THE $TREET | Um Barrados no Baile dentro da Bolsa de Valores com Jennifer Connelly

No mundo dos corretores financeiros da Bolsa de Valores de The $treet, a testosterona e o estrogênio elevam as temperaturas sexuais e das taxas e aplicações nas alturas, e alguém (e não foi qualquer alguém) achou que isso era sexy o suficiente para se fazer uma série de TV.

The $treet (o cifrão como trocadalho do carilho) surgiu na emissora de TV americana Fox no ano de 2000, pelas mãos de Darren Star, criador de Barrados no Baile (1990) e Sex and the City (1998), dois cultuados seriados de pessoas ricas e gostosas transando sem parar, e que tinham um verniz cool e jovem noventista irresistível e interessante o suficiente para cativar diferentes audiências. Para a surpresa de ninguém, misturar sexo e taxas de câmbio em The $treet não fez sucesso nenhum.

Os dramalhões dos funcionários dessa firma financeira de impostos e rendas fixas teve o apelo sexual de uma coluna de concreto de um estacionamento de prédio.

A mistura de jovens descolados de Barrados no Baile com terminologias como carteiras de ativos e amortização, quando não estão tentando transar com alguém em meio a negociatas de companhias e perfis de investidores, não funcionou em absoluto.

A edição de videoclipe, tão marcante nos anos 1990, está no auge aqui, e cortes rápidos de cenas e composições criativas se esforçam para dar dinamismo para caminhadas aceleradas, closes rápidos angulosos e troca de takes-relâmpagos, na tentativa de gerar interesse em pessoas belas e bem-vestidas conversando ao telefone, fazendo contas no computador ou olhando para telas com transmissões ao vivo da Bolsa de NY.

The $treet
A legenda do cartaz é boa. Mas esse elogio da Rolling Stone não

Ainda que os atores entreguem qualidade nas interpretações, não funciona. Jennifer Connelly é hipnotizante em tela (e ainda assim sua figura foi “aproveitada” sensualmente apenas em um episódio, e de forma comedida), e Rick Hoffman faz um Freddy muito fácil de amar odiar, e é bom reforçar que apesar de Tom Everett Scott ser o protagonista, as mulheres desempenham grande parte das tramas, em diferentes pesos e medidas de importância ao longo dos 12 episódios.

O fracasso de The $treet foi tão grande que nem todo o material produzido foi ao ar. Algumas fontes indicam que a Fox veiculou apenas 7 episódios. De qualquer maneira, 11 deles estão disponíveis na internet, mas o décimo segundo nunca se viu (e infelizmente não será “resenhado” nessa matéria).

A televisão norte-americana no final dos anos 1990 e começo dos 2000

The $treet é um típico produto de uma parte significativa dos anos 1990, e encerra a década de modo triste para Darren Star, já que 10 anos antes ele criou um seriado poderoso com Barrados no Baile: a teia de relacionamentos dos personagens e sexo casual se tornou uma máxima para muitas das tramas.

Beverly Hills 90210 (nome original do seriado) teve 10 temporadas exibidas pela Fox, de 4 de outubro de 1990 a 17 de maio de 2000, e seguia as vidas de um grupo de jovens privilegiados que viviam em Beverly Hills, Califórnia.

A popularidade gerou uma série “irmã”, Melrose Place, que foi ao ar de 1992 a 1999, por sete temporadas.

A série se passa no condomínio Melrose, em Los Angeles, onde rolava muita ambição, sexo, traições e até mesmo assassinatos.

Os trabalhos mais recentes de Darren Star na televisão incluem as comédias dramáticas Younger (2015/2020), feita para a TV americana, baseada no livro homônimo escrito por Pamela Redmond Satran, e Emily in Paris (2020), criado especialmente para o serviço de streaming Netflix.

Por outro lado, outra parte significativa da produção de seriados na televisão norte-americana, no final dos anos 1990 e começo de 2000, dava início a uma transformação sem precedentes.

Canais como HBO, FX e AMC passaram a investir em produções autorais com narrativas dramáticas e repletas de ressonância emocional, personagens politicamente incorretos e assuntos fora do padrão.

