O Dia do Chacal é um dos melhores filmes de ação do cinema, e soma isso com política, espionagem e discussões pesadas a respeito de colonialismo, aspecto que praticamente permeia qualquer outra discussão sobre qualquer outra de nossa sociedade.
Lançado em 1973, década emblemática para essa sociedade de modo geral, o filme foi dirigido por Fred Zinnemann, já um grande cineasta na época, oscarizado por O Homem que Não Vendeu sua Alma (1966).
Ele quis fazer o filme de O Dia do Chacal depois que leu um manuscrito do livro de mesmo nome que Frederick Forsyth publicou em 1971.
O romance foi um best-seller, um dos grandes thrillers do mundo da literatura, e sua versão cinematográfica não decepciona.
A trama é sobre o assassino de aluguel Chacal, contratado pelos militares de direita da França para assassinar o próprio presidente do país, o general Charles De Gaulle, por conta de sua decisão de permitir a independência da Argélia, antiga colônia francesa.
Na vida real, De Gaulle já tinha sofrido uma tentativa de assassinato.
A ano de 1973 foi marcado por diversos acontecimentos importantes, que reverberam ainda hoje na cultura pop como um todo.
O ano começou com a Assinatura do Acordo de Paris para o Fim da Guerra e Restauração da Paz no Vietnã, um conflito que dilacerou a perdedora América, física e moralmente, e que marcaria a indústria cultural do país para sempre.
A intenção do acordo era estabelecer a paz no Vietnã e acabar com a guerra. Estes acordos puseram fim à intervenção direta das Forças Armadas dos Estados Unidos no país e estabeleceram uma trégua temporária nos combates entre o Norte e o Sul.
No comando do governo, ainda era Richard Nixon, com seu segundo mandato como Presidente dos Estados Unidos.
Também começou a Guerra do Yom Kippur, onde Síria, Egito e Iraque começaram a atacar Israel, para reivindicar territórios em disputa desde os anos 40.
A Arábia Saudita, maior produtora de petróleo do planeta, retaliou os países que apoiaram Israel fazendo uso de sua maior arma: o petróleo, produto que controlava na maior parte do planeta. Ela fechou a torneira, causando uma crise mundial — o aumento do preço da gasolina na América foi de 400% em meses.
Junto a isso, as revelações sobre o escândalo político do Caso Watergate, quando partidários de Nixon tentaram incriminar os Democratas, escalonaram.
As acusações de corrupção e revelações sobre seu envolvimento custaram a Nixon boa parte do seu apoio político, quando se tornou o primeiro e único Presidente a renunciar o cargo, um ano depois.
O World Trade Center era inaugurado em Nova York, marcando para sempre os céus da cidade, como símbolo do poder capitalista e comercial, identidades inerentes ao EUA.
O dinheiro começava a fluir de modo alternativo para Hollywood também, que via uma nova geração de cineastas criarem longas com temas marginais e longe dos convencionais.
Não apenas nos EUA: teve início o Novo Cinema Alemão, o Cinema Asiático, o Cinema Canadense, o Novo Cinema Australiano, bem como os filmes policiais de Hollywood, o nascimento das chamadas “superproduções” dela, além dos dramas americanos, uma nova era de musicais e um novo cinema de terror.
Aliás, o público aprendia o que era o verdadeiro horror dentro do escapismo, quando o inacreditável O Exorcista, do diretor William Friedkin, com Jason Miller, Max Von Sydow, Ellen Burstyn, Linda Blair e Lee J. Cobb, fez a platéia literalmente vomitar e sair correndo das salas.
Era também o ano em que o musical Jesus Christ Superstar se tornou filme, nas mãos de Norman Jewison, e que causou enorme polêmica na época, ao narrar uma ópera rock alternativa sobre Jesus.
Ainda nas telonas, o filme Five Fingers of Death é lançado nos EUA, dando início à febre de artes marciais na sétima arte.
Infelizmente, foi em 1973 que o astro Bruce Lee morreu, antes mesmo de ver seu primeiro filme ocidental ser lançado, Operação Dragão. No mesmo ano, filmes produzidos pela companhia Shaw Brothers, baseada em Hong Kong, uma das maiores produtoras orientais de cinema de ação e artes marciais, abasteceriam o mercado americano por um longo tempo.
