SOVIET STRIKE | Um Apache contra a KGB e o Iraque

Soviet Strike é um game de tiro de helicóptero desenvolvido e publicado pela Electronic Arts – EA para os consoles de 32-bits PlayStation (Sony) e Sega Saturn (Sega).

Lançados em 1996 e 1997 respectivamente, o pano de fundo desse game de ação é o cenário geopolítico que resultou da desintegração da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS, e vídeos com atores reais, na modinha do momento dos videogames da época, o Full Motion VideoFMV, intercalados na jogabilidade e narrativa, e que ajudam para uma maior imersão na proposta.

Soviet Strike

Soviet Strike
Soviet Strike é um videogame onde controlamos um helicóptero Apache que atira e resgata pessoas em cenários 3D
Soviet Strike
Soviet Strike faz uso de vários Full Motion Video, que se tornaram uma marca em videogames de 32-bits por um tempo
Soviet Strike
Review de revista americana especializada em videogames sobre Soviet Strike. O design noventista aqui vale pras duas

O jogo é parte de uma franquia da EA, uma das maiores softhouses do mercado, e que começou em Desert Strike: Return to the Gulf (1992), lançado para o console de 16-bits Mega Drive, da Sega.

Com um nome inspirado na Operação Tempestade no Deserto, nome dado para as ações militares dos Estados Unidos na Guerra do Golfo contra o Iraque, a política sempre esteve atrelada na série Strike.

Imagem militar da Guerra do Golfo

Os EUA se moveram da Guerra Fria contra a URSS para os conflitos no Oriente Médio na década de 90, e essa máquina de guerra instalada serviu muito para a indústria cultural como parte de propaganda imperialista no entretenimento em geral: cinema, séries, HQs, programas de TV, mídia e videogames.

O jogo de Soviet Strike acontece em localidades do Leste Europeu como a Rússia e o Mar Cáspio, onde controlamos um piloto que conduz um helicóptero militar AH-64 Apache.

Ele deve enfrentar sozinho as forças militares do ex-General da KGB Uri “Shadowman” (“Homem das Sombras“) Vatsiznov, um comunista renegado, bem como as tropas armadas de um ditador de um país análogo ao Iraque.

Soviet Strike
O grande vilão do jogo é um ex-coronel da KGB, Uri “Shadowman” Vatsiznov

Como o quinto jogo da série Strike e o primeiro em 3D, Soviet Strike faz uma transição muito boa para o mundo dos 32-bits, que abria uma leque de possibilidades infinitas nos videogames na época, deixando para sempre o mood 2D para trás — mas vale ressaltar que a série Strike era um game de ação de visão isométrica.

Soviet Strike

O uso de política não era novidade no mundo dos games em 1996, e muitos produtos culturais americanos ainda miravam os soviéticos como “inimigos”, mesmo com eles fora de jogada.

O mais novo 007 da época, GoldenEye, lançado nos cinemas em 1995, com Pierce Brosnan como James Bond, ainda tinha os russos como antagonistas. Um ano depois de Soviet Strike, em 1997, o game de tiro do filme, 007 GoldenEye, exclusivo para o Nintendo 64, seria um dos melhores games já criados.

Soviet Strike

O jogo Soviet Strike faz uso de uma série de tapes de áudio em contextos políticos para dar um toque cinematográfico ao game, como o Presidente dos Estados Unidos Bill Clinton comentando como a força militar STRIKE (por isso o nome dos games na série) interviu em uma guerra civil no México em 1982, o que impediu o país de secretamente se tornar um país do Pacto de Varsóvia.

Arte promocional de Soviet Strike

Tal pacto era uma aliança militar assinada em Varsóvia, Polônia, entre a URSS e sete outras repúblicas socialistas do Bloco Oriental da Europa Central e Oriental, em maio de 1955, durante a Guerra Fria.

O Pacto foi criado em reação à integração da Alemanha Ocidental na Organização do Tratado do Atlântico Norte – OTAN, um ano antes.

Como todos os jogos anteriores, Soviet Strike é um mix de tiro com estratégia de uso inteligente de uso de munições e combustível para se completar as missões.

A inserção de gráficos 3D em cima do antigo visual isométrico enriqueceu o jogo, bem como o uso criativo de fotos reais de satélites para criar cenários mais complexos.