Narrativas em faroeste lamaçento e imundo, em funerária sorumbáticas, em boate da máfia, com policiais que viram criminosos, criminoso que vai para o divã, professor que vira chefão do tráfico, mentiroso que constrói publicidade.

O escritor Brett Martin, em seu livro Homens Difíceis, combinou uma profunda pesquisa com análise cultural e contexto histórico, onde define a ascensão dos assim chamados por ele de “homens difíceis”: o misterioso e solitário Don Draper, de Mad Men, o astuto Walter White, de Breaking Bad, e Tony Soprano, de Sopranos. Homens infelizes, moralmente corrompidos, complicados, profundamente humanos.

Esse movimento foi revolucionário, e provocaram uma ruptura no modelo do mercado de drama televisivo. Séries como Breaking Bad, Sopranos, Mad Men, Dexter, The Wire e Game of Thrones mostraram que era necessário histórias mais complexas, com personagens multifacetados e politicamente incorretos.

Darren Star, a anos-luz dos tons sombrios e pesados dessas séries, ainda leva o mérito de ter criado Sex and The City, uma série inovadora, logo depois do primeiro produto adulto e sofisticado da HBO, o seriado prisional chamado Oz, um produto marcado por uma estética agressiva, homoerótica, poderosa e que rachava a prisão em tribos que emulavam o próprio tecido multicultural que cobre as veias e o sangue da América — brancos, negros, latinos, italianos, gays e travestis, neonazistas, muçulmanos, pentecostais, os perdedores e os guardas e autoridades.

Sex and The City de Star estreou em 6 de junho de 1998, de olho nas mulheres (e um número suficiente de homens) do país inteiro. O programa se baseava nas colunas de Candace Bushnell para o jornal The New York Observer. Tinha uma narrativa direta e franca, com suas quatro protagonistas performando sem escrúpulos papéis arquetípicos de a Vadia, a Pudica, a Dedicada e a Heroína, em um conto de fadas urbano e cheio de glamour numa Nova York sempre atraente e cheia de desejos e ricas (literalmente) aventuras.

As mulheres de Sex and The City falavam abertamente de dúvidas sobre seus corpos, que usavam como queriam, em situações que mulheres jamais tinham feito na TV até então.

Mais um bom slogan para a série

The $Treet vem no grande sucesso que Darren Star conseguiu na HBO em meio a disputa de atenção com vários outros seriados — quando Sex and The City estreou, Oz estava em sua segunda temporada.

Durante as seis temporadas das aventuras das quatro amigas, elas dividiram os holofotes da casa com Sopranos, The Wire, A Sete Palmos e The Shield (esse no FX).

Darren tinha munição de grosso calibre e musculatura para construir qualquer coisa. E quando seu The $treet — que lembra muito mais Barrados no Baile dentro da Bolsa de Valores — estreou na Fox em 2000, o seriado tinha Sopranos, Oz e o próprio Sex and The City de companheiros de tela.

Jennifer Connelly e The $treet, a primeira experiência na TV

Tom Everett Scott e Jennifer Connelly

The $treet foi a primeira série de TV estrelada pela atriz Jennifer Connelly, vinda diretamente de um filme cabeçudo de ficção científica, Cidade das Sombras (1998), e posicionada como figura de luxo na trama e nos créditos do seriado, que ainda tem a honra de ter o ator Giancarlo Esposito como o chefão da corretora fictícia Balmont Stevens.

Esposito teve um grande papel nos cinemas em 1995, quando estrelou Os Suspeitos, filme de Bryan Singer, um dos melhores longa-metragens de suspense do cinema.

O ator interpreta Jack Baer, que investiga a explosão de um navio e diversos assassinatos ocorridos nele, e fica a um passo de descobrir a identidade de um dos maiores chefões do crime que o cinema já produziu, Keyser Soze, interpretado por Kevin Spacey.

Giancarlo interpretaria outro grande chefão do crime, no seriado Breaking Bad (2007/2011), ao dar vida ao inesquecível Gus Fring.