Operação Dragão, produzido pela Warner, realizado por Robert Clouse, foi o filme da consagração suprema das artes marciais em Hollywood, um filme de kung-fu com trama de James Bond 007, com um herói chinês (Bruce Lee) contracenando com um carateca branco, John Saxon, e outro negro, a estrela do gênero blaxploitation Jim Kelly, numa onda cinematográfica em que o negro era o protagonista, tão potente que até o 007 de 1973 foi nesse estilo: Viva e Deixe Morrer, com Roger Moore e Yaphet Kotto.
Bastante distante do mood 007, O Dia do Chacal é uma produção franco-britânica bem austera e séria, sem grandes alardes carnavalescos, e fiel à narrativa do livro, que enxuga trechos, dobra outros e estica o que funciona melhor para um formato audiovisual, o que permitiu um filme interessante do começo ao fim. Edward Fox, o ator que interpreta o Chacal, um semi-desconhecido escolhido a dedo por Zinnemann, faz o necessário para nunca atropelar o que realmente importa na trama: uma corrida contra o tempo (Zinnemann fez mais de 30 takes de relógio em O Dia do Chacal) para tentar descobrir quem quer matar De Gaulle — e mais importante: como.
O Dia do Chacal
(The Jackal´s Day, 1973,
de Fred Zinnemann)
Organisation Armée Secrète – OAS, conhecida geralmente como Organização do Exército Secreto, era uma organização de direita paramilitar clandestina francesa que se opunha à independência da Argélia, e realizou várias ações terroristas tanto lá como na França.
A sua mais conhecida ação foi o atentado contra a vida do Presidente da França, o General Charles De Gaulle.
O Dia do Chacal já começa com o que vai fazer durante o final: tentar matar De Gaulle, interpretado aqui pelo ator Adrien Cayla-Legrand.
Nem 140 tiros foram suficientes para detê-lo, e ele escapa sem nenhum arranhão. Seis meses depois dos eventos, os envolvidos e os conspiradores foram presos, e o capitão do exército responsável pela tentativa de assassinato, Bastien-Thiry (Jean Sorel), é executado pelo crime, morto por fuzilamento.
Estamos agora em 11 de março de 1963. A OAS está na berlinda, sem dinheiro, e talvez precise de alguém de fora, sem fichas na polícia francesa, para conseguir matar De Gaulle. Os líderes da organização, o coronel Rodin (Eric Porter), Casson (Denis Carey) e Montclair (David Swift) escolhem alguns nomes entre alguns que Rodin trouxe.
Quem chama a atenção é um certo matador inglês, responsável por matar Trujillo, uma referência direta à Rafael Trujillo, ditador da República Dominicana entre 1930 e 1961, naquela que foi uma das ditaduras mais brutais das Américas, responsável pela morte de milhares de dominicanos e estrangeiros numa sanha anti-comunista sanguinária, incluindo mais de 30 mil haitianos no Massacre de Parsley. Ele teve apoio dos Estados Unidos e da Igreja Católica.
Em 30 de maio de 1961, Trujillo morreu assassinado a tiros em uma estrada deserta, próximo a capital Santo Domingo, encerrando 31 anos de ditadura.
O trio também comenta que o matador estava no Congo, outra referência de assassinato, dessa vez à Patrice Lumumba, fundador do Movimento Nacional Congolês (MNC), a principal liderança na luta contra a dominação colonial belga no Congo, tendo participação decisiva na libertação do seu país.
Foi eleito primeiro-ministro em 1960, mas ocupou o cargo apenas por 12 semanas, pois um golpe de estado apoiado pelos EUA e Bélgica destroçou o Congo. Ao tentar fugir do país, Lumumba foi capturado e morto em janeiro de 1961.
Importante citar que esses dois assassinatos tem forte carga política, já que Trujillo era um carniceiro de direita e Lumumba um idealista contra o colonialismo, dois aspectos que vão de encontro direto ao que a OAS é e o que deseja manter.
Havia outras duas opções de assassinos, mas o escolhido é o inglês. Quando ele surge, interpretado pelo ator Edward Fox, o homem não tem receios em dizer que os sucessivos fracassos da OAS exigem que eles contratem alguém de fora, já que a organização está tão cheia de delatores que nada fica em segredo por muito tempo.