Soviet Strike

Os cortes rápidos de videoclipe nos vídeos, o grafismo de revistas noventistas de skate, rock e surf na interface gráfica e o uso de atores reais nos vídeos de FMV dão um ar de filme MTV para o videogame. A maioria dos briefings antes de cada missão sempre parecerão com isso.

Soviet Strike

Soviet Strike

Soviet Strike

Soviet Strike (1996)

O jogo de Soviet Strike consiste em matar inimigos em estruturas e edificações em ruínas e chamas, campos de treinamento, instalações militares e navios.

É preciso também resgatar diversos prisioneiros, incluindo o Presidente da Rússia Boris Yeltisin na última missão.

Como sempre, as armas, combustível e a “armadura” do helicóptero não são infinitas, então o jogador deve procurar “recargas” constantes.

Soviet Strike

O Apache está armado com metralhadora e mísseis Hydra e Hellfire, e é com isso que você deve superar cinco fases, dividida em 41 missões, em quase 4 horas de jogatina se você assistir a todos os briefings das missões, em áudios e vídeos.

A mal-fadada introdução de personagens a pé vista em Urban Strike, o jogo anterior de Soviet, foi abandonada, e aqui o jogador controla apenas o helicóptero Apache mesmo.

Na versão lançada para Sega Saturn depois do PlayStation, houve correção de bugs, novas armas secretas, novos efeitos sonoros e outras adições.

Soviet Strike
Capa de Soviet Strike para Sega Saturn
Contracapa do jogo

O “protagonista” é o piloto do Apache, membro da STRIKE, uma força-tarefa americana militar designada para ações preventivas para evitar “guerras que não podem acontecer”.

O Apache de Soviet Strike

O comandante da STRIKE é o General Earle, mas o piloto nunca é identificado. Outros personagens que complementam a trama são a repórter Andrea Grey (na verdade uma agente hacker disfarçada), os pilotos Nick Arnold, da STRIKE, o guerrilheiro Amad e o russo Ivan Uralia, além do grande antagonista, o Coronel “Shadowman“. Também temos Sadissa Savak, o ditador do país fictício Ireki (clara alusão ao Iraque) e um antigo cientista soviético, Dr. Grymyenko Ukrainian.

Sadissa Savak, o ditador do Ireki em Soviet Strike

Quem interpreta Nick é o ator Al Sapienza, o Mikey Palmice de Sopranos (1999-2007).

Al Sapienza como Nick Arnold

O agente Ivan é o ator ucraniano Alex Veadov, que já fez filmes como Força Aérea Um, lançado no mesmo ano do videogame, Ato de Coragem (2002) e Os Donos da Noite (2007). Um de seus trabalhos mais recentes foram os seriados Agente Carter (2015), da Marvel, e MacGyver (2020).

O plot principal de Soviet Strike é que Uri “Shadowman” Vatsiznov enxergou o vácuo de poder que o fim da União Soviética deixou no Leste Europeu, e decide explorar isso para seus próprios fins.

Na primeira missão do game, que acontece na Crimeia, devemos resgatar o piloto Arnold.

Já na segunda fase estamos no Mar de Azov (nome infame agora na guerra Rússia x Ucrânia), e depois seguimos para enfrentar uma frota inimiga no Mar Negro, além de ter que resgatar Amad.

O próximo estágio é enfrentar o exército do ditador Savak no Cáucaso (em teoria, estamos aqui ao norte da batalha final do game anterior, Desert Strike). O jogador e Amad, mais a milícia armada a qual o guerrilheiro pertence, têm que impedir os inimigos de botar as mãos em um antigo arsenal soviético.

Isso ainda respinga até numa missão na Transilvânia (!), onde devemos resgatar Nick e acabar com o dr. Grymyenko. Como um bônus divertido, é possível explorar o cenário e encontrar um castelo, e destruí-lo, para infelicidade e raiva de um certo Conde ali…

O Apache de Soviet Strike da EA faz em minutos o que os Belmont levam um jogo inteiro na Konami

Militares renegados e mafiosos russos tentam destruir as forças russas numa explosão planejada no Kremlin, o centro do governo, e é dever do jogador impedir que isso aconteça.