Atulamente, o ator é o maior vilão da franquia Star Wars, com a Disney lhe posicionando como Moff Gideon, o inimigo a ser batido na série The Mandalorian (2019/2020), no novo cânone que está construindo para a saga.

Os episódios de The $treet

O logo da série

The $treet segue um grupo de empregados de uma empresa da bolsa de valores nova-iorquina, a Balmont Stevens, localizada no centro financeiro mundial, e que é dirigida pelo executivo de contas Tom Divack (Giancarlo Esposito), que comanda os corretores Jack T. Kenderson (Tom Everett Scott), o “protagonista” do seriado, o ambicioso Chris McConnell (Sean Maher), o sexista meio careca Freddy Sacker (Rick Hoffman), o novato Tim Sherman (Christian Campbell) e Evan Mitchell (Adam Goldberg).

Na trama também vemos as aventuras da recepcionista (logicamente negra) Donna Pasqua (Melissa de Sousa), a corretora Bridget Deshiell (Bridgette Wilson), Alexandra Brill (Nina Garbiras), advogada da firma e (ex) noiva de Jack, e a nova supervisora de contas, Catherine Miller (Jennifer Connelly, lindíssima, no final dos seus 20 anos, há um passo de ser Oscarizada).

01×01 – Apresentação de todos os personagens, com generosas cenas (e diálogos) picantes entre eles.

01×02 – Bridget Deshiell surge como uma “quase” aventura amorosa casual para Jack, que logo pagará caro por isso. Freddy Sacker e Catherine Miller começam a se estranhar e não param mais.

01×03 – Catherine Miller começa a aparecer com mais frequência, e um padrão é estabelecido aqui: flerte, escritório, trabalho, bar. Participação especial do ator Dan Hedaya, que se mostra extremamente interessado em Cat, da maneira mais errada possível.

01×04 – Bridget Deshiell retorna, e dessa vez integrada à firma, e mostra que sabe exatamente o que quer e o que fazer para conseguir. Temos um beijo gay “sem querer” (isso ainda era motivo de “piada” nos anos 90) e Evan descobre que está saindo com uma atriz pornô (isso também por alguma razão é colocado como motivo de piada). Alexandra desmancha o noivado com Jack.

01×05Gillian Sherman, interpretada por Jennie Garth, é trazida ao elenco, como tentativa de gerar mais interesse, e Clay Hammond, interpretado por Bradley Cooper, vem à tiracolo — Jennie interpretava Kelly Taylor em Barrados no Baile. O término de Alexandra e Jack dá a dinâmica dos dois personagens pelo resto da trama.

01×06 – Os produtores optaram por começar esse episódio com uma cena de banho da personagem de Jennifer Connelly. Ora, era o final da década de 1990, se fosse para “mostrar”, que mostrassem logo algo então. Cat se envolve com um cara no elevador quebrado da firma e os bombeiros confundem seus gemidos com pedido de socorro. Ah, os anos 90…

01×07 – Hora de deixar a trama mais pesada ao dar para Freddy Sacker um câncer nos testículos. Até Catherine se compadece. Evan varia suas escolhas amorosas de atriz pornô a uma misteriosa e rica mulher, adepta da burka, filha de um poderoso empresário investidor da firma. Tudo muito mal desenvolvido, ainda mais se levarmos em conta que Adam Goldberg não tem o biotipo de garanhão encantador de mulheres.

The $treet

01×08 – Bridget Deshiell e Alexandra Brill acabam se interessando por um mesmo cara e o “disputam”.

01×09 – Chris é despedido da firma, e inadvertidamente parece que vai cair em algum golpe financeiro de Gillian. Para a surpresa de ninguém, Jack e Catherine começam a se pegar. E Evan agora se aventura com uma detenta.

The $treet

01×10 – Catherine se vê as voltas com um ex, e Sacker põe tudo a perder quando arma uma festinha regada a prostitutas com um potencial cliente e todo mundo para na prisão.

