DAFT PUNK | A dupla francesa de DJs que mudou a música

O Daft Punk acabou em fevereiro de 2021, quando Guy-Manuel de Homem-Christo e Thomas Bangalter anunciaram o fim das atividades do duo eletrônico que mudou a música de um jeito nunca visto até então na indústria.

Uma obra deles em especial, Discovery (2001), foi um mix sinergético de animação e música, imagem e som, que extrapolou os limites da cultura pop, ao aliar os populares animes com a ordem linear de um álbum conceitual.

Os segredos de Discovery, aliás, ganham um livro agora, “Daft Punk Discovery’s”, que está em pré-venda aqui, e que promete revelar mais sobre seus bastidores.

É preciso destacar também o álbum Random Access Memories (2013), abrilhantado por um batalhão de superstars da música, e que foi um dos melhores discos da década de 2010 — e com efeito, até hoje.

Daft Punk
Contracapa de Homework (1997), o primeiro disco do Daft Punk, aqui com uma arte de contracapa em quem Guy-Manuel de Homem-Christo e Thomas Bangalter aparecem ainda sem seus capacetes

Amigos desde a infância, Guy-Manuel e Thomas viraram DJs na cena de discotecagem francesa no começo da década de 90.

Gostavam de bandas de synthpop como o Depeche Mode e New Order, e criaram o Daft Punk em 1993, em Paris, com o uso de sintetizadores como marca registrada.

Seu house com synthpop, disco, rock e techno ganharam público e reconhecimento, e o Daft Punk seguiu em uma trajetória que acumulou sucessos em várias pistas de danças, discos de outros artistas e aplausos da crítica em publicações especializadas do jornalismo musical ao redor do mundo.

Os dois amigos sempre extrapolaram o terreno em que atuavam, ao fazer parcerias com grandes nomes da indústria musical, e deixaram marcas que dificilmente serão esquecidas tão cedo.

A discografia do Daft Punk

O Daft Punk gravou quatro álbuns — receberam 13 indicações para o Grammy (o “Oscar” da música nos Estados Unidos) e ganharam 7 –, com vários hits explosivos em cada um deles

Da Funk e Around the World, em homework (1997)

One More Time, em Discovery (2001)

Technologic e Robot Rock, em Human After All (2005)

Random Access Memories (2013), que tem tantos hits que praticamente todo o disco foi sucesso — a que mais tocou sem parar por todo lugar foi Get Lucky

Outros discos lançados pelo Daft Punk incluem gravações ao vivo e remixes:

Alive 1997 (2001), um álbum de um show ao vivo do Daft Punk

Daft Club (2003), álbum de remix

Human After All (2006), outro álbum de remix

Musique Vol. 1 1993-2005 (2006), a primeira coletânea oficial do Daft Punk

Alive 2007 (2007), outro álbum ao vivo

Tron: O Legado (2010), trilha sonora para o filme da Disney, continuação do clássico Tron – Uma Odisséia Eletrônica (1982)

Tron: O Legado (2011), álbum de remix da trilha sonora

Com todos esses trabalhos, o Daft Punk foi responsável por popularizar a música eletrônica e embaralhar os estilos das raves com seu estilo único.

Essa mão fina para a musicalidade, e pesada de obra por trás, nunca quis parecer humana, pois Guy-Manoel e Thomas já usavam seus característicos capacetes e nunca revelaram as reais identidades, o que entregava o símbolo de afastamento desejado por eles.

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Isso foi ampliado nos anos seguintes do lançamento de Discovery, e pela relação distante da mídia, com raras entrevistas para a imprensa ou mesmo aparições em público.

Talvez seja essa a razão de em quase 30 anos de existência, o Daft Punk nunca ter feito uma grande turnê mundial. Mesmo as apresentações ao vivo, foram poucas.

O audiovisual do Daft Punk

Guy-Manuel de Homem-Christo e Thomas Bangalter sempre procuraram uma diversificação para operar o mood visual de suas músicas.

Nascidos na ascensão videoclíptica que a MTV provocava na indústria musical, eles já miravam em profissionais que mais tarde seriam consagrados do mercado. Para o primeiro álbum, Homework, de 1997, nomes como Spike Jonze e Michel Gondry foram chamados.

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Jonze já tinha uma longa carreira como diretor de videoclipes. Antes de Da Funk, fez 100% (1992), do Sonic Youth, Hang On (1993), do Teenage Fanclub, Buddy Holly (1994), do Weezer, Sabotage (1994), dos Beastie Boys, Divine Hammer (1994), do The Breeders, Feel the Pain (1994), do Dinosaur Jr., Car Song (2005), do Elastica, e Crush with Eyeliner (1995), do R.E.M.

