia. Como um complexo talismã, uma imagem do mundo arranjada de maneira a transmitir apenas influências saudáveis, rejuvenescedoras, anti-saturnianas a quem a veja.”
Você também pode chamar de um sigilo. Ou feitiço.
Magia: a magia da Primavera.”
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O Cisne Negro dos anos 1980 com Jennifer Connelly
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