Participação especial de Peter Dinklage como um anão muito mal-encarado em uma das celas — o ator ficaria mundialmente famoso ao interpretar Tyrion Lannister no seriado Game of Thrones, que se tornou um sucesso fenomenal na HBO.

Bridget e Alexandra saem para a balada juntas, acertam suas diferenças e se divertem de montão. Jack e Cat começam a se encontrar com mais frequência.

01×11 – Cena emblemática com Catherine, Alexandra e Bridget, tirando uma da cara de um músico, paquera da Alexandra — as três se mostram muito metidas com seus trabalhos, como se superiores aos outros.

Bom momento para mostrar que as três não valem muita coisa, e são passíveis de falhas como qualquer outra pessoa.

O ex de Cat ainda ronda Jack, que tenta terminar o pré-relacionamento dos dois. Sacker perde seu casamento, que durou só até ele ter tratado o câncer (sim, foi rápido assim).

01×12 – ?

Segue a série completa no YouTube para (sério?) quem quiser assistir.

The $treet
Sério que você quer assistir?

/ ADAM GOLDBERG. Depois de The $treet, Jennifer Connelly trabalharia com o ator em Uma Mente Brilhante (2001), longa que deu o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante para a morena.

/ BRIDGETTE WILSON. A atriz Bridgette Wilson interpretou a militar Sonya Blade no filme Mortal Kombat (1995), um dos grandes longa-metragens do cinema baseado em videogames, uma transposição de mídia que quase nunca dá certo.

Apesar do filme não ser o melhor exemplar do gênero, ainda se sobressai em qualidade perante outros, e ainda hoje consegue entreter de alguma maneira.

Fez bastante sucesso na época, foi massacrado depois, e agora redescoberto, é considerado um bom filme. Em sua longa carreira no cinema, Jennifer Connelly estrelou praticamente em todos os gêneros, mas adaptações cinematográficas de videogames não estão entre elas.

The $treet
Bridgette Wilson e Jennifer Connelly

/// A MARATONA JENNIFER CONNELLY.

1- Era Uma Vez na América (1984)
2- Phenomena (1985)
3- Sete Minutos Para o Paraíso (1985)
4- Labirinto – A Magia do Tempo (1986) 
5- Essas Garotas (1988) 
6- Etoile (1989)
7- Hot Spot – Um Local Muito Quente (1990)
8- Construindo Uma Carreira (1991)
9- Rocketeer (1991)
10- O Coração da Justiça (1992)
11- Do Amor e de Sombras (1994)
12- Duro Aprendizado (1994)
13- O Preço da Traição (1996) 
14- Círculo das Vaidades (1996) 
15- Círculo das Paixões (1997)
16- Cidade das Sombras (1998)
17- Amor Maior que a Vida (2000)
18- Réquiem Para um Sonho (2000) 
19- Pollock (2000)
20- Uma Mente Brilhante (2001)
21- Hulk (2003)
22- A Casa de Areia e Névoa (2003)
23- Água Negra (2005)
24- Pecados Íntimos (2006)
25- Diamante de Sangue (2006)
26- Traídos pelo Destino (2007) 
27- O Dia em que a Terra Parou (2008)
28- Coração de Tinta (2008)
29- Ele Não Está Tão a Fim de Você (2009)
30- 9 – A Salvação (2009)
31- Criação (2009)
32- Virginia (2010) 
33- O Dilema (2011)
34- E…que Deus nos Ajude!!! (2011)
35- Ligados pelo Amor (2012)
36- Um Conto do Destino (2014)
37- Marcas do Passado (2014)
38- Noé (2014)
39- Viver Sem Endereço (2014)
40- Pastoral Americana (2016)
41- Homem-Aranha De Volta ao Lar (2017)
42- Homens de Coragem (2018)
43- Alita – Anjo de Batalha (2019)

Jennifer Connelly não tem Instagram nem outro perfil em redes sociais. Ela tinha 29 anos quando fez The $treet.

The $treet

curadoria e textos: tomrocha (twitter e instagram)
jornalista, estrategista de conteúdo e escrevedor de coisas escritas.

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