Soviet Strike
O Kremlin em Soviet Strike

EA, 3DO e Strike

Os jogos do 3DO

O criador de Soviet Strike foi Mike Posehn, chefe de divisão de programação do game. Desde o começo do projeto de um novo game da série Strike para a EA, ele e sua equipe sentiram que iriam precisar da ajuda de um console mais poderoso do que um sistema 16-bits poderia oferecer.

E num primeiro momento, eles decidiram pelo console 3DO.

A EA foi fundada em 1982, e foi responsável por grandes franquias dos videogames, como FIFA, Need for Speed, Battlefield, Command & Conquer, Dead Space e Mass Effect, assim como jogos baseados baseados em franquias famosas da mídia, como Harry Potter, O Senhor do Anéis, Star Wars e Star Trek.

Em 1991, o então presidente da softhouse, Trip Hawkins, surgiu com a ideia de criar um console que fosse uma verdadeira central multimídia: além de jogar games, a ideia era escutar CDs de músicas, assistir filmes em formato VCD e e até visualizar suas fotos.

Tudo que o 3DO fazia

Ele procurou empresas parceiras interessadas e assim nascia o 3DO Interactive Multiplayer, um console de especificações técnicas criadas pela empresa 3DO Company, que era uma sociedade entre 7 outras diferentes. Além da EA, embarcaram a Panasonic, Sanyo e LG Electronics e outras.

O console abriu a 5ª geração de videogames no mercado, e foi o primeiro console 32-bits da história.

Em seu início de carreira, herdou várias adaptações de games famosos de PC. O 3DO tem um dos melhores Street Fighter em versão caseira, o incrível Super Street Fighter Turbo II, que tem as melhores músicas até hoje da série.

O videogame ainda ficou marcado por uma série de jogos soft porn americanos, claro, feitos em FMV.

O 3DO foi lançado em setembro de 1993 nos EUA, então Posehn estabeleceu o console para fazer o jogo que viria a ser o Soviet Strike, já que a época de produção de Sovite Strike foi o início de 1994.

Mas o 3DO era caro (custava inacreditáveis U$ 700,00 em 1993!), o tempo de carregamento era demorado, e muitas softhouses iniciantes produziram jogos horríveis para o console. Fora que os games vindos dos PC eram piores no videogame desenvolvido.

O preço irreal do videogame em 1993

E uma série de entraves burocráticos entre as 7 empresas atrapalhavam o desempenho do modelo de negócios (cada uma fazia do seu jeito o console).

Quando o novato PlayStation da Sony foi lançado, o 3DO foi estraçalhado sem piedade.

Logo, Mike e sua equipe mudaram o jogo para a plataforma da Sony.

Artes promocionais da Sony para seu videogame de estreia, o PlayStation
Soviet Strike
Arte promocional da EA para Soviet Strike
Soviet Strike para PlayStation

Mas algo ainda restou da encarnação anterior, já que a engine 3D de Soviet Strike foi a mesma criada pela equipe do jogo de corrida de moto Road Rash, um dos melhores games do console, dono de uma trilha sonora espetacular: Soundgarden, Swervedriver, Monster Magnet, Therapy, Paw e outras, todas elas bandas da gravadora AM&M, de Seattle.

Capa do 3DO para Road Rash, destacando a trilha sonora com Soundgarden e outras bandas

Soviet Strike foi relançado em 2009 e 2010 na PSN, a rede de downloads da Sony para seus videogames da época, os consoles PlayStation 3 e os portáteis PSP e PS Vita.

Strike na política

Algumas situações políticas bizarras desse jogo valem a citação aqui.

Por exemplo, o modo bizarro com o qual Boris Yeltsin é retratado, como um motorista bêbado, dirigindo muito mal, batendo em hidrantes e (quase) em pedestres (!), além de ser mostrado um glutão, quando para do nada em um restaurante fast-food (!!), até ser “salvo” por um Bill Clinton sóbrio (!!!).

O mais “grave” no entanto é quando o General Earle dá a entender em um comentário que o Presidente John Kennedy (1961-1963) foi assassinado pelo complexo industrial-militar. Kennedy foi quem sucedeu Dwight D. Eisenhower na Presidência dos EUA.

