Duro Aprendizado é um filme do diretor John Singleton, com Jennifer Connelly em uma participação muito pequena — e disfuncional — em uma trama sobre o racismo entre jovens no ambiente universitário.
É um recorte variado no universo dos estudantes de faculdade, com seus sonhos, preconceitos e caminhos escolhidos para a vida. Há centenas desses filmes, e milhares de razões para fazê-los sempre.
O nome de Jennifer é o primeiro a aparecer nos créditos. E ela aparece só aos 14 minutos. Sua participação total no longa-metragem, que tem mais de 2 horas, não dá 10 minutos. Ela serve apenas de ajuda a uma das personagens principais, que nem mesmo é a protagonista — Jennifer Connelly serve de suporte a um arco narrativo com um motivo específico.
Duro Aprendizado
(Higher Learning, 1994, de John Singleton)
Os protagonistas de Duro Aprendizado realmente são os negros, mas seus nomes vem depois nos créditos.
Eram os anos 90, e Jennifer Connelly era um nome que já vendia bem, e isso pode ter escapado do controle criativo de John Singleton, mas não deixa de ser sintomático e relevante.
Com a ideia certa no que quer contar, Singleton mostra a vontade ferrenha dos jovens em busca de seus objetivos, e como uma forte inércia em mudar isso para se adequar ao ambiente, resulta em tragédia.
Usando tipos familiares reconhecíveis a todos no mundo ocidental, faz perguntas e recortes difíceis nessa tapeçaria humana cheia de impulsos contraditórios. Os diálogos se dão em zona de guerras entres os estudantes, que raramente conversam com outros que não sejam parecidos entre si, de qualquer lado ou raça que seja.
Ele aborda a questão dos estupros dentro do campus, vivência, segregação, perseguição, orientação sexual e outros temas.
O campus de John Singleton
18.000 estudantes.
32 nacionalidades.
6 raças.
2 sexos.
1 campus.
O campus fictício da Columbus University é um microcosmo da América, onde alunos de todas as raças, cores e crenças estão reunidos, num ensaio de convivência na vida adulta.
Os Estados Unidos passam por um eterno e duro aprendizado para tentar solucionar seu racismo.
O nome de Jennifer aparecer antes nos créditos– a despeito de seu talento e proeminência como atriz de renome — de todos os outros atores negros em tela, sendo que sua participação pode ser considerada uma ponta, já diz muito da dualidade da discussão que o filme de Singleton propõe, e do que a vida nos esfrega na cara sempre que possível (tipo toda hora) nos momentos mais banais.
Duro Aprendizado é um filme americano de 1994, da Columbia Tri Star Pictures. A produção teve diversas polêmicas, e deixou o diretor Singleton com vários pepinos para resolver.
Nascido em Los Angeles em 1968, o escritor, produtor e diretor John Singleton foi indicado duas vezes ao Oscar por Os Donos da Rua (1991), se tornando o primeiro cineasta negro a ser indicado para o prêmio.
Wesley Snipes, na segunda metade dos anos 90, já era um famoso ator consolidado de filmes de ação, e estava louco para fazer um filme do Pantera Negra, e chamou Singleton, mas ambos não conseguiram acertar o tom de um roteiro.
Mais tarde, Wesley conseguiu realizar um filme da Marvel, o primeiro da editora como estúdio de cinema, Blade: O Caçador de Vampiros (1998). Singleton fez o filme Shaft (2000), com Samuel L. Jackson como protagonista, remake de uma série de TV de sucesso, e filmes como o segundo Velozes e Furiosos (2003) e a comédia criminal Quatro Irmãos (2005).
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Dura convivência
Com grande elenco de jovens atores despontando nos anos 90, em Duro Aprendizado (Higher Learning no original, algo como “ensino superior” em português) temos Omar Epps como Malik Williams, um corredor negro em busca de estudos; a topzera topíssima top model Tyra Banks, em sua estreia nos cinemas, no papel da corredora Deja; Laurence Fishburne como um professor de ciências políticas; Ice Cube encarnando Dudge, estudante ativista e militante. Estes dois últimos ganharam e foram nomeados a prêmios pelas suas atuações, respectivamente.
O contraponto fica com a loira lindinha Kristy Swanson como Kristen Connor. Michael Rapaport faz Remy, um solitário sem turma que vai ferrar tudo no filme.
Kristen já segura mais forte a bolsa quando está ao lado de Malik, quando os dois pegam um elevador juntos, logo no início no filme. Ela tem que dividir o quarto com uma roommate negra, Monet, que se revela mais amiga que outras branquinhas que Kristen tinha.