E que as mal-sucedidas tentativas de assassinato contra De Gaulle estragaram o “jogo” para todos os outros de fora.
O matador aceita o serviço, mas pede a inacreditável (para a época) quantia de meio milhão de dólares pelo assassinato.
A contragosto, Rodin, Casson e Montclair aceitam. O plano será do matador, que pede metade adiantado — “e como vamos conseguir o dinheiro?” – “use seu pessoal para assaltarem uns bancos” — e define um codinome para ser tratado: Chacal.
E eles nunca mais se veem. De Gaulle tem a melhor segurança do mundo, mas o Chacal irá provar que é o mais sagaz dos matadores, ao elaborar um plano magistral para conseguir furar o esquema de proteção e matar o presidente francês.
Os seguidos assaltos à banco promovidos pelo OAS para juntar a grana para pagar o Chacal chamam a atenção da polícia, e não demora para que eles sintam que algo está prestes a acontecer.
Quando a quantia de dinheiro bate os 960 mil francos, a polícia começa a investigar mais a fundo.
As autoridades conseguem determinar a localização dos cabeças da OAS, e capturam Wolenski (Jean Martin), um dos guardas pessoais dos 3 líderes. Torturado barbaramente, ele entrega um nome: Chacal.
O responsável que as autoridades do governo colocam o inspetor e comissário Claude Label (Michael Lonsdale), o melhor detetive da polícia francesa, para descobrir a identidade desse Chacal.
Quando o Chacal vai atrás de documentos falsos, e o falsário engraçadinho tenta se aproveitar dele, o diretor nos mostra a letalidade do assassino.
Label mergulha fundo nas investigações, e pede ajuda de países estrangeiros, e Charles Harold Calthrop é um nome que surge em colaboração com a polícia da Inglaterra. Enquanto isso, Paul Duggan é o nome que Chacal usa para se movimentar livremente na Europa.
Esse jogo de gato e rato muito bem construído no longa, e muito da diversão é ver para onde Chacal vai, e como Label tenta se antecipar a isso. São grandes sacadas do filme, e o espectador se sente parte das descobertas das tramas.
Quando o cerco parece se fechar contra o Chacal, ele tem a chande a abandonar tudo e ir para a Itália, mas prefere ficar e cumprir a missão.
A parte em que ele usa um flerte numa mulher e consegue um lugar para ficar, graças à Madame Colette de Montpellier (Delphine Seyrig), é muito bem construída. Também vemos a flexibilidade do Chacal quando esse disfarce cai.
O assassino não tem reservas em procurar um banho turco para conseguir um novo local, dessa vez graças a um flerte gay, e consegue ficar “escondido” no apartamento do infeliz que gostou dele.
Zinemman ainda reserva muitas surpresas até chegar à fatídica sequencia final de o Dia do Chacal.
O Dia do Chacal: o livro
O Dia do Chacal é um dos maiores romances policiais de todos os tempos, um clássico do escritor Frederick Forsyth.
Nascido na Inglaterra, em 1938, Forsyth trabalhava de piloto na RAF (Royal Air Force), mas queria mesmo era ser correspondente no exterior. Tentou o jornalismo para alcançar esse caminho, e com muito custo conseguiu em emprego na agência de notícias Reuters.
Era extraordinariamente rápido no ofício, e se tornou um grande especialista nos dramas da política internacional, trabalhando na França.
Forsyth também era grande fã de romances policiais. Retornando a Londres em 1965, trabalhou como repórter de rádio e televisão na BBC.
Cobriu conflitos na Nigéria, especialmente sobre o mundo dos soldados mercenários. Em 1968, deixou a BBC e cobriu guerras, primeiro como freelance, e depois para o Daily Express e para a revista Time.
Quando se viu desempregado em 1970, teve a ideia de escrever um livro, baseado em seu trabalho, especialmente em sua cobertura sobre as tentativas da extrema direita francesa de assassinar o general Charles De Gaulle, presenciadas por ele em 1962 em Paris.
Como um assassino poderia vencer a segurança intransponível de um estadista?
Como que um matador profissional contratado pela extrema direita francesa poderia realmente matar o presidente da França, matar De Gaulle?
Para Frederick, a OAS bota essa missão nas mãos do maior assassino do mundo, o Chacal, e assim temos um dos melhores thrillers que a literatura já produziu, 442 páginas de pura ação, mistério e uma corrida contra o tempo, impossíveis de largar.