O termo complexo industrial-militar foi utilizado pelo presidente Eisenhower (1953-1961) para descrever o intricado processo pelo qual os EUA cada vez mais produziam armas e tecnologias bélicas.

Einsehower e um dos maiores discursos políticos da história, onde cunhou o termo complexo industrial militar

Essa força ainda exerce influência no desenho da política externa norte-americana e geopolítica mundial, e sua natureza híbrida é o que movimenta as peças desse jogo.

Esse relacionamento político entre as forças armadas de um governo nacional e a indústria tem como objetivo obter para o setor privado a aprovação política para pesquisa, desenvolvimento e produção, assim como o apoio para treinos militares, armas, equipamentos e instalações.

Essa conjunção de um imenso establishment militar e uma grande indústria de armas é nova na experiência estadunidense. A influência total – econômica, política e, até mesmo, espiritual – é sentida em cada cidade, em cada legislativo, em cada gabinete do Governo Federal.”

Com o complexo industrial-militar, todo avanço técnico radicalmente novo produzido pelo trabalho de Pesquisa e Desenvolvimento da sociedade ou é gestado pelo próprio militarismo ou é imediatamente empregado em fins militares no capitalismo.

Na sinergia macabra em que isso opera, se desenvolvem as forças produtivas em uma mão, enquanto outra avança com a barbárie em forma de dominação.

O Presidente admitiu que a Guerra Fria deixava clara a “imperativa necessidade de seu desenvolvimento (militar)”, mas se mostrou preocupado sobre a “injustificada influência que o complexo militar-industrial estava crescentemente conquistando.” Em especial, pediu à nação a se precaver contra “o perigo que esta política pública poderia tornar-se prisioneira de uma elite científico-tecnológica.”

Parte da transcrição do discurso em inglês

É importante considerar, no entanto, que o governo de Eisenhower ampliou o arsenal atômico, ao mesmo tempo em que defendia a redução dos efetivos militares regulares. Eisenhower governou o país no auge da Guerra Fria, e os americanos viviam o terror de serem mortos na fogueira nuclear de mil bombas atômicas.

Eisenhower era um General Cinco Estrelas do Exército Americano, sendo o Comandante Supremo das Forças Aliadas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Foi o responsável pela dessegregação racial nas Forças Armadas e pela Lei dos Direitos Civis de 1957. Mais do que ninguém, tinha amplo conhecimento do setor militar nos EUA.

Um exemplo do complexo industrial-militar foi a Guerra do Golfo, que durou poucos meses (final dos anos 90 ao começo de 1991), mas que marcaria a década noventista para sempre.

O começa dos anos 90 também veria a dissolução oficial da URSS, que já estava em derrame cerebral anos antes, com feridas letais como o Acidente Nuclear de Chernobyl (1986) e a Queda do Muro de Berlim (1989).

Mapa da URSS em 1984

No começo dos anos 1990, o mundo estava prestes a ver o fim da Guerra Fria, que dividia o mundo desde o término da Segunda Guerra Mundial (1945) com uma Cortina de Ferro entre o Oeste Capitalista e o Leste Comunista, com EUA e URSS como seus protagonistas.

Mas nem o fim da União Soviética representou o fim da ameaça imaginária do perigo comunista, e nem os EUA iriam parar sua colossal máquina do complexo industrial-militar.

É preciso ter em mente também que, desde o fim da Primeira Guerra Mundial, as potências ocidentais têm redesenhado o Oriente Médio de acordo com seus interesses, e que isso é em grande parte origem de conflitos que regem a região até hoje.

O comandante militar Saddam Hussein tinha dado um Golpe Militar no Iraque em 1979, e desde então controlava o país. Ele queria tornar o Iraque uma potência, tanto histórica quanto moderna. Investiu pesado na defesa militar e num resgate arqueológico histórico, tentando amarrar o Iraque à antiga Babilônia.

Saddam Hussein

Ainda em 1979, ele levou o país à guerra contra o Irã, logo após a Revolução Islâmica no país (1979), por temor da influência de revoluções respingar no Iraque (na verdade, Saddam queria anexar territórios considerados históricos e estratégicos, como o Cuzistão — e sim, esse nome é sério).