No mesmo ano de Da Funk do Daft Punk, também dirigiu Electrobank (1997), do The Chemical Brothers, e muitos outros depois, como Praise You (1998), do Fatboy Slim, Island in the Sun (2000), do Weezer, It’s In Our Hands (2002), da Björk e Best of You (2005), do Foo Fighters.

Spike também foi criador, produtor executivo da série bosta Jackass (2000), dirigiu os filmes Quero ser John Malkovich (1999), Três Reis (1999), Adaptação (2002) e foi roteirista e produtor de Her (2013).

Michael Gondry dirigiu clipes como Like A Rolling Stone (1995), do Rolling Stones, e Sugar Water (1995), do Cibo Matto, antes de fazer Around The World, talvez o clipe e música mais conhecidos do Daft Punk nos anos 90.

No mesmo ano, dirigiu Feel It, da Neneh Cherry, Everlong, do Foo Fighters, e nos anos seguintes fez Music Sounds Better With You, (1998), do Stardust, Knives Out (2001), do Radiohead, Fell in Love with a Girl (2002), do The White Stripes e Dance Tonight (2007), do Paul McCartney.

Michael Gondry ficou famoso no cinema quando dirigiu Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças (2005).

Para os clipes de Discovery, o ode aos animes do Daft Punk, o duo trouxe Kazuhisa Takenouchi, diretor de episódios de alguns ícones da indústria da animação japonesa, como Dragon Ball e Sailor Moon.

O character design dos clipes de Discovery foram de Leiji Matsumoto, uma das maiores lendas da cultura pop, autor de mangás e animes

Nos cinemas e mercado de vídeo (quando ainda eram viáveis VHS e DVD), o Daft Punk anota três trabalhos.

O primeiro foi em 1999, com D.A.F.T. – A Story About Dogs, Androids, Firemen and Tomatoes, uma coleção de videoclipes, comentários em áudio, e filmagens do “making of” de algumas obras da dupla.

Em 2003, foi lançado o longa-metragem musical Interstella 5555: The 5tory of the 5ecret 5tar 5ystem, a realização visual final do disco Discovery.

O Daft Punk faz uma participação especial na obra Discovery

Em 2007, o Daft Punk lançou Electroma, filme dirigido pelos próprios Guy-Manuel de Homem-Christo e Thomas Bangalter, e que estreou no Festival de Cannes na época. O enredo desenrola através da jornada de dois robôs querendo ser humanos.

A trilha do filme não é executada pelo Daft Punk, ao contrário das duas obras anteriores.

A direção e o roteiro também contou com o gerente artístico do Daft Punk, Paul Hahn, e o colaborador Cédric Hervet.

Algumas cenas de Electroma

Na cultura pop dos anos 2000

Lançado em 2001, o álbum Discovery foi um projeto que envolveu clipes animados em design anime, todos sob criação de Leiji Matsumoto, uma das maiores lendas da cultura pop, autor de mangás e animes, como Uchu Senkan Yamato (conhecido no Brasil como Patrulha Estelar), Captain Harlock e Galaxy Express 999.

A animação teve colaboração da Toei Animation (que fez as animações de Cavaleiros do Zodíaco e One Piece) e também teve a direção Kazuhisa Takenouchi.

Depois que foram lançados todos os clipes das 14 músicas, em 2003 o filme Interstella 5555 os uniu em uma narrativa única e inédita no mercado até então.

Em 2010, a Disney lançou o filme Tron: O Legado, que conta com a trilha sonora assinada pelo Daft Punk — eles inclusive aparecem nas telonas — , e a trama conta as desventuras de pessoas que conseguem entrar em um mundo digital com a ajuda de Alan Bradley, o personagem Tron que dá título ao longa, em sequencias gráficas alucinantes com corridas e perseguições de motos de luz (lightcycles) e lutas de gladiadores com discos em arenas binárias de bits e bytes.

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O Daft Punk em Tron – O Legado

O filme é uma continuação de Tron: Uma Odisseia Eletrônica (1982), um clássico futurista sci-fi dos cinemas, e que, ao seu modo, com a tecnologia da época, também foi inovador em efeitos gráficos.