Forsyth escreveu o livro em 6 semanas. Em seus trabalhos como jornalista, ele esteve na Alemanha Oriental e na Tchecoslováquia, países onde obteve muitas informações que seriam, posteriormente, publicadas em seus livros.
Essa experiência no jornalismo ensinou Forsyth a ser minucioso e preocupado com as verdades históricas.
O enorme sucesso com O Dia do Chacal o tornou um escritor internacionalmente reconhecido, e Forsyth especializou-se em romances envolvendo espionagem e política internacional, como A Alternativa do Diabo, Dossiê Odessa e O Quarto Protocolo.
Os bastidores da produção
O livro, e muito mais o filme de O Dia do Chacal, foi tão impactante nas forças de segurança pública europeias, que as autoridades de Londres mudaram as leis de emissão de passaporte para reduzir as chances de alguém usar identidade de pessoas mortas, tal qual o Chacal faz na trama.
Frederick Forsyth disse em entrevistas que foi avisado que essas coisas aconteciam muito nos anos 1960, e por isso a inseriu na trama.
As autoridades de Londres afirmam que nunca tiveram registros disso, a despeito de erguerem barreiras para ela depois da popularização da novela de Forsyth e do filme de Zinneman.
O governo da França ajudou muito as filmagens de Zinnemann, providenciando soldados e extensas locações, especialmente no The Liberation Day, em Paris.
Trata-se do evento do “Dia da Libertação”, comemorado em 19 de agosto, data da liberação ou libertação de Paris (também conhecida como Batalha por Paris) em 1944.
Ela marca a rendição da última guarnição alemã presente na capital da França, administrada pela Alemanha nazista desde a assinatura do armistício de 22 de junho de 1940.
As cenas do The Liberation Day de O Dia do Chacal foram filmadas na parada real, sem que o público soubesse que eram para o filme.
Fred Zinnemann teve uma carreira longeva nos cinemas, com 47 filmes, segundo informações do Internet Movie Database. Alguns deles são verdadeiros clássicos, como Matar ou Morrer (1952), A um Passo da Eternidade (1953) e oscarizado O Homem que Não Vendeu sua Alma (1966).
Fred nasceu em 1907 na cidade de Rzeszów, no então Império Austro-Húngaro. Queria ser violinista, mas acabou estudando Direito na Universidade de Viena.
Seu interesse por filmes americanos cresceu tanto que ele decidiu que era isso que ele queria fazer. Procurou se envolver na área na Europa, fez algumas filmagens e partiu para a América para estudar cinema.
Para seu O Dia do Chacal, Fred queria alguém anônimo para interpretar o assassino, e recusou diversos nomes famosos, até encontrar Edward Fox, um ator relativamente desconhecido.
Esse fato, sem ser intenção do diretor, foi um dos motivos para o sucesso da produção, que jogou para os holofotes apenas a trama em si. Fox chamou a atenção de Zinnerman quando o viu em O Mensageiro (1971), onde o ator tem essa linha de diálogo: “Nothing is ever a lady’s fault“.
Quando os dois finalmente se encontraram, Fox disse que o diretor lhe disse que qualquer ator que conseguisse tornar crível essa frase, teria sua atenção.
Fred Zinnemann teve a oportunidade de fazer O Dia do Chacal quando visitou a casa de seu amigo, o produtor John Woolf, que tinha uma cópia do livro de Frederick Forsyth — na verdade um manuscrito não-publicado da obra.
Fred pegou e levou para casa. Leu em uma noite, e, no dia seguinte, ligou para Woolf querendo fazer um filme.
Woolf queria Roger Moore para fazer o Chacal, mas Zinnemann recusou terminantemente. Moore foi o segundo James Bond, o agente secreto inglês 007 dos cinemas, após Sean Connery deixar a franquia.
Michael Lonsdale — escolhido para ser Label depois que fez A Voz do Sangue (1964) do próprio Zinnemann — interpretou o vilão Hugo Drax em 007 Contra o Foguete da Morte (Moonraker, 1979), que tem Moore como 007.
Edward Fox fez o M, chefão do MI6, o serviço secreto inglês, o superior de Bond, em 007 – Nunca Mais Outra Vez (Never Say Never Again, 1983), que marca o regresso de Connery ao papel depois de 12 anos.