O conflito durou 8 anos, e mesmo com o Iraque municiado pelos EUA (é sério) e outros países europeus e do Oriente Médio, o Iraque saiu falido e parcialmente destruído, sem conseguir dobrar o Irã.

Em busca de novos recursos e expansões, Hussein invadiu o Kuwait em agosto de 1990, numa pretensa retomada de antigo territórios históricos. Ele pensou que o Ocidente não se envolveria, mas o Conselho da Segurança da ONU quis a retirada.

Os EUA fez uma coalizão com outros países do Oriente Médio, como a Síria e a Arábia Saudita, maior aliado americano da região e fornecedor de petróleo do Tio Sam, e intercedeu a favor do pequeno Kuwait.

Soldados americanos na Guerra do Golfo

Foram 42 dias de ataques aéreos das forças militares americanas nos conflitos, naquele que foi o primeiro conflito militar televisionado da história.

Câmeras da CNN mostravam os ataques de mísseis e explosões, e, vale lembrar: dezenas de milhares de civis iraquianos foram massacrados nisso tudo.

Como não era interesses dos americanos e aliados realmente acabarem com Saddam, ele ficou no poder até 2006, quando foi derrubado, condenado e enforcado. Ficou 34 anos no poder.

Na indústria dos videogames, em 1991 e 1992, a engenharia técnica ainda trabalhava com sistemas de 16-bits nos consoles caseiros, e o uso de temas políticos em jogos ainda não era comum.

No andamento do desenvolvimento do primeiro jogo de helicóptero, o programador-chefe Mike Posehn teve a ajuda de John Manley, responsável por criar um enredo para o jogo.

O conceito inicial do game era o meio da guerra civil pela qual passava o Líbano (1975-1990), e o título inicial seria Beirut Breakout.

O conflito no Líbano tinha muitos motivos, e entre os principais estavam as mudanças na composição demográfica libanesa, o afluxo de refugiados muçulmanos palestinos entre 1948 e 1982, os ataques muçulmanos contra cristãos maronitas, bem como o envolvimento da Síria, de Israel e da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), com diferentes interesses nas partes.

Vale citar que a Líbia atravessou um período grotesco de mais de quatro décadas sob comando de Muammar Muhammad Abu Minyar al-Gaddafi, vulgarmente conhecido como Coronel Gaddafi ou Kadafi.

Kadafi

Comandante de um governo marcado pela brutalidade, violação de direitos humanos, atrocidades e carnificina contra opositores e associação ao terrorismo global, Kadafi estava no poder desde 1969, quando liderou o movimento militar que derrubou a monarquia no país.

Em abril de 1986, os EUA bombardearam a cidade libanesa Trípoli, em retaliação a uma explosão em uma boate da Alemanha Ocidental, atribuída a terroristas financiados pelo ditador. A filha de Kadafi foi morta nos ataques, e ele revidou em 1988.

O avião Boeing 747-121 partira do Aeroporto de Londres-Heathrow em Londres com destino a Nova Iorque, e explodiu no ar logo acima da cidade escocesa de Lockerbie, matando 270 pessoas (259 no avião e 11 na terra) de 21 nacionalidades diferentes. Deste total, 189 vítimas eram cidadãos americanos.

No dia 20 de outubro de 2011, Kadafi foi morto de maneira brutal, retirado de um esgoto onde estava escondido, sodomizado com uma faca no traseiro (lá mesmo) e espancado por uma turba até ficar destroçado, numa explosão de ódio só comparável à forma como ele próprio governara a Líbia.

Desde então, a Líbia se tornou um campo de batalha para uma guerra por procuração envolvendo Turquia, Rússia, Egito, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, entre outros. O país está dividido entre o Governo de Acordo Nacional, em Trípoli, liderado pelo premiê Fayez al-Sarraj, e o autoproclamado Exército Nacional Líbio, liderado pelo general Khalifa Haftar, em Tobruk.

Com a Guerra do Golfo tomando conta da mídia, Manley alterou a história do game, e com o avanço da nova física de combate que Posehn criou na ação de helicóptero, a EA teve enfim o jogo Desert Strike: Return to the Gulf (1992).

Os helicópteros AH-64A Apache foram bastante usados na guerra real que acontecia, e Posehn tentou deixar ao máximo o helicóptero do game parecido com um desses.