Foi o primeiro longa-metragem a usar computação gráfica em larga escala, e seus efeitos eram tão inéditos que a obra chegou a ser desqualificada do prêmio de melhores efeitos especiais na cerimônia do Oscar (!), pois foi considerada uma forma “ilegal” de se fazer efeitos (!!).

Random Access Memories e os anos 2010

A última grande empreitada do Daft Punk aconteceu nas paradas em 2013, quando Random Access Memories — que recebeu três prêmios do Grammy daquele ano, incluindo o desejado Álbum do Ano –, foi lançado e emplacou o sucesso avassalador Get Lucky, que tocava em todo bar, balada, barzinho e lugar pretensamente cool.

Guy-Manoel e Thomas contrataram corais, seções de cordas, trompetistas e tocadores de pedal steel para o álbum, além de trabalhos extras de músicos que haviam trabalhado em Thriller e Off the Wall — simplesmente os maiores discos do Michael Jackson –, para que aprimorassem os arranjos.

Na canção mais tocada desse ano, Get Lucky, a voz é do músico Pharrel Williams, um dos nomes mais famosos do soul, hip hop e música de R&B nos Estados Unidos.

A dupla francesa também chamou Panda Bear (o músico experimental Noah Lennox) e Julian Casablancas, o eterno vocalista do The Strokes, uma das primeiras bandas indie rock nova-iorquina do novo século.

E o disco tem três faixas do gigante Nile Rodgers, músico de artistas como Aretha Franklin, Ben E. King, Nancy Wilson e Parliament-Funkadelic, e produtor de discos do David Bowie, Madonna e Diana Ross.

Ele também formou o Chic, junto com Bernard Edwards, e fizeram vários hits como Le Freak e Good Times.

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Pharrel Williams, o Daft Punk tampando a cara, e o Kayne West

Ainda em 2013, o Daft Punk assinou a co-produção de Yeezus, disco do polêmico e maluco rapper norte-americano Kanye West.

O cantor canadense Abel Makkonen Tesfaye, mais conhecido como The Weeknd, fez em 2016 o disco StarBoy, cuja faixa-título e a canção I Feel It Coming foram enorme sucesso, e ela é fruto de uma parceria com o Daft Punk.

O último lançamento oficial do Daft Punk aconteceu ainda em 2020, e foi uma nova edição da trilha de Tron: O Legado, com 9 músicas a mais.

Epílogo

A notícia da dissolução da dupla em fevereiro de 2021 pegou todo mundo de surpresa, e o próprio anúncio do fim do Daft Punk foi enigmático como a dupla.

No canal oficial deles no YouTube, foi publicado o vídeo Epilogue (Epílogo), que mostra os dois caminhando por um deserto de sal na Califórnia, nos Estados Unidos, com suas tradicionais roupas futuristas e capacetes, ao som de uma versão a capella de Touch, umas das faixas de Random Access Memories.

O vídeo é um trecho de Electroma, quando o personagem de Guy-Manoel explode o Thomas ao fim do vídeo, mas não consegue fazer o mesmo depois.

Então ele se incendeia e desaparece em chamas na escuridão da noite.

Ainda não se sabe qual o destino de uma trilha que faziam para Occhiali Neri, novo filme de Dario Argento, um dos mestres do cinema italiano de terror.

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Alguns dos artistas preferidos da dupla são Elton John, MC5, The Rolling Stones, The Beach Boys e The Stooges.

O pai de Thomas, Daniel Vangarde, após se aposentar, decidiu vir morar no Brasil – em uma cidade de praia isolada. Ele era produtor musical e compositor, que atuou com nomes como Gibson Brothers e Ottawan. Guy-Manuel não tinha músicos na família, porém, é filho de publicitários – o que explica o tino do artista para criar a narrativa do Daft Punk.

Ele também é bisneto do escritor português Homem Cristo Filho – intelectual que apoiava correntes nacionalistas.

Como compositores, o Daft Punk foi o responsável por toda a trilha sonora de Tron – O Legado, mas a dupla tem músicas suas em mais de 40 filmes, vídeos e outras obras, de acordo com dados do IMDB – Internet Movie Database.

O primeiro é o jogo de corrida Wipeout XL, de 1998, (também chamado de Wipeout 2097), a sequencia do lendário game criado pela softhouse Psygnosis para o primeiro line-up do console de estreia da Sony, um tal de Playstation, em 1995.

Outras obras incluem músicas em filmes como O Santo (1997), O Beijo do Dragão (2001) e Homem de Ferro 2 (2010).

Capa japonesa do jogo Wipeout XL, para Sega Saturn

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