O longa é resultado de um enrosco de direitos autorais, e não foi produzido pela Eon Productions, à revelia de Albert R. Broccoli e Harry Saltzman, os produtores desde sempre do 007 nos cinemas. Connery aceitou voltar ao papel apenas pela bagunça. O longa foi dirigido por Irvin Kershner, que tinha filmado em 1980 o Star Wars – O Império Contra-ataca, o segundo — e melhor — filme da franquia espacial de George Lucas.
Outros atores considerados para interpretar o Chacal foram Robert Redford, Michael Caine e Jack Nicholson. Derek Jacobi, que interpreta Caron, um detetive que ajuda Lebel, interpretou Klaus Winzer em O Dossiê de Odessa (1974), outro filme que adapta uma novela de Forsyth, em um roteiro escrito por Kenneth Ross.
O cineasta John Frankenheimer, diretor de filmes como Sob o Domínio do Mal (1962) e Sete Dias de Maio (1964), também queria dirigir a versão cinematográfica de O Dia do Chacal, mas não conseguiu.
Ele e Ross fizeram juntos outro thriller político, Domingo Negro (1977), filme baseado no livro de Thomas Harris (o criador do canibal Dr. Hannibal Lecter), numa trama sobre um grupo terrorista, o Setembro Negro, que tentou explodir um dirigível Goodyear pairando sobre o estádio do Super Bowl com 80.000 pessoas e a presença do presidente dos Estados Unidos. O filme anterior a esse de Frankenheimer foi Operação França II (1975), continuação do clássico de William Friedkin.
Michael Caine faria outra adaptação cinematográfica de uma obra de Forsyth, em O Quarto Protocolo (1987).
Nas filmagens de O Dia do Chacal, Forsyth apresentou Edward Fox para um verdadeiro assassino de aluguel, que ele conheceu durante sua época de repórter durante os anos 1960 na África.
Quando Casson diz que o Chacal pode ter matado Lumumba no Congo, é uma referência também a outro trabalho de Forsyth, sua terceira novela, Cães de Guerra.
A trama foca soldados mercenários europeus que se envolvem em conflitos militares africanos durante os anos 1960 e 1970. Em 1980, saiu uma adaptação cinematográfica desse livro, com André Penvern, que interpretou um policial numa cena em O Dia do Chacal.
Quando o Chacal encontra o velho armeiro, Gozzi (Cyril Cusack), em Genova, que vai lhe preparar uma arma toda especial e manufaturada para cometer o assassinato, podemos ver uma foto de John F. Kennedy numa revista italiana, que reportava uma visita do então Presidente dos Estados Unidos pela Europa.
A cena acontece em 2 de agosto de 1963. Três meses depois, Kennedy seria assassinado em Dallas, nos EUA.
Algumas linhas de pesquisa e análise política indicam que ele foi assassinado por estrangeiros, pessoas sem registros nas documentações americanas.
Gozzi é mostrado com uma fita preta amarrada no braço, em referência ao luto da morte do Papa João XXIII, em decorrência de um câncer no estômago. Charles De Gaulle estava vivo quando Frederick Forsyth completou sua novela em 1970, mas morreu antes do livro ser publicado em 1971, vítima de um aneurisma cerebral.
Seu corpo encontra-se sepultado no cemitério paroquial de Colombey-les-Deux-Églises, Champanha-Ardenas, na França. De Gaulle é considerado como o líder mais influente da história da França moderna, e sua ideologia e seu estilo político — o gaullismo — ainda têm grande influência na vida política francesa atual.
Jean Martin, que interpretou Wolenski, também participou do filme A Batalha de Argel (1966), onde interpretou o coronel Mathieu, que tenta controlar uma rebelião que acontece na capital argelina.
A Batalha de Argel foi um dos filmes mais provocativos sobre a guerra entre a França e a Argélia, uma das grandes obras do cinema, e que foi proibida por anos na França, devido ao retrato fiel da violência e uso de tortura dos franceses no conflito.
A sequência inicial de O Dia do Chacal foi realmente baseada em uma tentativa de assassinato contra De Gaulle, em agosto de 1962, onde de fato dois guardas motociclistas perderam a vida.