A trama do game mostra o General Kilbaba, um ditador de um país fictício no Golfo Pérsico, dono de uma poderosa força militar e na iminência de conseguir armas nucelares.

Os EUA não podem ficar parados, e mandam um piloto para acabar com os planos do tirano. E é esse o papel do jogador. Não sem surpresas, o General Kilbaba lembra muito Kadafi.

General Kilbaba, o inimigo a ser vencido em Desert Strike. Ele tem um comandado chamado…Muammar

O game fez um enorme sucesso com sua proposta inovadora, e a EA passou o game para outras plataformas.

Depois de ser lançado para o Mega Drive, Desert Strike: Return to the Gulf recebeu adaptações para o Master System (console de 8-bits da Sega), o Game Gear (portátil da empresa), o Super Nintendo, o portátil Game Boy (também da Nintendo), além dos PCs Amiga, DOS e Lynx.

Capa do game para os computadores Amiga

Anos depois, foi lançada uma versão para o Game Boy Advanced (o portátil 16-bits da Nintendo) e até uma versão para o celular Blackberry.

Não demorou nem um ano e a softhouse já tinha uma continuação do game.

Jungle Strike (1993) acontece logo depois da aventura anterior, com Ibn Kilbaba, filho do ditador morto, buscando vingança contra os americanos. Ele contrata os serviços de Carlos Ortega, um perigoso traficante da América do Sul, e juntos tentam destruir os EUA.

Jungle Strike para o Mega Drive

Antes disso, o jogador deve ir para as perigosas selvas indicada no título do game e impedir que eles tentem se vingar.

Ele saiu para Mega Drive, Game Gear, SNES, Game Boy, assim como para os computadores Amiga, Amiga CD32, DOS (e também saiu para o celular Blackberry anos depois).

A EA estava muito satisfeita com a franquia. Um ano depois já lançou Urban Strike (1994), o primeiro game da série a permitir que o jogador caminhe pelo cenário em algumas fases.

Urban Strike para o SNES

Na trama apresentada, o inimigo a ser vencido é o lunático ricaço H. R. Malon, que comanda uma perigosa seita que pretende apressar o fim do mundo. O cenário dessa vez é todo urbano, uma vez que estamos nas cidades que Malon tem suas bases secretas.

Há um acontecimento salutar em Urban Strike. O jogo se passa em 2001, e em uma das missões, no dia 11/11, temos que resgatar civis que estão presos no World Trade Center, que foi atacado por terroristas com uma arma laser.

Apesar da coincidência assustadora com os ataques reais de 11 de Setembro, executados pela rede terrorista Al Qaeda, liderados por Osama Bin Laden (que era saudita), o fato faz referência na verdade ao ataque às torres que aconteceu em 1993, quando um carro-bomba foi detonado no estacionamento do prédio.

Esse game saiu apenas para o Mega Drive, SNES, Game Boy e Game Gear.

Em 1995 não tivemos games da série Strike, e Soviet Strike ocupou o ano de 1996.

Soviet Strike

Foi a mesma equipe que trabalhou em Soviet Strike que fez Nuclear Strike (1997), que dessa vez nos leva para a Ásia, com uma missão de caça a um espião, o Coronel LeMonde, que havia roubado uma ogiva nuclear.

Nuclear Strike para o PlayStation

Ele aterroriza o Leste Asiático e temos como cenários o Mar do Sul da China e a Coreia do Norte, onde enfrentamos o exército de Kym Zung-Lee (uma alusão à Kim Jong Il, o ditador da Coréia do Norte, de 1991 a 2011), até a batalha final na Sibéria (pra variar, na Rússia).

Nuclear Strike foi o último jogo da série Strike. E, pela primeira vez, um jogo da série não saiu para um console da Sega.

O jogo Strike teve versões para o PlayStation e o novato da época, o Nintendo 64, console de 64-bits da Nintendo. Como Soviet Strike, ele ficou disponível na PSN para download em 2009, para os usuários de Play 3, PSP e PS Vita.

Vale citar que no fim de Nuclear Strike, a EA deixou uma mensagem aos jogadores, que em breve viria um novo game, Future Strike.