A moça sofre um estupro por um colega branco, e quem a ampara é justamente Monet, e não suas amigas brancas. O agressor, ao ligar para Kristen, acaba xingando Monet de puta preta, e Fudge resolve a situação enfrentando o rapaz estuprador e exigindo que ele peça desculpas para a moça.
Os diferentes grupos se misturam depois do estupro e fazem o caldeirão humano desse tipo de filme ferver, com Remy sendo o principal responsável pela erupção de violência.
Na outra divisão preto e branco, nada dá certo. Remy tem que dividir o quarto com Fudge. Confuso, medroso em relação a negros, sem auto estima para se impor contra eles, como quando Fudge põe música alto e ele não consegue estudar no quarto, o rapaz branco prefere ir embora, a conversar ou enfrentá-lo.
A vida não perdoa a fraqueza, e quando acontece uma reação, ela pode ser violenta. Não é exceção na narrativa que Singleton constrói.
Remy acaba caindo nas lábias da supremacia branca da universidade, e vira um sniper nazista, pronto para eliminar tudo que lhe é diferente e não entende.
Spoilers do filme
Quem nos mostra tudo isso no filme é Malik, que não quer mais correr, mas tem que fazê-lo para garantir seus estudos.
Ele chega a jogar uma partida de game de arcade com Remy, quando este ainda estava tentando se encontrar, mas sua atitude irascível não ajuda em nada em fazer novas amizades, ainda mais com gente branca.
Ele se aproxima de Deja, e os dois se envolvem. Em outra cena, Malik confronta novamente Remy, que desconta a raiva em outro estudante — esse judeu.
Malik retorna ao local, apenas para se ver na mira de uma arma, e apanhar da segurança do campus, que na briga deteve apenas o negro, lógico.
Na reta final dos acontecimentos, Remy mata dois estudantes em um Festival da Paz que Kristen e Monet organizaram, ferindo diversos outros com seu rifle. Ele atirava de cima de um prédio e dispara um tiro em Deja, que morre agonizando nos braços de Malik.
O corredor consegue alcançar Remy, mas não consegue matá-lo, pois os seguranças da faculdades interrompem a briga. Para variar, é o negro que é detido primeiro. Remy consegue fugir, e acaba encurralado.
Ainda confuso, como na sua primeira aparição no filme, se mata com um tiro na boca, não sem antes de pedir desculpas pelo que fez.
Dias depois, de frente a um memorial, Malik e Kristen tem o primeiro diálogo, com a moça achando que a culpa pelas mortes foi sua, já que a idéia da festival foi sua.
Malik a faz desistir de pensar assim, e, não por acaso, o filme termina com ele correndo. Malik é a voz de John Singleton no filme.
Uma lição que nunca acaba em um duro aprendizado
Nem dá para considerar um filme da Jennifer Connelly. Como já disse antes, vale pela qualidade inerente do próprio filme, uma ótima história de ciência política, matéria que os estudantes do longa inclusive tem que aprender.
Jennifer Connely faz Taryn, que tem um grupo de discussão e apoio feminino. Ela é lésbica. E se envolve com Kristen, depois que ela sofre a violência sexual.
Há inclusive uma cena da loira fazendo sexo com Jennifer Connelly. Kristen fantasia um colega no lugar da morena, em diversos momentos do amasso. Isso deixa um ruído na comunicação e mensagem, que acaba atrapalhando tudo que se pretendia passar na cena. Esse ruído não é único, e afeta outras particularidades do filme.
O que é uma pena, já que o longa anterior da morena, Do Amor e de Sombras, é igualmente dramático em seus temas.
Quem originalmente estava previsto para o papel de Taryn era Juliette Lewis, e Gwyneth Paltrow interpretaria Kristen. Mas as duas não estavam disponíveis.
O rapper Tupac Shakur era pra ter sido o protagonista Malik, mas o artista foi preso em Clinton por agressão sexual antes das filmagens. Singleton queria Leonardo DiCaprio para fazer Remy, mas o ator não acabou suas filmagens no longa Rápida e Mortal a tempo.
O professor, em vez de Fishburne, podia ter sido Sidney Poitier ou Samuel L. Jackson, mas o estúdio vetou os nomes.
Nascido em Los Angeles em 1968, John Singleton lançou o incendiário Boyz n the Hood em 1991, onde retrata um poderoso cenário de violência entre gangues, tráfico e consumo de drogas em LA.
Fez dos atores Cuba Gooding Jr e Ice Cube superstars da indústria cinematográfica. Singleton tinha apenas 24 anos. Foi indicado ao Oscar pelo filme. E foi exemplo e inspiração para uma nova geração de afro-americanos desejosos de fazer cinema.
Segundo o que ele mesmo disse, em uma entrevista sensacional para o The Guardian, era um “jovem negro furioso“, e louco para fazer cinema.
John não conseguiu repetir com maestria o impacto de Boyz. Duro Aprendizado, no entanto, resiste bem aos novos tempos. O que mostra também que não evoluímos e nem aprendemos nada.
Duro Aprendizado é uma grande obra-prima da carreira de John Singleton, e merece ser visto, e um filme notável na carreira de Jennifer Connelly.
A cena de sniper de Remy foi baseada no ataque real que o atirador Charles Whitman cometeu na Universidade do Texas, em 1966. Na época da filmagens, houve ataques similares na Virginia, com duas mortes.
Virgina é o estado americano era o que concentrava 40% de todos os escravos negros dos EUA na época da Guerra Civil Americana.
Exemplo claro (e caro) de que a vida real corre mais rápido que a ficção.
12º filme da Jennifer Connelly
Duro Aprendizado
Estados Unidos
/// A MARATONA JENNIFER CONNELLY.
1- Era Uma Vez na América (1984)
2- Phenomena (1985)
3- Sete Minutos Para o Paraíso (1985)
4- Labirinto – A Magia do Tempo (1986)
5- Essas Garotas (1988)
6- Etoile (1989)
7- Hot Spot – Um Local Muito Quente (1990)
8- Construindo Uma Carreira (1991)
9- Rocketeer (1991)
10- O Coração da Justiça (1992)
11- Do Amor e de Sombras (1994)
12- Duro Aprendizado (1994)
13- O Preço da Traição (1996)
14- Círculo das Vaidades (1996)
15- Círculo das Paixões (1997)
16- Cidade das Sombras (1998)
17- Amor Maior que a Vida (2000)
18- Réquiem Para um Sonho (2000)
19- Pollock (2000)
20- Uma Mente Brilhante (2001)
21- Hulk (2003)
22- A Casa de Areia e Névoa (2003)
23- Água Negra (2005)
24- Pecados Íntimos (2006)
25- Diamante de Sangue (2006)
26- Traídos pelo Destino (2007)
27- O Dia em que a Terra Parou (2008)
28- Coração de Tinta (2008)
29- Ele Não Está Tão a Fim de Você (2009)
30- 9 – A Salvação (2009)
31- Criação (2009)
32- Virginia (2010)
33- O Dilema (2011)
34- E…que Deus nos Ajude!!! (2011)
35- Ligados pelo Amor (2012)
36- Um Conto do Destino (2014)
37- Marcas do Passado (2014)
38- Noé (2014)
39- Viver Sem Endereço (2014)
40- Pastoral Americana (2016)
41- Homem-Aranha De Volta ao Lar (2017)
42- Homens de Coragem (2018)
43- Alita – Anjo de Batalha (2019)
/// 1995. Alguns filmes que estavam nas telas de cinema nesse ano: Goldeneye 007, Seven – Os Sete Pecados Capitais, Os Bad Boys, Os 12 Macacos, Frankenstein de Mary Shelley, Amor à Queima-Roupa, Pulp Fiction – Tempo de Violência, Cidadão X, Meu Amigo Totoro, Diário de um Adolescente, Duro de Matar – A Vingança, Coração Valente, Apollo 13 – Do Desastre ao Triunfo, Batman Eternamente, Pocahontas – O Encontro de Dois Mundos, Gasparzinho, o Fantasminha Camarada, Mentes Perigosas, Os Suspeitos, O Balconista, Waterworld – O Segredo das Águas, As Pontes de Madison, Mortal Kombat, A Rede, Barrados no Shopping, Kids, O Nome do Jogo, Coisas Para se Fazer em Denver Quando Você Está Morto, Grande Hotel, As Patricinhas de Beverly Hills, Toy Story – Um Mundo de Aventuras, entre outros.
/// ROTTEN TOMATOES. Duro Aprendizado, o longa de John Singleton com Jennifer Connelly, tem uma pontuação de 45% no site agregador de críticas.
/// DURO APRENDIZADO. O filme é o terceiro da carreira de John Singleton, que morreu em abril de 2019, aos 51 anos. Aqui, mais uma matéria do longa, pelo The Guardian.
/// ROGER EBERT. Um dos maiores críticos do cinema que o mundo já teve. Duro Aprendizado e sua crítica aqui.
O PREÇO DO TRAIÇÃO | Jennifer Connelly e o noir da Era Atômica
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