O cabeça do ataque foi Jean Bastien-Thiry, um funcionário público francês insatisfeito em perder seu cargo na Argélia, em virtude da independência do país promovida por De Gaulle.
Fred Zinnerman morreu aos 89 anos, em 14 de março de 1997, na Inglaterra.
Frederick Forsyth nasceu na Inglaterra em 25 de agosto de 1938, e atualmente tem 83 anos.
Argélia e França, os contextos
A Argélia está localizada no norte da África, e é o maior território do continente africano. Na antiguidade, essas terras eram da Numídia, e o povo nativo eram os berberes, numa região que também teve fenícios, cartagineses e romanos.
No século VII, nos movimentos de expansionismo árabe do califado islâmico, a região é dominada por eles, bem como a Península Ibérica (onde estão Portugal e Espanha).
De 1516 a 1830, a região fez parte do Império Otomano, quando o nome de Argélia se estabeleceu. Em um conflito diplomático envolvendo cobrança de dívidas e uma agressão com um mata-moscas (!), a França e a Argélia entrariam em um confronto que duraria até 1870.
Os franceses invadiram o país em 1830 e instalaram postos militares avançados para a guerra. É quando é criada a Legião Estrangeira, formada um ano após a invasão, que popularizou o uso de quepes com panos laterais para se proteger do calor do sol do deserto.
Com o lema “marchar ou morrer“, eles foram fundamentais para dominar a Argélia, que viu 1/3 da população berbere morrer de fome, falta de água e escassez de alimentos.
A França considerava a Argélia uma “extensão territorial” e não mera colônia. Era, com efeito, parte do país francês.
A partir de 1848, os colonos começaram a chegar em grande quantidade. Eram chamados de “pied-noir“, “pés-pretos” em francês.
O governo “afrancesava” a população, por meio do sistema de ensino e de serviço militar (os argelinos lutaram pela França nas 2 Guerras Mundiais).
O Movimento de 1954 dá início às discussões de independência da Argélia, que logo escalonam perigosamente para o confronto armado pelas ruas do país.
Recém-saída da Indochina, a França não queria perder a Argélia, e uma nova guerra teve início, que durou até 1962.
Havia 3 lados: os argelinos pró-independência, formados em sua maioria por berberes muçulmanos; as tropas francesas, formadas por europeus, soldados da Legião Estrangeira e berberes muçulmanos contra a independência; e paramilitares contra a independência, que também atacavam o governo para enfraquecê-lo. É daqui que surgiu a OAS. A guerra foi infame, pois violenta e brutal, com uso de torturas de todos os lados. Cerca de 300 mil pessoas morreram nesse conflito.
Um referendo feito pelo general Charles De Gaulle em 1961 indicou que 75% da população do país era a favor da independência da Argélia.
E é o que aconteceu, em 15 de julho de 1962. A OAS recusa o resultado do referendo e tenta um golpe de estado, sem sucesso.
É neste contexto de “vingança” que a OAS contrata o Chacal no livro/filme.
Grande parte dos “problemas” atuais da França vem desse conflito. Cerca de 1 milhão de “pied-noir” e 2 milhões de berberes foram para a França depois da independência. Hoje, eles representam 6 milhões de franceses, com 10% da população com origem argelina.
Desses, 7% são muçulmanos. O caldeirão multiétnico e religioso ainda ferve perigosamente no país da “liberté, egalite, frartenite“.
/ REMAKE. O Dia do Chacal teve um remake em 1997, bastante criticado pelas enormes liberdades criativas tomadas, dirigida por Michael Caton-Jonese e estrelada por Bruce Willis e Richard Gere. A trama mistura o FBI e o MDB, as polícias federais americanas e russas, respectivamente, contra um mafioso russo, que contrata o Chacal (Bruce Willis) para assassinar a Primeira Dama dos Estados Unidos, ou assim parece.
A obra não teve aprovação de Frederick Forsyth e Fred Zinnemann, que lutaram até o último momento para que o filme nunca tivesse a chance de usar o mesmo título do original. Nem mesmo referência ao livro foi permitida. Ele ficou então com o título O Chacal. Willis e Gere nunca mais quiseram trabalhar juntos depois desse filme. Richard foi um dos primeiros escolhidos para fazer o Duro de Matar (1988), mas declinou do convite, inclusive do próprio Chacal, preferindo ser o herói da trama.
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