Esse jogo chegou a ser desenvolvido, mas mudou tanto que acabou se tornando outro game à parte, chamado Future Cop: L.A.P.D., lançado em 1998 apenas para o PlayStation (anos depois, na PSN também). No jogo, controlamos um mecha (!) pelas ruas de Los Angeles no combate ao crime.

Future Cop L.A.P.D. para PlayStation
Um mecha contra os criminosos de Los Angeles

A Electronic Arts ainda faria mais dois jogos com propostas semelhantes à série Strike, como Best of Voodoo (1998) e Flight Mania (2000).

/ COMPLEXO INDUSTRIAL MILITAR NOS GAMES. Há ao menos três jogos que usam de forma proeminente o conceito do complexo industrial militar em suas histórias. Em Metal Gear Solid 4: Guns of the Patriots (2008), ele é o mais aparente e permeia cada aspecto do game de Hideo Kojima.

Em Army of Two (2008), o vídeo de despedida de Einsehower foi usado no trailer do game. E no jogo Civilization Revolution (2008), o “Complexo Industrial Militar” é uma das “campanhas” do game, que é conquistada logo depois da descoberta de outra, “A Corporação”. Essa, por sinal, é outro conceito que rege o mundo geopolítico de maneira tão profunda quanto.

Temos uma série de matérias correlacionando obras da cultura pop com a política.

Confira essa resenha do filme Zona Verde, que trata da invasão do Iraque em 2003 pelos EUA:

ZONA VERDE | Quando Bourne foi para o Iraque pós-11 de Setembro

E o jogo de tiro Call of Duty? Você sabe como que ele se relaciona com a Guerra Fria?

CALL OF DUTY | Guerra Fria nos videogames para entender política

Você gosta dos X-Men? Gosta do vilão Ômega Vermelho? Você sabia que ele nasceu quando a URSS morreu?

ÔMEGA VERMELHO | 30 anos de um vilão ícone das HQs anos 90 e o fim da URSS

Conheça o Coronel Alexei Vazhin, um dos personagens mais interessantes criados pelo maior roteirista que os X-Men já tiveram, Chris Claremont. Vazhin é o “Nick Fury russo”

ALEXEI VAZHIN | James Bond, Nick Fury e George Smiley em um só

Nesta matéria sobre o mais noventista dos 007, Um Novo Dia Para Morrer (que saiu em 2002 rs), há uma seção especial que explica a Coréia do Norte, Cuba e China.

007 UM NOVO DIA PARA MORRER | O filme mais anos noventa e comunista de James Bond

Por fim, falando em Cuba, não deixe de conferir essa matéria sobre Guevara, jogo de tiro da SNK lançado em 1987, onde você encarna Fidel Castro e Che Guevara contra Fulgêncio Batista com muito fogo marxista.

GUEVARA / GUERRILLA WAR | O game de Che e Fidel feito pela SNK

curadoria e textos: tomrocha (twitter e instagram)
jornalista, estrategista de conteúdo e escrevedor de coisas escritas.

Me manda um e-mail: evertonroch@gmail.com)

E siga o perfil do insta do Destrutor, todo dia algo legal e interessante por lá também.

Formas de apoiar o Destrutor

O Destrutor é uma publicação online jornalística independente focada na análise do consumo dos produtos e tecnologia da cultura pop: música, cinema, quadrinhos, entretenimento digital (streaming, videogame), mídia e muito mais. Nosso principal canal de financiamento é o apoio direto dos leitores. E produzir matérias de fôlego e pesquisa como essa, mostrando todas essas informações, dá um trabalhão danado.

Quer apoiar o Destrutor? tem um jeito simples de fazer isso – é só deixar uma contribuição (ou duas, ou quantas mais quiser)

A chave PIX é destrutor1981@gmail.com

Ajude o Destrutor a crescer, compartilhe essa matéria com seus amigos e nas suas redes sociais se você gostar! Se você gostou desse post, considere compartilhar com quem você acha que vai gostar de ler também. Você pode indicar os posts para seus amigos, seus conhecidos, seus crushes, seus colegas.

E obrigado por ler até o final =)

* Todas as imagens dessa matéria têm seus direitos
reservados aos seus respectivos proprietários, e são
reproduzidas aqui a título de ilustração

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *